quinta-feira, 29 de junho de 2017
Genética e teorias dos conhecimentos
João Bosco Botelho
Sem esquecer Nietzsche: “Não
há fatos, somente interpretações”, é possível pensar, sem receio dos exageros
da paixão, que o rápido aumento do desvendar da microestrutura nos níveis
moleculares, nos últimos vinte anos, está aproximando a ciência dos mistérios
da memória, fonte majestosa de todo o conhecimento. Sob essa perspectiva,
torna-se razoável rever as teorias de conhecimento e aproximá-las do genoma, a
origem da vida e da morte.
A abordagem para discutir
outras teorias do conhecimento obriga ligações diversas das concebidas, por
exemplo, a partir dos saberes de Locke, na ideia da “tabula rasa”, e dos de
Marx, maximizando o valor do coletivo sobre o pessoal.
Mesmo aceitando ser
impossível articular as teorias do conhecimento e os saberes em si mesmos, fora
do contexto onde são produzidos, não há dúvida quanto à fantástica repetição de
atitudes humanas de fuga à dor ou à simples ameaça de situação dolorosa, nos
quatro cantos do planeta.
Parece claro que esse
conjunto comportamental, evidente nas relações sociais, teve forte influência
na concepção do jusnaturalismo aristotélico, ajuizando valor ao equânime, mais
fortemente presente, até o século XVII, quando sofreu transformações sob a
influência do historicismo de Hobbes e Rousseau.
A proposta teórica das
memórias sociogenéticas admite certos instrumentos sociais, formados ao longo
da ontogênese, por meio dos quais, a ordem genética interage com o social em
contínuo processo de aperfeiçoamento com o objetivo de compor atitudes
corporais e sociais para fugir da dor e procurar o prazer.
Sob a égide desses novos
conhecimentos, as teorias do conhecimento serão atualizadas quando for
acrescentado o sociogenético aos pressupostos teórico-idealista (Hegel),
material (Feuerback), histórico-social (Karl Marx), biológico (Darwin) e
comportamental (Freud). Desta forma, as memórias sociogenéticas são as pontes
biológicas que articulam a herança genética ao social e vice-versa.
quarta-feira, 28 de junho de 2017
terça-feira, 27 de junho de 2017
A rampa do planalto
Pedro Lucas Lindoso
Ao assumir a Presidência da República, Fernando Collor nomeou
o senador Bernardo Cabral para o Ministério da Justiça. Meu grande amigo de
Brasília Flavio Bittencourt, filho de Ulisses Bittencourt e primo de Araújo
Lima, que fora nomeado chefe da Secretaria Nacional de Justiça, nos levou para
compor a equipe do Dr. Bernardo. Foi convidado também o Francisco Vasconcelos,
membro da Academia Amazonense de Letras e recentemente falecido.
Vasconcelos era um oásis de sabedoria e moderação em meio a
um pessoal cheio de muita bazófia e desmesurado entusiasmo. Eram todos muito
sanguíneos e enfrentando responsabilidades nunca antes experimentadas.
Inclusive eu, nomeado ao importante cargo de Diretor de Assuntos da Cidadania
do Ministério da Justiça.
O Governo Collor tinha um avançado programa de marketing
político, responsável por eleger o primeiro presidente eleito pelo povo depois
da redemocratização.
Em frente ao Palácio do Planalto em Brasília há uma majestosa
rampa branca que dá acesso à entrada principal. Nas segundas feiras o
presidente subia a rampa. Às sextas eram dias de descida da rampa.
No anexo do Palácio, mais acima, onde funciona o Ministério
da Justiça, acompanhávamos semanalmente o movimento das subidas e descidas da
rampa. Vasconcelos e eu tínhamos um medo e um segredo compartilhado que
envolvia a tal cerimônia, que revelarei a seguir.
As descidas e subidas de rampa eram um evento semanal de
marketing e envolvia sempre algum segmento do governo. No Dia do Índio eram
convidados nossos irmãos indígenas e o pessoal da FUNAI. No dia das Mulheres, o
Conselho da Mulher e representantes das feministas. Efemérides relacionadas à
Educação, Saúde, Meio Ambiente ou Infraestrutura eram convocados os dirigentes
e comissionados dos respectivos órgãos. Todos chamados a subir, ou descer a
rampa com o presidente. Aquilo era televisionado. O que diriam meus amigos da
UnB ao me verem descendo a rampa, pensava eu. O que diria o pessoal do Banco do
Brasil, pensava o Vasconcelos. Esse era o nosso segredo. Pavor em ser convocado
para descer ou subir a rampa.
Na linguagem jocosa dos brasilienses da época havia os
rampistas, os rampeiros e os rampadores. Os primeiros eram os que faziam lobby
para ser convidados a subir a rampa com o Collor. Os rampeiros eram os
comissionados que, convidados compulsoriamente e para não colocarem seus cargos
em risco, compareciam à cerimônia. E os rampadores. Esses eram convidados e iam
com alegria e júbilo descer a rampa com o presidente. O rampador-mor era o
senhor Paulo Otávio, político e empresário brasiliense. Dileto amigo de
Fernando Collor desde os tempos de juventude. Podia ser dia dos índios ou da
mulher. O Paulo Otavio estava lá, pronto para descer ou subir a rampa.
Graças a Deus, Vasconcelos e eu escapamos de nosso dia de
rampeiro. Qual efeméride celebra a cega deusa da Justiça nesse nosso país de
tanta injustiça?!
Finalmente, Collor desceu a rampa definitivamente sob um processo
de impeachment. Não estávamos mais lá. O mesmo aconteceu com a presidente Dilma
recentemente. Esperamos que o próximo eleito pelo povo a subir a rampa o faça
com dignidade. E ao afinal do mandato possa descer aplaudido, sem acusações de
corrupção e malfeitos. O Brasil merece.
segunda-feira, 26 de junho de 2017
domingo, 25 de junho de 2017
sábado, 24 de junho de 2017
sexta-feira, 23 de junho de 2017
quinta-feira, 22 de junho de 2017
Curas divinas
João Bosco Botelho
As práticas médicas no Oriente Próximo, nas primeiras
cidades, se mantiveram ancoradas na complexa relação entre a adivinhação, o
mágico, as crenças e ideias religiosas e os saberes historicamente acumulados.
Desse modo, naquelas organizações sociais, o diagnóstico, o tratamento e o
prognóstico eram executados sem método, casual, exercidos de modo predominante
pelos especialistas no trato com a coisa sagrada. Sem receio de cometer
exagero, nos estratos sociais privilegiados, próximos do poder político e
econômico, os registros mesopotâmicos cuneiformes e egípcios hieroglíficos
atestam as prescrições médicas entendidas como receitas de bolo repetidas,
independentes das características individuais das doenças e de cada doente.
Como consequência, esses fatores representaram obstáculos
intransponíveis para compreender aqueles conhecimentos fora dos restritos
grupos dos eleitos. Esse pressuposto fica mais claro nas civilizações que se
desenvolveram nas margens dos rios Eufrates, Tigre e Nilo. Apesar do notável
senso empírico, a Medicina do segundo milênio permaneceu contida nas amarras da
adivinhação, do mágico.
Os livros sagrados da tradição judaico-cristã estão abarrotados
de passagens que enaltecem o poder de Deus sobre a vida e a morte, destacando a
dádiva divina e o médico como alguém especial: Eclo 38, 1-2: Rende ao médico as
honras que lhe são devidas, por causa de seus serviços, porque o Senhor o
criou. Pois é do Altíssimo que vem a cura, como um presente que se recebe do
rei. A ciência do médico o faz trazer a fronte erguida, ele é admirado pelos
grandes.
Desde o século 4 a.C., a prática divinatória médica continuou
forte no universo cultural grego e alcançou os territórios romanos, mantendo a
metamorfose heroica associada à cura: deuses se destacavam no atributo do dom
de curar as doenças e as feridas de guerra.
A Medicina e os médicos atados às ideias e crenças religiosas
transpuseram as fronteiras greco-romanas, cristianizados no Ocidente, marcados
no ministério de Jesus Cristo, onde as curas milagrosas se destacam em muitas
passagens bíblicas, estabelecendo novos conceitos na prática médica: a caridade
cristã como instrumento de cura.
quarta-feira, 21 de junho de 2017
terça-feira, 20 de junho de 2017
ARMANDO DE MENEZES – com carinho
Pedro Lucas Lindoso
Armando de Menezes foi para a outra margem do rio. Com
certeza já encontrou dona Santa, sua amada mãezinha, e seus diletos irmãos. O
céu está em festa. Os Menezes são sempre alegres, festivos e principalmente
carinhosos.
A palavra carinho remete a afago, cuidado. Penso que é com
carinho que se deve cuidar das pessoas que nos são caras. Assim sempre agia
Armando de Menezes. Ele sabia dar carinho àqueles os quais queria bem. E tive o
privilégio de receber esse afago, esse carinho. Em gloriosas sextas-feiras
frequentando o Chá do Armando. Como já disse Jorge Tufic, “O chá do Armando é a
ceia dos poetas”.
Há várias razões para se frequentar o Chá do Armando, além de
poder usufruir desse carinho que emanava do nosso querido presidente Armando. O
papo gostoso de sempre. Ouvir e até cantar uma boa música. “A noite do meu bem” era a música favorita,
quando Armando homenageava a sua Ivete.
Ir ao Chá é importante, pois, como disse Antero de
Figueiredo, ilustre homem de Coimbra: “Quanto mais homens conheceres, mais
diferentes almas sentirás em ti. Folias com os alegres; sonhas com os poetas”.
Nas sociedades primitivas, os homens se reuniam ao redor da
fogueira. Hoje existem os clubes de serviços e os saraus. Reuniões festivas de
pessoas amantes das letras. O Chá tem um
pouco de tudo isso e muito mais.
Mas agora sentiremos com enorme saudade a ausência do nosso
samaúma. Ele que era a presença firme e sagrada em nossos encontros. E como o
vento, que bate nas sapopemas da samaúma, o Armando batia e vai bater sempre
forte nos nossos corações, com sua eterna generosidade, seus ensinamentos e seu
enorme savoir-vivre.
Tenho o privilégio de ser afilhado de crisma de Aderson de
Menezes, irmão do nosso saudoso Armando. Aderson de Menezes, primeiro reitor da
Universidade Federal do Amazonas. Um dos maiores juristas que nosso estado já
teve. Seu livro Teoria Geral do Estado
é um clássico.
Cresci ouvindo de meu pai que os irmãos Menezes eram gente da
melhor qualidade e sempre unidos. Foram unidos aqui nessa terra e com certeza
estarão juntos no céu, compartilhando afetos e muito carinho. E, como sempre,
um cuidando do outro. Porque ter carinho é cuidar.
Receba meu carinho, tio Armando. Descanse em paz.
segunda-feira, 19 de junho de 2017
domingo, 18 de junho de 2017
sábado, 17 de junho de 2017
sexta-feira, 16 de junho de 2017
Armando de Menezes (21/03/1926 – 15/06/2017)
O escritor Armando de Menezes era membro da Academia Amazonense de Letras e do IGHA. |
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quinta-feira, 15 de junho de 2017
Universidades produzindo rupturas e saberes
João Bosco Botelho
A compreensão cristã da relação entre doença e pecado
permaneceu inalterada, na Idade Média europeia, fazendo com que a atividade
médica perdesse as conquistas alcançadas no período greco-romano, interferindo
diretamente no novo rumo da Medicina atado ao milagre.
Como consequência do gradual fechamento das escolas de
Medicina, a partir do século 6, o número de médicos diminuiu significativamente
e grande parte dos atendimentos médicos aconteceram no interior dos mosteiros e
abadias, praticados pelos padres de diferentes ordens religiosas.
Entre os mosteiros que se destacaram no exercício da
atividade médica, o de Monte Cassino, na Itália, construído sobre antigo templo
de Apolo. Esse acontecimento, a substituição dos templos dedicados aos deuses
do panteão greco-romano pelas igrejas, foi sendo realizado de modo competente
pelas autoridades cristãs. As edificações eram conservadas e, na maior parte
das vezes, ampliadas, e as antigas imagens dos deuses do politeísmo eram
substituídas pelos do cristianismo. Os santos protetores cristãos tomaram os
lugares dos deuses curadores romanos.
Ao mesmo tempo, multiplicava-se também o uso de relíquias
para a proteção das doenças. Exemplo marcante dessa época pode ser sentido nas
palavras de Santo Agostinho: “O perfume de azeviche afugenta os demônios e seu
uso desata e desfaz o quebranto, ligaduras e encantamentos e todos os fantasmas
tristes e melancolia.”
Do mesmo modo, também é clara na descrição da peste negra
feita por Boccacio: “No ano de Nossa Senhora de 1348 ocorreu em Florença, a
mais bela cidade de toda a Itália, uma peste terrível, que seja, devido à
influência dos planetas, ou seja, como castigo de Deus aos nossos pecados...”.
Vários fatores intervieram para estruturar a concepção da
caridade cristã. Houve, certamente, influência desse entendimento na
transformação do serviço médico como trabalho profissional remunerado,
existente desde as primeiras cidades, no Egito e na Mesopotâmia, em sacerdócio
sem remuneração.
Existem muitas
manifestações artísticas, em pinturas e esculturas, nos principais museus do
mundo, entre os séculos 7 e 14, saudando e estimulando a prática médica como
atividade religiosa sem pagamento.
Em torno do século 10, os padres também exerciam práticas de
curas fora dos muros dos mosteiros. Nos anos seguintes, ocorreram graves
atritos com as populações por causa das complicações dos tratamentos, inclusive
mortes de doentes. Por essas razões, os religiosos foram proibidos de exercer a
atividade médica fora dos muros das abadias e mosteiros, por determinação dos
Concílios de Remis (1131) e de Roma (1139).
É possível que os reclamos populares tenham interferido no
aparecimento das universidades. A Escola Médica de Salerno, no Sul da Itália,
fundada ao lado de um convento beneditino, foi uma das primeiras em receber a
participação de médicos laicos. A Escola de Salerno é responsável perante a
História pela famosa frase: “Primo, non nuocere” ou “Em primeiro, não faça
mal”, restaurando um dos fundamentos mais importantes da Medicina hipocrática.
Pouco tempo depois,
surgiu a Escola de Montpelier, na França, com as mesmas características, isto
é, a fundamentação do ensino médico era baseada nas obras de Hipócrates e
Galeno.
O grande expoente da Escola de Montpelier foi Guy de Chauliac
(1300-1370), autor do livro Grande Cirurgia difundido em toda a Europa nos
séculos seguintes.
Neste período, começa a ser esboçado novo avanço nas ideias
por meio dos escritos de Thomás de Aquino (1225-1274). Professor em Montpelier,
reformulou o pensamento aristotélico que dominava a teologia medieval e retoma
a relação entre a fé e a razão iniciada por Abelardo (1079-1142). Nas
considerações filosóficas em torno do “será”, Thomás de Aquino afirma que a
perfeição máxima não é a ideia de ser, mas o ato de ser e rejeita a interferência
de Deus na autossuficiência do conhecimento humano. Com esta nova visão
teológica, o caminho para novos conhecimentos e indagações estava aberto, mesmo
que de forma ainda restrita, culminando, com a criação e o fortalecimento das
universidades de Bolonha e de Paris.
Os estudos da anatomia humana foram retomados pelas mãos de
Mondino de Luzzi(1270-1326), professor da Universidade de Bolonha, que realizou
a sua primeira dissecção humana em 1315. Como fruto das suas observações
anatômicas desacredita publicamente muitas afirmações de Galeno, que se
mantiveram intocáveis durante dez séculos. Os estudos de anatomia de Mondino
permaneceram como verdades absolutas até que Vesálio, em 1543, publicou o seu
maravilhoso tratado de anatomia humana “Human Corporis fabrica”.
Nos séculos seguintes até a atualidade, as universidades
provocam rupturas e saberes.
quarta-feira, 14 de junho de 2017
terça-feira, 13 de junho de 2017
Sobre pássaros e outras aves
Pedro Lucas Lindoso
A Semana do Meio Ambiente nos convida sempre a meditar sobre
a nossa Casa Comum. Esse planeta Terra tão maltratado e vilipendiado pelos seus
governantes.
Os passarinhos são sempre as primeiras vítimas do
desmatamento. Ao construir Brasília, Juscelino Kubitschek não precisou de
licença ambiental. Devastaram o cerradão para implantar os eixos e vias que
cortam o Plano Piloto da nossa capital.
Quando cheguei por lá a cidade estava sendo construída. O
cerrado assolado pelos tratores e máquinas. As primeiras superquadras, hoje
oásis de exóticas árvores e flores, eram áridas e sem passarinhos.
Depois de 60 anos, os brasilienses do Plano Piloto moram em
verdadeiros parques. Arborizados com árvores nativas e outras vindas de todos
os cantos do país. Plantadas por brasileiros chamados a construir e habitar a
nova capital do Brasil. Verdadeiros brasilienses que se ofendem ao serem
confundidos com políticos corruptos que frequentam a cidade por alguns dias na
semana.
E hoje se ouve o canto de passarinhos. Principalmente no Parque
da Cidade. Lá cantam bem-te-vis, curiós e sabiás, pardais e outros que disputam
os espaços com corujas, caburés e murucututus.
Aqui na Amazônia a diversidade de passarinhos é
fenomenal. O jacu-cigano têm a cor e o
porte do faisão. As araras e papagaios bem como os tucanos estão presentes em
grandes bandos na Amazônia. A arara canindé é azul e amarela. A arara escarlate
é a vermelha. O tucano grande, do papo branco, não bebe água dos rios. Vive no
alto das árvores e bebe água das folhas ou da chuva.
O Japiim ou Xexéu é um pássaro preto e amarelo. É imitador de
vários pássaros. Temos ainda o coró-coró, o aracuã, a jaçanã, o gavião-belo ou
gavião-panema, o cri-crió e muitos e muitos outros. Sem falar, é claro, do
Uirapuru, que é o rei dos cantos na Amazônia. O canto mais bonito da floresta.
Agora medo eu tinha da rasga-mortalha. Conhecida também como
Suindara. É uma coruja agourenta. Anunciava a morte. Ao chegar em Brasília,
ainda menino, fiquei feliz porque ninguém conhecia a tal da rasga-mortalha.
Mas infelizmente há muitas suindaras frequentando o Congresso
Nacional e adjacências. “Rasgando” as leis e a Constituição, quando deveriam
implementá-las, posto que para isso foram eleitos.
Mas como disse o grande poeta Mario Quintana. “Eles passarão,
eu passarinho”.
segunda-feira, 12 de junho de 2017
domingo, 11 de junho de 2017
sábado, 10 de junho de 2017
quinta-feira, 8 de junho de 2017
A doença como mal
João Bosco Botelho
Os corpos vistos e sentidos
como expressões de vida movem o ser pensante e finito para buscar as
explicações das mudanças produzidas nele e nos outros, interpretando como
antecipação da morte.
Ao chamarmos “paciente” o
homem doente, para diferenciá-lo do sadio, é inevitável aceitar dupla emoção
determinada pelo choque entre o real e o imaginário, causada pela consciência
da doença em si mesma. A primeira, realçada pelo visível e relacionada à
enfermidade (tumor, mancha etc.), e a segunda, fruto do exercício mental
procurando interpretar a alteração visível no corpo.
A experiência ou a
possibilidade de sentir dor serve como exemplo. O desconforto doloroso é o
componente real. A explicação dela, nascida no sofrimento, é profundamente
mesclada pelas raízes socioculturais integrantes do imaginário do doente.
O conjunto simbólico, ainda
sem explicação neurofisiológica finalizada, trabalha para dar sentido e unir o
objetivo ao subjetivo. Essa complexa elaboração cerebral utiliza mecanismos
cerebrais ainda muito pouco conhecidos, capazes de engendrar respostas mentais
intimamente relacionadas com o universo mítico do doente. O processo fisiológico determinado pela dor,
invisível, acaba consoante à mitopoese (mecanismos socioculturais que criam os
mitos).
Entre as muitas respostas
para superar o sofrimento, está a organização do MAL formando a objetividade da
doença como precursora da morte. Assim, é viabilizada a resposta fundamental do
corpo para entender a doença: o invisível se torna visível!
De maneira semelhante, a saúde
é transformada em BEM e colocada em oposição frontal à doença como MAL.
O movimento dialético entre
ser e não ser (aqui compreendidos como correspondentes aos binômios saúde e
doença, vida e morte) se faz sempre vinculado às forças contrárias (cósmicas,
morais e naturais) que se opõem ao ideal do projeto existencial ou da ordem
ético social.
A doença como MAL é sempre o
outro, localizado fora da ordenação desejada, que não o próprio ser.
Os modelos sociais colocaram
o outro, a doença, sempre absoluto e sobrenatural, acima e abaixo da terra. A
doença, como desordem, aparece no seguimento das transgressões do ritmo aceito como
bom, podendo ter natureza cósmica, moral e natural.
A alternância entre a saúde
(ordem, bom, belo, bem) e a doença (desordem, feio, mal) produzindo
enfermidades é o ponto fundamental e o limite que continua permitindo a
construção do saber médico fora da subjetividade, levando a edificação do
conhecimento do corpo, desvendando lentamente o escondido atrás da pele.
Esse extraordinário processo
tornou indispensável a presença dos agente especializados – médico, curador,
benzedor, erveiro, padres e pastores – para observar e interpretar o MAL, tanto
no espaço real quanto no imaginado das relações sociais. Por essa razão podem
ser entendidos como agentes da cura.
Esses personagens,
essencialmente normativos, historicamente têm se comportado como elos entre o
MAL e o BEM, já que é por meio da cura que se dá a passagem da doença ao sadio.
A capacidade desses agentes para desvendar a doença, tornando-a visível e
curável, dá ao ato da cura a construção mágica, porque se liga às emoções do
subjetivismo do MAL, como antítese da vida.
A ambiguidade dos saberes dos
agentes, técnicos em relação à doença e mágicos com o paciente, se edifica no
discurso bitonal capaz de ser utilizado também como instrumento de dominação.
Isto ocorre porque a doença, por mais insignificante que seja, representa
sempre a antecipação da morte. O agente da cura, como dono do saber para curar,
se coloca entre a vida e a morte.
O principal instrumento
legitimador do poder é o diagnóstico. É através do diagnóstico que os agentes
da cura identificam o MAL para, em seguida, extirpá-lo. É a precisão para transformar
o subjetivo em objetivo, o imaginário em material, que ampara as práticas de
curas, em especial, as da medicina.
A medicina se fez como
especialização social decifrando os mistérios dos corpos sadios e doentes em
permanentes transformações, tanto no espaço laico quanto no religioso das
relações sociais. A maior valorização de
um ou de outro segmento depende do conhecimento historicamente acumulado e
dominante da sociedade
O médico ao diagnosticar a
doença, para em seguida efetuar a cirurgia, e o benzedor reconhecendo o
espírito malfeitor para exorcizar, representam duas práticas de curas: a
primeira, com processos teóricos e a segunda, de natureza mágica, com objetivos
semelhantes e em espaços diferentes – afastar o MAL.
quarta-feira, 7 de junho de 2017
terça-feira, 6 de junho de 2017
O poder do KWY
Pedro Lucas Lindoso
Os irmãos Joesley e Wesley corromperam vários políticos.
Foram morar nos Estados Unidos. Deram uma banana para o Brasil. Pediram
desculpas. Como brasileiro, não as aceito. Corrupção ativa é crime quando feita
com o próprio dinheiro. No caso foi feita com dinheiro do BNDES – Banco
Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social.
Em Goiás, como no resto do Brasil, inclusive aqui no meu
querido Amazonas, é chique usar KWY nos nomes. O uso de dois “ll” ou dois “tt”
também. Parece que dá sorte ou
prestígio. Ou ambos. Até o juiz que apurava a operação, ilustre estudioso e
competente amazonense, Dr. Vallisney, tem esse privilégio.
Já Marcelo Odebrecht não teve a mesma sorte. Apesar do
impactante nome de origem europeia, ODEBRECHT não tem KW ou Y, nem mesmo uma
letrinha dobrada sequer.
Enquanto Marcelo pegou dez anos de cana, os irmãos “ley”,
Joesley e Wesley, nenhum dia. Nem mesmo no regime aberto, fechado ou
escancarado. E a tornozeleira? O Marcelo, coitado, vai usar o adereço por cinco
anos. Quem manda ser engenheiro, falar inglês e francês fluentemente. Moer
carne tem mais prestígio que construir pontes, estradas e hidroelétricas. Se
fosse batizado como Mark ou William teria mais sorte.
O pior mesmo é terem proibido o Marcelo de sair do país até
2025. Até lá o Brasil já vai ter comemorado 200 anos do Grito do Ipiranga.
Enquanto isso os irmãos “ley” estarão morando em Nova Iorque, na Quinta
Avenida, no Olympic Tower. Prédio construído pelo Onassis. Fica pertinho da
Catedral de Saint Patrick, dos melhores restaurantes, da Broadway e das lojas
Rolex e Prada. Podem rezar, comer e se divertir à vontade.
Shakespeare, no seu famoso Romeu e Julieta, legou para o
mundo, na fala de Julieta: "Que há num simples nome? O que chamamos rosa,
com outro nome não teria igual perfume?"
No caso de Marcelo Odebrecht parece que faltou um KWY ou pelo
menos uma letra dobrada.
O alfabeto português, nos termos do Acordo firmado entre
Portugal, Brasil e ex-colônias em 1945, baseava-se no alfabeto latino original,
com 23 letras, sem as letras K, W e Y. O Acordo Ortográfico de 1990 restaurou o
K Y e introduziu o W, fazendo o alfabeto português possuir 26 letras.
Ora, quem pode e tem grana para influenciar as leis e a
constituição de um país, pode facilmente influenciar um acordo ortográfico. É o
poder do KWY.
segunda-feira, 5 de junho de 2017
Sobre crises, dores e mudanças
Toda mudança nasce das dores de
uma crise.
A crise é o parto da mudança.
(João Sebastião)
domingo, 4 de junho de 2017
sábado, 3 de junho de 2017
sexta-feira, 2 de junho de 2017
as portas
Zemaria Pinto
talvez por influência do
Borges à cabeceira,
pela 3a. vez sonhei que
voava.
o curioso é que ao contrário das outras vezes
– quando atingi o orgasmo
–
caí em um rio pantanoso
apedrejado por duas
crianças
que não acreditaram em
mim.
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A poesia é necessária?,
Jorge Luis Borges,
Zemaria Pinto
quinta-feira, 1 de junho de 2017
Influências da medicina grega
João Bosco Botelho
É grande a influência da Medicina grega no vasto domínio
territorial romano. Após a terceira guerra púnica, os romanos consolidaram o
grande império no Mediterrâneo. Nos anos seguintes, muitos médicos emigraram
para territórios romanos e alguns intelectuais resistiram à Medicina grega
hipocrática. O historiador Marco Pórcio Catão, no século 2 d.C., expôs a
crítica: “Os gregos decidiram matar todos os bárbaros com a Medicina e a ainda
cobram por isto”. E em carta dirigida ao filho foi enfático: “Proíbo-te de
recorrer aos médicos.”
O espírito legislador romano não deixou de abordar as
atividades médicas. Com a regulamentação, os médicos constituíram categoria
profissional definida, tanto entre os homens livres quanto entre os escravos.
No o império de Adriano, no século 2 d.C., os médicos eram
dispensados do serviço militar e quase todas as cidades romanas dispunham de
assistência médica pública.
Em torno do século 4 d.C., a profissão médica foi severamente
fiscalizada e foi instituído rigoroso exame para todos que quisessem exercer a
profissão. O império romano subvencionava os estudantes de Medicina, que, em
troca, eram obrigados a prestar assistência aos pobres.
Existem registros da proibição do aborto como método
anticoncepcional e negar o atendimento a qualquer doente, sob risco de castigo
corporal e multa. Nessa mesma época, sob o império de Diocleciano, no ano de
300, um édito do Imperador impunha como condição para entrar na escola de
Medicina, a apresentação de certificado de boa conduta fornecido pelo comando
militar da cidade de origem.
A diferenciação entre médicos e cirurgiões foi reforçada.
Nesse sentido, Cícero falava dos médicos verdadeiros, o que corresponderia aos
clínicos gerais de hoje. Em seus versos, o erudito romano registrou as especialidades
médicas: “Cascelio extirpa ou cura os doentes; tu Igino, queimas os cílios que irritam
os olhos, Eros elimina as tristes cicatrizes dos servos e Hermes goza de fama
de ser o Podalírio das hérnias.”
Os historiadores da Medicina acreditam que o grande número de
especialistas na Medicina romana tenha sido consequência não somente dos
progressos técnicos, mas principalmente porque as especialidades eram mais
lucrativas para quem as exercia.
Alguns médicos especialistas romanos como Stertínio,
conseguiram formar grande fortuna como fruto do trabalho médico. Provavelmente,
em consequência dos abusos nos lucros obtidos por alguns médicos, no ano de 368,
o imperador Valentiano proibiu que os médicos empregados do Império recebessem
dinheiro dos doentes pobres.
Todos esses problemas pecuniários não impediram o
aparecimento de grandes expoentes na Medicina romana. Entre eles, o mais
destacado foi Galeno, considerado o sucessor de Hipócrates e que influenciaria
decididamente a Medicina medieval.
Cláudio Galeno nasceu em Pérgamo, na Ásia Menor, no ano de
130. Foi sem dúvida o mais famoso médico do seu tempo. As obras, a maioria
perdida, abordavam a anatomia, a fisiologia, a patologia, a sintomatologia e a
terapêutica. Foram publicadas em Veneza, em 1538, e constituiu fonte de
consulta dos médicos medievais.
Cláudio Galeno reforçou a teoria de Hipócrates ao admitir que
a predominância de determinado humor (fleuma, bile amarela, sangue e bile
preta) determinaria o aparecimento de um tipo específico de temperamento
(fleumático, colérico, sanguíneo, melancólico) que marcaria, definitivamente,
as relações entre a saúde e a doença das pessoas na vida social.
Professo do monoteísmo, a leitura dos textos de Galeno
tornou-se obrigatória tanto nas universidades cristãs do medievo europeu quanto
nas árabes. A teoria dos Quatro Temperamentos, como seguimento à teoria dos
Quatro Humores, se manteve admitida até o século 18.
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