Zemaria Pinto
Socorro
Garçonete do Pinguim, quando
terminava seu expediente, Socorro ia para o Guadalajara, que só fechava as
portas quando o sol já ia alto. Não era bonita, mas era jovem e bem fornida de
peitos, pernas e bunda. Sentava sempre em um grupo de lésbicas, conhecido pelos
habituais, liderado por Grace, uma morena bela, esbelta e vestida com muita
elegância, distante de qualquer estereótipo. Sempre que ia ao Guadalajara
observava o grupo e flertava com Socorro. Meus amigos não entendiam e faziam piadas
estúpidas. Grace era muito dominadora e não permitia que suas meninas saíssem do
grupo – a esfregação era só entre elas. Uma noite, mandei um bilhetinho para
Socorro, de quem eu já sabia alguma coisa, graças à Toinha, garçonete da casa.
Grace percebeu, tomou-lhe o bilhete e rasgou-o. Na noite seguinte, a um
descuido da sargenta, fiz-lhe sinal para nos encontrarmos lá fora. Para minha
surpresa, Socorro dirigiu-se calmamente em nossa direção e sentou-se. As duas
mesas ficaram na expectativa da reação de Grace. Ela se aproximou de mim e,
como um perfeito cavalheiro, estendeu-me a mão. – Então, é em você que essa
cadela está interessada?! Vamos só ver por quanto tempo... Naquela mesma noite,
fomos a um hotel do Centro. Socorro era doce, carinhosa e submissa. Contou-me
histórias de bolinagem e estupros dentro de casa e do pouco caso de sua própria
mãe. Falou-me também sobre Grace, por quem fora “adotada” ainda adolescente e
do carinho que sentia por ela. Contou-me que na noite anterior pediu a Grace a
oportunidade de conhecer um homem diferente dos que haviam passado por sua vida
até então. Continuamos nos encontrando no Guadalajara. Grace virou minha amiga.
Às vezes, saíamos a três e, nessas ocasiões, Socorro tinha dupla jornada. Ainda
hoje, quando passo pelo lugar onde funcionou o Guadalajara, lembro de Socorro,
de seu sorriso tímido, seu olhar distante, sua imensa vontade de ser feliz.