Marco Adolfs
...“Mas o que é a solidão?”, pensou o velho poeta Gabriel, no dia em que resolveu escrever o tal ensaio. Começou por pegar um velho dicionário jogado ao chão, bem embaixo de sua rede. Folheou, procurou, procurou; até que encontrou a definição da palavra: só, desacompanhado, solitário, único, próprio. Palavra que vem do latim solus; solipsismo, uma doutrina filosófica segundo a qual a única realidade do mundo é o próprio eu. Gabriel já sabia disso tudo, principalmente do fato concreto ou mesmo abstrato de reconhecer que a solidão era algo inerente à condição humana; uma parte constitutiva de todo o ser; e até de Deus, o maior de todos os solitários, segundo o seu entendimento. Percebia então que a solidão, na verdade, era quase como uma perna ou um braço. Nasce-se só e morre-se só, pensou, ao começar a escrever esse tal ensaio definitivo sobre o fato. Isso tudo, para aqueles que vêem a morte como o fim da sua pobre ou rica existência, não era nenhuma novidade. Mas as pessoas insistiam em não querer perceber a concretude da coisa. Mas, indagou-se ainda Gabriel, “ser só é diferente de estar sozinho?” Somos sós; mas, eu, Gabriel, estou, porém, sempre sozinho, começou a matutar o velho poeta. Sou só, pois sou único; e, além disso, vivo sozinho. Gabriel então teorizou sobre tudo isso, colocando no papel as palavras necessárias para encetar esse seu ensaio-testemunho. Foi quando então percebeu que a sua solidão era a melhor de todas as solidões, apesar dos vazios intangíveis e persecutórios de todos esses malditos domingos...