Amigos do Fingidor

quinta-feira, 24 de julho de 2025

A poesia é necessária?

 

Antígona

Cláudio Fonseca

 

A D. Hermes da Fonseca

 

As grevas se iluminam ao sol do meio-dia.

Rubros, saem da névoa os corpos retalhados,

lâminas quebradas gotejando trevas

sob o olhar de tédio dos cavalos.

 

Fúrias que se ocultam em rosto vário

deixam nesta hora o plano imenso.

Quando, nos punhais, serão gravados

nossos nomes, nossa hora, em silêncio?

 

No átrio, em silêncio, um vulto chega.

A mortalha em farrapos sobe ao vento. Esse encarne

do Amor (que nos corpos apodrece) chora

a carne em solidão – o negro templo.

 

Abre a multidão, caída, sob o férreo sol

da estação de Tebas. A brutal cidade

hoje uma chaga aberta

numa entorpecida América selvagem.

 

Como um cão divino, transparente e grave,

passa a grande sombra sobre o fio das facas.

Não purificou, o Tempo, a sua arca

de agonias, de miséria e sangue.

 

O meio-dia tange a lágrima de bronze

sobre bondes e pedreiros e peões cansados

e garis suados. Pai, é teu cadáver

que Antígona levanta em seus braços.