Marco Adolfs
– Este é o sítio do senhor Mourão, onde iremos encontrar nossas sementes – disse o senhor Lourenço.
– E esse senhor é de confiança? – perguntei.
– Bom, não devemos dizer a verdade – respondeu-me o senhor Lourenço.
A embarcação aportou a uma espécie de promontório de mais ou menos vinte pés de altura e o senhor Lourenço ordenou a descida de todos. Preso o barco, galgamos uns degraus escavados no próprio promontório. Atingido o topo vi-me cercado de inúmeras crianças índias que gritavam e pulavam ao nosso redor com extrema alegria. Lourenço afagava a cabeça de todas elas. Cerca de uns doze metros de onde estávamos, um homem gritou e o serviçal do senhor Lourenço acenou imediatamente.
– É o senhor Mourão, o dono do sítio – disse o serviçal.
Fomos bem recebidos e após as apresentações iniciais o homem passou a mostrar-nos sua residência. Um grande barracão coberto de enormes folhas secas de palmeira. Ao olhar o interior da casa percebi que as paredes eram estacas de madeira amarradas com cordas e alisadas com argila. Não existia assoalho, e sim terra batida. Esse senhor Mourão morava com a mulher e seus nove filhos. Demonstrava viver em paz com a vida naquele ermo lugar. Era um tipo bastante falador, que no almoço nos serviu um grande peixe assado, chamado tambaqui, acompanhado de arroz e farinha, o que muito nos deleitou. Nas conversas que travamos, o senhor Lourenço explicou-lhe sobre meu interesse em coletar algumas sementes da seringa. Disse que era para pesquisas farmacêuticas, pois que eu havia descoberto que a semente da seringa, sendo ralada e transformada em pó, servia para curar diversas doenças. Tudo uma grande mentira, é claro, mas que servia para os nossos reais propósitos. O senhor Mourão, como não poderia deixar de ser, ficara maravilhado com mais uma utilidade encontrada para aquela árvore. E principalmente depois que lhe disse que pagaria pelas sementes.
– Mas isso é maravilhoso! – exclamou, efusivo. – Atualmente o produto dessa árvore é mandado para fora, porém em pequena quantidade, e o que sobra nós fazemos uns sapatos bem toscos, que duram apenas alguns meses – explicou, com uma certa decepção no olhar. Mas agora com essa descoberta farmacêutica! – sorriu.
Conversamos ainda por um bom espaço de tempo e nos despedimos para irmos dormir no barco. O sol desaparecia lentamente, pintando o final do dia com seus últimos raios vermelhos. Dormi pensando que no dia seguinte o senhor Mourão nos mostraria sua plantação. “Repleta de sementes caídas no solo”. Os mosquitos zuniam em minha cabeça.
Quando amanheceu, me levantei, tomei uma caneca de mingau e saí acompanhado do senhor Mourão, do senhor Lourenço e dos índios. Todos com o único objetivo de coletar as sementes. Carregávamos inúmeros cestos. A coleta foi profícua. Com três dias de trabalho árduo no meio da selva conseguimos encher todos os potes de cerâmica. Carregá-los até o barco não foi problema. Acondicioná-los, também não. O grande problema aconteceria na metade do caminho ao retornar para a Barra. Com os índios que havíamos contratado. Até hoje penso no real motivo para eles terem feito aquilo.
(Continua na próxima terça-feira)