Marco Adolfs
...Procurando uma personalidade histórica para servir como exemplo de solitário maior, Gabriel Sombra, o porta solitário, encontrou vários líderes políticos; mas, o maior, pensou então, já que estava citando muito a Bíblia, talvez fosse o próprio Judas, o traidor de Jesus. Um sujeito com todos os requisitos para se tornar um solitário. Nesse momento de seu ensaio Gabriel Sombra parou então para raciocinar que deveria deixar a Bíblia de lado e tentar ser mais técnico em como descrever os solitários. Tinha como exemplo maior ele próprio. O que se tornara; ou por escolha; ou por falta justamente dela. Com todo o conhecimento acumulado que Sombra tinha sobre psicologia, sabia que, essencialmente, os solitários sem fé eram pessoas geralmente agressivas como ele de vez em quando o era; ou se tornavam misantropas, como ele parecia ser muitas vezes assim. Ou então fugiam de tudo em busca de um isolamento de vítima; como um pobre coitado que vive se lastimando e culpando os outros pelas suas lástimas. Quantas e quantas vezes ele não sentiu isso mesmo. Uma vítima da incompreensão dos outros. E quantas e quantas pessoas não estariam na mesma situação? “Milhões!”. Há inumeráveis e especiais casos de pessoas solitárias no mundo. U’a mulher solitária porque o marido não a acompanha seja lá onde for; ou ainda um marido que se sente só porque a mulher só pensa em se dedicar a si própria. Estranho mundo. E ainda existem aquelas causas inevitáveis que acometem; ou irão acometer algum ser humano em determinado tempo de sua vida. Entre elas, pensou Gabriel, escrevendo o seu ensaio, existe a morte de um ente querido. Essa justa e injusta morte, a mais competente anunciadora de sofrimentos e solidões. Sombra então parou e percebeu a existência de outro fator, este preponderante, como desencadeador de um sofrimento interno que leva alguns seres à percepção da extrema solidão: o medo. Essa percepção do perigo e do abandono que pode levá-los a gestos absurdos...