Amigos do Fingidor

terça-feira, 8 de julho de 2025

Sim ou não como defesa

Pedro Lucas Lindoso

 

Minha esposa reclama quando, às vezes, respondo de forma ambígua. Digo não quando quero concordar com algo.

No português, parece que preferimos o não ao sim. Não é uma questão de negatividade, mas de uma forma de expressão que carrega nuances de resistência, de cuidado ou de simples preferência. Quando alguém nos pergunta se queremos algo, muitas vezes, a resposta é quase automática: “Não, obrigado”, “Não quero”, “Não posso”.  Quando é algo que queremos muito, dizemos logo: claro, com certeza. Quero!

Será que o uso frequente do “não” revela alguma resistência?  Não sei. Parece-me uma característica do falante do português no mundo todo.    o “sim” pode soar como uma afirmação rápida, uma abertura sem muitas explicações.  O “não” é uma escolha mais pensada, mais consciente. É uma forma de proteger o espaço, de estabelecer limites, de mostrar que há algo que não se deseja ou não se pode. Será isso uma característica machista que incomoda minha mulher?

Respondemos com o verbo, é verdade, mas também com o sentimento que o acompanha. Não é só uma palavra, é uma posição. Por exemplo: – Quer casar comigo? A maioria responde: – Quero! Raramente se responde com um insosso sim.

E aí, surge a questão: será que essa preferência pelo "não" reflete uma cultura de resistência, de reserva, de cautela? Ou será que, na essência, é uma maneira de dizer “quero pensar”, “preciso de mais tempo”, “não estou pronto”?

No nosso dia a dia, o “não” é uma palavra poderosa. Pode fechar portas, mas também pode abrir espaço para o que realmente importa. Porque, no fundo, dizer “não” também é uma forma de dizer “sim” — sim àquilo que realmente desejamos, às nossas prioridades, ao que acreditamos ser melhor para nós.

No português, aprendemos a dizer “não” com frequência, como uma expressão de cuidado, resistência ou preferência. No inglês, a coisa é um pouco diferente. Aqui, muitas vezes, evita-se o “yes” — que pode parecer uma afirmação rápida demais — e usa-se o auxiliar “I do” para reforçar uma resposta, uma afirmação com mais ênfase ou precisão.

Por exemplo, ao responder a uma pergunta negativa, em inglês, podemos dizer “I do not” ou “I do” para afirmar ou negar com mais firmeza. Essa prática mostra uma preferência por respostas claras, com um suporte gramatical que reforça a intenção.

E, assim como no português, o “não” é uma resposta carregada de significados. No inglês, o “I do” ou a sua ausência também carregam uma nuance. Evitar o “yes” muitas vezes é uma estratégia para não parecer demasiado afirmativo, para manter uma certa delicadeza ou até mesmo para não se comprometer de forma precipitada.

Em qualquer língua – Português, Inglês, Francês, Espanhol ou Mandarim –, os idiomas mostram que a forma de responder revela quem somos, como pensamos e como nos posicionamos.  No fim das contas, a comunicação é uma ponte que construímos com cuidado e intenção.

E assim seguimos. Falando a “última flor do Lácio, inculta e bela”, como disse Olavo Bilac.  Respondemos com o verbo, com o coração, muitas vezes com o não. Porque, no português, o não é uma forma de negar, claro. Pode também afirmar ou uma maneira de resistir, de refletir ou se defender. Ora pois, pois.