Pedro
Lucas Lindoso
O
assunto é muito triste. Mas quem ainda não enfrentou tal situação vai
enfrentá-la.
O
que fazer com o endereço de e-mails de um amigo ou parente querido falecido?
Manter na lista de contatos? Deletá-lo? E a página do facebook? O contato no
whatsapp? Pior: o número do telefone identificado nos seus contatos do celular.
O
que fazer com o e-mail de um grande amigo, lido somente no dia do velório, em
que ele indicava a compra da recente antologia de poemas elaborada pelo
Ferreira Gullar? E ainda, constatar que o e-mail, equivocadamente enviado ao
falecido, retornou com o aviso de “mailbox full” (caixa de correio lotada). De
quê, meu Deus? Não seria de pêsames, com certeza. Será lida pela mulher ou por
seus filhos? Saberiam eles as senhas?
“Quando
a indesejada das gentes chegar”, disse Manuel Bandeira cantando a morte.
Um
conhecido, a quem chamaremos de Raul, passou por um sofrido constrangimento no
velório de seu pai. Um inesperado e violento infarto ceifou a vida do pai de
Raul e coube a ele administrar chamadas vindas do celular de seu pai. Foi
dolorido informar as pessoas, que telefonavam para seu pai, do acontecido.
Mais
inadequada foi a triste ideia de comunicar a um contato do mesmo celular a
morte do proprietário. Quem atendeu foi logo saudando o morto identificado na
tela do aparelho. Sentiu-se culpado da besteira que fez, mas estava totalmente
atordoado, o que é plenamente desculpável.
Mas
o pior ainda estava por vir. Um drama familiar. Durante o velório, Raul começou
a receber mensagens do banco, enviadas para o celular do falecido, dando conta
da utilização indevida, obviamente, do cartão de crédito/débito do defunto.
Imediatamente
entrou em contato com o banco e o cartão de crédito, para sustar todos os
cartões em nome do de cujus. Mas o estrago estava feito. O filho mais novo de
seu irmão subtraiu o cartão do avô. As senhas estavam todas escritas num
papelzinho dentro da mesma carteira dos cartões. Muito fácil para o neto,
usuário de drogas e delinquente, fazer a festa.
O
mundo muda, as circunstâncias advindas da modernidade estão aí para serem
administradas. O que não muda é a dor e a saudade dos que partem, quando a
indesejada das gentes chega, como disse o poeta.
O
mundo virtual dos banknets, internets, celulares e que tais podem ser bem
macabros. Agora, além das terríveis burocracias de um funeral, questões
familiares e heranças a serem resolvidas, ainda temos que administrar os
despojos virtuais.