João Bosco Botelho
Hipócrates, segundo Sorano de
Éfeso, nasceu na ilha de Cós, em 460 a.C. Filho do médico Heráclides, aprendeu
os segredos da prática médica com o pai e nas viagens à Tessária, Trácia, Líbia
e ao Egito.
Esse período admirável da
Medicina grega, do qual Hipócrates foi o mais importante representante,
compreendeu cinco centros de cultura médica que receberam os respectivos nomes
da cidade onde funcionaram: Cós, fundada por Hipócrates, em 440 a.C., Rhodes, Cnido,
Crotona e Agrigento.
Devido à importância
fundamental na história da Medicina, a Escola de Cós acabou absorvendo a
denominação de Medicina hipocrática em menção honrosa a Hipócrates.
O sucesso da Escola Médica de
Cós, onde Hipócrates e seus seguidores estruturaram as bases da Medicina
oficial grega, responsável pela primeira teoria para explicar a saúde e a
doença – a teoria dos Quatro Humores – representa o primeiro corte epistemológico
da Medicina, tendo sido cristianizada no medievo e traduzida para o francês no
século 19.
A medicina hipocrática pode
ser compreendida por meio das obras publicadas pelos médicos da Escola de Cós,
em suma, responsáveis pelo primeiro corte epistemológico na história da
Medicina, quando as práticas médicas iniciaram o processo de separação das
crenças e idéias religiosas. A cura deixou de ser um atributo exclusivo dos
deuses protetores ou vingadores para ser explicada pela Medicina, onde era
possível e preferível que o homem agisse sobre o outro homem doente, para
alcançar a melhoria da saúde.
A estrutura teórica da
Medicina hipocrática está contida no pensamento filosófico grego pré-socrático,
notadamente, na teoria dos Quatro Elementos de Empédocles (água, terra, ar e
fogo). Posteriormente, foi incluído no mundo das idéias platônico-aristotélico.
Se for considerado o fato de
que, até o século III a.C., na Grécia, qualquer pessoa poderia exercer a
Medicina, o notável avanço proporcionado pelos escritos da Escola de Cós, sistematizando
os saberes historicamente acumulados e iniciando o processo de ruptura com as
ideias e crenças religiosas, inclusive, é fundamental conhecer algumas idéias
centrais que moldaram a Medicina, no Ocidente, durante vinte séculos.
Dessa forma, é possível
estabelecer quatro conceitos fundamentais na Medicina hipocrática:
– É fundamental conhecer o
corpo humano e o ambiente: só é possível entender a saúde e a doença se o homem
for estudado em conjunto com o ambiente onde vive;
– A doença é consequência de
agressão ao equilíbrio do corpo: as causas e as consequências das doenças devem
ser entendidas em conjunto com as reações naturais do corpo frente à agressão;
– A saúde é obtida por meio do
equilíbrio entre os Quatro Humores (sangue, fleuma, bile amarela e bile negra),
que correspondem aos Quatro Elementos de Empédocles (água, terra, ar e fogo):
A doença é o resultado do
desequilíbrio dos Quatro Humores que poderia ocorrer seja por causas internas,
próprias do doente, seja por vetores externos ao ambiente ou modo de vida do
paciente, seja pela conjunção dos dois fatores. Sob esse pressuposto teórico,
praticar a sangria era uma das formas de obter o equilíbrio dos humores.
Os escritos hipocráticos consideravam
a idade como o principal fator interno que poderiam determinar a saúde e a doença.
Como fatores externos, as estações do ano, águas, o ar respirado e os ventos.
Assim, a doença era entendida,
na Escola de Cós, como um processo resultante de três fases sucessivas e inter-relacionadas:
incubação, crítica e resolução.