Ricardo Kaate Lima*
A
literatura amazônica nunca esteve em tão bom momento. Há uma variedade de
autores e autoras praticando poesia, contos e romances a partir de perspectivas
amplas e seguindo variadas tradições: o realismo social, a literatura marginal,
a fantasia especulativa e tantas outras. Temos uma literatura que existe e
resiste a despeito de ser ignorada pelos grandes centros, pelas grandes
editoras ou pelos grandes prêmios.
O
livro Os que andam com os mortos: fábulas cruéis e outras estórias más
(Editora Valer, 2024), de autoria do escritor e crítico literário amazonense
Zemaria Pinto, é um belo exemplar de boa literatura produzida no Norte. Também
pudera, temos um autor já consagrado no Amazonas, autor de mais de vinte livros
entre poesia, crítica literária, teatro e contos.
É
uma coletânea de histórias curtas que mostra um autor maduro, dono de um estilo
limpo e seguro. Não há frase ou palavra fora
do lugar. Tudo se encaixa num todo coeso. Zemaria nos apresenta trinta
histórias que narram facetas perversas da humanidade ou momentos dramáticos da
existência humana. Minhas favoritas são: “Do circo como espaço de tragédias”
narra a história trágica de um anão que trabalha em um circo; “Entrevista com
um patriota” apresenta as palavras de um ex-militar e torturador da ditadura
salazarista que justifica seus atos odiosos contra opositores do regime. “A
paixão de Antônio Mocinha”, dedicado ao saudoso Arthur Engrácio, é uma bela
fábula amazônica de triste final; já em “Foi Boto, sinhá”, Zemaria revisita a
lenda do Boto.
Caso
o leitor esteja à procura de fábulas, histórias sombrias e relatos perversos
que fogem do lugar-comum do que é publicado nas grandes editoras ou do que é
enviado em forma de enlatados pela indústria cultural para o Brasil, Os que andam
com os mortos é uma boa opção.
Então,
leitor amigo, aperte as mãos desses monstros oferecidos por Zemaria Pinto e
deixe-se levar pelos meandros da escuridão da alma humana.
*Doutor
em Ciências Sociais (UNESP), autor de O Fim de Todas as Coisas (2021) e
de A Lança de Anhangá (CACHALOTE, 2024).