Amigos do Fingidor

terça-feira, 26 de julho de 2016

Nem sob tortura



Pedro Lucas Lindoso

Era um sábado propício a ir à praia de Copacabana, no Rio de Janeiro. Tia Idalina convalescia de mais uma cirurgia plástica. A quinta ou sexta, talvez. Fui visitá-la. Idalina fazia as unhas e arrumava o cabelo. Duas de suas sobrinhas estavam de visita e aproveitavam para também fazer as unhas. Gentileza de tia Idalina.
– Isso aqui vira um salão aos sábados. Disse ela. Essas meninas queridas vêm sempre me visitar. Nunca fico sozinha.
Tia Idalina é sábia. E magnânima. Também, pudera! Recebe seis contracheques, de fontes diversas. Professora aposentada do estado, Idalina foi ainda bibliotecária de uma autarquia federal.  Seu falecido marido era professor de uma universidade pública e engenheiro de uma estatal. E tem ainda a do Exército. Seu pai era general reformado e serviu na Itália. Cinco fontes generosas e ainda a “merreca do INSS”, a completar os maravilhosos rendimentos mensais de Idalina.
Frequenta todas as reuniões de associações de aposentados e sindicatos de onde é pensionista ou aposentada. Leva sempre uma pastinha com todos os documentos. Vez por outra recebe uma bolada extra. São indenizações trabalhistas. Há sempre parcelas de remuneração pagas a menor, planos econômicos, verbas não pagas corretamente a aposentados.
– Esse pessoal dos sindicatos e seus advogados são geniais, diz ela.
Assim tia Idalina ou faz plástica ou uma grande viagem ao exterior, sempre que ganha uma grana extra da Justiça.
Argumentei que a opção pela plástica era por causa da alta do dólar. Mas ela disse que não e me contou, desolada, porque resolveu fazer a sexta plástica. Estava no carro com Antonieta, sua “best friend”, quando um motorista irritado com o trânsito gritou:
– Suas velhas vadias.
No que ela me confessou:
– Juro que não me ofendi com o palavrão, “vadia”. Mas me chamar de velha?... Um absurdo! 
Concordei com titia. Uma falta de respeito e de educação. Idalina não confessa a sua verdadeira idade. Nem sob tortura.