Amigos do Fingidor

quinta-feira, 3 de março de 2016

Elas por elas



Paulo Sérgio Medeiros

Vem que estou te esperando. Assim que Bruna desligou o celular correu para tomar um banho, perfumou-se de sensualidade, vestiu um vestido azul marinho sem alça e sem-vergonha e despiu-se da mulher politicamente correta. Aquele encontro de bocas profanas dias atrás tinha mexido com as estruturas de sua personalidade.
Não demorou muito e Ícaro estava lá, na esquina do perigo com o ilícito, à espera daquela que exercia sobre ele um poder de fascinação inefável. Com os olhos pregados no retrovisor do carro não via a hora de ver Bruna surgir esplêndida com seus meneios lânguidos e convidativos a uma viagem ao lugar mais recôndito dos prazeres.
Após longos cinco minutos ela dobra a esquina e surge no espelho do retrovisor interno exalando de longe seu perfume de sensualidade. Ícaro se delicia ao vê-la, mas rapidamente se desespera, ela saiu do seu ângulo de visão, ele mais do que depressa a procura no retrovisor externo do lado direito do carro, e seus olhos voltam a sorrir com a boca. Lá vem ela voluptuosa ajeitando o vestido azul marinho.
Vamos, mas não vai acontecer nada. Adverte Bruna ao entrar no carro com um olhar que a desmentia. Ícaro ri cinicamente e a recebe com um beijo no canto direito dos lábios sutilmente maquiados.
Aquela tarde, brindada com um céu desprovido de nuvens, testemunha aquele encontro clandestino calorosamente como que bronzeando as peripécias de uma amizade colorida. O conversa dos corpos flui ao som de Nirvana. Entre uma marcha e outra a mão escapole e flutua pelas coxas de Bruna que banha o beiço com a língua em movimentos circulares e hipnóticos.

Ícaro tem pouco mais de uma hora e meia para comer a maçã e engolir o sétimo dos mandamentos. Ele ainda dirige a esmo quando Bruna enfim sugere o Haiti, o paraíso do amor.  Lá estaremos mais seguros.
– Como assim mais seguros no Haiti? Questiona Ícaro em tom jocoso.
– Vamos fazer aquele lugar tremer. Responde Bruna com todo seu humor negro.
Eles chegam ao paraíso do amor e encontram uma fila de três carros, era uma quinta-feira com cara de dia dos namorados. Um Logus rebaixado entra logo depois deles. Agora são cinco carros e talvez dez pessoas a espera da chave para o vilão prazer da carne em segundos tornar-se vítima.
 Ícaro, já com o peito nu e só de bermuda, vai espalhando calidamente suas digitais pela sinuosidade daquele Amazonas de pecado. Com uma maçã na boca e outra na mão esquerda, Ícaro é castigado pelo medo e flagranteado pelo arrependimento de Bruna que – como um vulcão em erupção – implora para sair daquele corredor povoado da oficina do diabo. O casamento de dois anos não merecia uma pista para pousos de aventuras extraconjugais.
Ícaro, o próprio trem de pouso de tais aventuras, ainda tenta argumentar, todavia Bruna sai do carro desesperada ajeitando o vestido azul marinho e mais desesperada fica quando percebe a placa do Logus rebaixado: SEX 0769. Barrabás, seu filho da puta! Grita Bruna, exasperada. Ícaro desce do carro para evitar o barraco e fica catatônico ao ver sua mulher no colo de Barrabás. O Haiti tremeu...