João Bosco Botelho
A genialidade da teoria de Darwin, na época
da publicação, desvinculada dos saberes da genética, embutia o pressuposto de
as mudanças impostas ao corpo, ditadas pela adaptação ao meio e à sobrevivência
dos seres, serem repassadas à descendência.
De certa forma, as ideias de Darwin
fomentaram a leitura evolucionista de Jean
Baptiste Lamarck. Esse notável botânico francês negou a imobilidade dos
seres vivos e os organizou como numa escada rolante, das formas menores e mais
simples às maiores e mais complexas. Também acreditou que a mudança dos corpos
era regida pelas necessidades de cada ser vivente, por meio do uso e do desuso das funções orgânicas e dos
sentidos natos e que essas transformações seriam herdadas pelas novas gerações.
Contrariamente
ao pensamento corrente, Darwin não descreveu a teoria evolucionista. O maior
mérito desse cientista foi enfatizar um modelo particular de seleção natural,
para explicar a transformação das espécies. Esse modelo, dito seletivo,
compreende certo período de tempo, durante o qual podem ocorrer variações morfológicas,
produzidas aleatoriamente entre os seres vivos.
Ao contrário, o modelo de Lamarck tem dois
componentes: o primeiro, voltado ao organismo em si mesmo, no qual todos os
organismos vivos possuem a tendência de evoluir do menos para o mais complexo;
o segundo, relacionado ao meio ambiente, no qual todos os seres vivos sofrem a
influência na natureza circundante e graças a essa interação ocorre a
diversidade das espécies.
O exemplo da girafa pode, perfeitamente,
contribuir para diferenciar os dois modelos: no de Darwin, seletivo, em todos
os animais podem ocorrer variações em todos os sentidos, sem interferência da
natureza circundante. Assim, somente as girafas com o pescoço mais longo
poderão alimentar-se de forma mais adequada e, consequentemente, se reproduzir;
no de Lamark, pressupõe a relação entre a necessidade da
sobrevivência-reprodução e a mudança da forma do corpo.
Para a biologia molecular, os seres vivos são
constituídos por dois tipos principais de moléculas: os ácidos nucléicos (AND e
ARN) e as proteínas. Cada proteína é elaborada a partir de um gene. Esse gene
é, inicialmente, recopiado em ARN (transcriptação), para, em seguida, a partir
da cópia, estruturar a síntese da proteína (tradução). Dessa forma, a biologia
molecular está estruturada sob esse dogma fundamental que sustenta como sendo
unidirecional na elaboração das proteínas, isto é, só o gene determina a
síntese das proteínas e nunca o contrário. Contudo, é possível que esse
mecanismo não esteja engessado e, contrariamente, possua certa
plasticidade.
Considerando a infinita complexidade dos
seres vivos, é possível que a relação entre gene e proteína seja regida pela
plasticidade e não imobilizada pelo determinismo genético, isto é, os humanos
seriam produtos das relações entre a natureza circundante x os copos x as
moléculas.
É desnecessário repetir a resistência às
novas idéias evolucionistas darwinianas, contudo, a ruptura com o imobilismo do
Gênese bíblico estava claramente iniciada. Darwin trouxe à baila as variáveis da seleção natural frente à capacidade
de sobrevivência do animal, ligadas às fontes de alimentos, em ambiente
específico, como o ponto fundamental das transformações biológicas. Na
dependência da comida disponível, os mais adaptados ao meio viverão e os
outros, menos aptos, serão eliminados pela seleção natural.