João Bosco Botelho
Um
desses indícios de práticas médicas oficiais executadas por médicos
reconhecidos pelas estruturas de poderes, é o Código de Hammurabi, do fim do
século 19 a.C., um dos mais antigos códigos de leis voltado à organização
social, na Mesopotâmia, em escrita cuneiforme, na estela de diorito negro,
hoje, em exposição no setor de antiguidades orientais, no Museu do Louvre. Na
realidade, foi a primeira estrutura de leis contendo, claramente, os direitos e
deveres dos médicos, estabelecendo o pagamento pelos bons serviços e severas
punições pela má prática. Também é interessante assinalar que os preços e
castigos variavam de acordo com o estamento social do doente. Os preços mais
caros pelos serviços prestados e castigos mais severos pelos maus resultados
estavam ajustados aos doentes mais ricos e socialmente importantes.
Apesar
de não ser o código de leis mais antigo, é possível estruturar alguns preceitos
valorativos em torno do Código de Hammurabi, até hoje, entendido para manter a
ordem interna do reino:
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Mesmo reconhecido como uma gigantesca tentativa de unificar e reformar o
direito no reino, claramente, não abrange todos os pontos conflituosos do
cotidiano social da época;
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É essencialmente dirigido para conter os abusos em diversas áreas das relações
sociais, certamente, geradoras de situações de conflito;
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Dos 282 artigos do Código de Hammurabi, 12 deles regulavam os trabalhos dos
médicos, contidos num conjunto de outros que tratava dos direitos e deveres dos
veterinários, barbeiros, pedreiros e barqueiros;
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As dos trabalhos médicos compreendem oito leis, todas voltadas ao trabalho
médico cirúrgico;
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Os direitos e deveres dos médicos que executavam procedimentos invasivos e os
dos doentes submetidos às cirurgias estavam vinculados, estritamente, à ordem
escravista numa sociedade rigidamente hierarquizada. Nesse sentido, o pagamento
pela boa prática e o castigo para má prática, eram proporcionais à importância
social do doente, respectivamente, quanto mais importante na ordem social fosse
o doente, mais dispendioso o pagamento e os castigos mais severos;
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Para que o Código de Hammurabi legislasse de modo tão explícito os direitos e
deveres dos médicos e doentes, em detrimento de outros que não foram citados,
era porque os conflitos sociais determinados pelas más práticas e/ou maus
resultados alcançaram níveis de conflitos suficientes para gerar resposta
administrativa. Dessa forma, na Mesopotâmia, no período Hammurabi, foi iniciado
o processo de controle das atividades profissionais dos médicos.
No
Egito, as principais fontes históricas que fornecem informações das práticas
médicas, são o livro de Heródoto, “História”, e o de Deodoro de Sicília, “Livro
Sagrado”, os papiros que receberam os nomes das pessoas que divulgaram os
respectivos conteúdos, Smith, Eberth. Os tratamentos eram espécies de receitas
de bolo, usadas sem variações. Contudo, algumas delas são particularmente muito
interessantes porque além de prescreverem corretamente, como o uso do digital
para as doenças do coração, adicionavam prognósticos, em duas vertentes, as doenças
curáveis e as incuráveis.
É
possível que os conflitos entre médicos e pacientes não tenham alcançado níveis
suficientemente intensos para gerar respostas junto à administração. No Egito,
do segundo milênio a. C., não se conhecem registros específicos de códigos que
regessem, a exemplo do de Hammurabi, as práticas médicas.