Pedro Lucas Lindoso
Essa crônica é uma homenagem a Maria Clara Coelho Baumann,
tia Clarita, vó Clarita, bisa Clarita, ou simplesmente Clarita.
Não foi à toa que o jovem médico amazonense Justino Baumann
se apaixonou pela bela baiana chamada Maria Clara. Isso nos idos de 1940, na
fervilhante cidade de Salvador da Bahia.
Clarita, além de linda, cantava e tocava piano. Exímia
dançarina de tango, o ritmo favorito de Justino.
Viviam-se os dias agitados da II Guerra
Mundial. Entre racionamentos, toques de recolher e medo de um inesperado
bombardeio, havia sempre a oportunidade de se apaixonar.
Justino Baumann nasceu em Itacoatiara na primeira metade do
século passado. Desejando ser médico, seguiu a trilha de outros médicos
amazonenses. Homens valorosos que hoje dão o nome a hospitais em Manaus. Foi
estudar medicina na Bahia.
A Faculdade de Medicina da Bahia é a escola de medicina mais
antiga do Brasil. Criada em 18 de fevereiro de 1808, logo após a chegada de Dom
João VI e da corte Portuguesa, com o nome de Escola de Cirurgia da Bahia.
Justino e Maria Clara se casaram em 1947, no Rio de Janeiro.
A cidade maravilhosa do Rio de Janeiro sempre foi glamorosa e impactante.
Imaginem no pós-guerra!
Muito trabalho e pouca remuneração em terras cariocas levou o
jovem médico a acreditar no sonho de Juscelino Kubistchek. Contratado como
médico do Instituto dos Bancários, Dr. Baumann, esposa e filhos foram para o
Planalto Central ajudar a construir a nova capital do Brasil.
Dr. Baumann e dona Maria Clara formavam o casal mais
simpático e querido dos acampamentos pioneiros de Brasília. Médico
gastroenterologista e clínico geral, Dr. Baumann atendia os candangos com
eficiência e generosidade.
Com a cidade inaugurada e já funcionando como a nova capital,
Maria Clara foi trabalhar no Senado Federal. Testemunhou inúmeros fatos
históricos. Trabalhou no Gabinete do Senador Auro de Moura Andrade, quando
presidente do Senado e do Congresso. Conta sempre que datilografou o discurso
de posse do senador Auro de Moura Andrade como Primeiro Ministro, o que durou
pouquíssimo.
Talvez o mais impactante foi no dia em que o senador alagoano
Arnon de Mello, pai de Fernando Collor, deu um tiro num desafeto, em plenário.
Errou o alvo e matou o inocente senador Kaiala, que se despedia de uma
suplência pelo longínquo estado do Acre.
A arma foi parar no gabinete da Presidência, em cima da mesa
de dona Maria Clara. Fico imaginando seu espanto. Possivelmente, teria
sussurrado para si: Oxente!
Clarita está com quase cem anos. As agruras e problemas que
enfrentou na vida nunca tiveram o condão de abalar a doce e serena Clarita.
Sempre altiva e forte. Nada pode impedi-la de usufruir da alegria proporcionada
pelos sobrinhos, netos e bisnetos que tanto ama e é por eles imensamente amada.
Isso se chama resiliência. Oxente!