Amigos do Fingidor

quarta-feira, 30 de abril de 2014

Fantasy Art - Galeria


Autor desconhecido.

domingo, 27 de abril de 2014

Manaus, amor e memória CLVII


Notem o detalhe: escrito em francês. Hoje, não falam nem português...

sábado, 26 de abril de 2014

Fantasy Art - Galeria


Arantza Sestayo.


quinta-feira, 24 de abril de 2014

Medalha do Mérito Cultural Péricles Moraes 2007 – 2/7



Zemaria Pinto

II

A história da família Tadros confunde-se com a história do Amazonas nos últimos 130 anos. O empresário José Roberto Tadros, a quem a Academia Amazonense de Letras tem a honra de homenagear nesta noite na categoria mecenato, representa a quarta geração dessa família, cuja primeira iniciativa comercial, a Tadros & Cia, remonta ao longínquo 1874.
Advogado, professor, cônsul honorário da Grécia, co-autor do livro Incentivos Fiscais  para  o Progresso do Amazonas, membro de diversas associações culturais – entre elas o nonagenário Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas, José Roberto Tadros amealhou até esta data mais de 80 comendas (estrangeiras, nacionais e locais), nas mais diversas áreas, que o credenciam como uma das mais importantes personalidades do nosso Estado. A essas honrarias, soma-se hoje a Medalha do Mérito Cultural Péricles Moraes, como reconhecimento ao seu trabalho, especialmente à frente do SESC, incentivando a música popular, a dança, as artes plásticas, a literatura e o teatro.
Mecenas, o fiel conselheiro de Otávio Augusto, preservou para a posteridade a imagem de desinteresse no apoio que deu a Virgílio, Horácio, Propércio e Vário. Se é verdade que ele sugeriu a Virgílio o tema das Geórgicas, também é verdade que não censurou ou interferiu no trabalho de seus protegidos. A liberdade de criação está, pois, atrelada ao mecenato. Tadros não faz diferente: delega, gerencia, exige, confia. Ou não seria possível multiplicar-se em tantos para dar conta dos múltiplos afazeres. Administrar cultura é administrar egos, muitas vezes explosivos – é preciso pulso firme para não deixar o interesse individual sobrepor-se ao coletivo. Mas, assim testemunham aqueles que lhe estão mais próximos, a carapaça esconde uma sensibilidade refinada e uma visão de futuro privilegiada. Tadros acredita que todos têm direito e devem ter acesso à arte e à cultura.
Alguns dos projetos do SESC atravessam décadas, como a Feira de Livros, que vai para a vigésima primeira edição, formando leitores e promovendo a literatura – e da qual muitos dos aqui presentes, eu inclusive, participamos ativamente. Um projeto singelo como o Festival de Calouros vai para sua 27ª edição, tendo revelado vários dos talentos que hoje brilham nos palcos da cidade. Outros deixaram saudade, como o Zonarte, que reunia música, dança, teatro e artes plásticas; e Nosso Mercado, que teve como foco a revitalização do Mercado Grande enquanto espaço cultural. O desfecho, com a Noite Tribaleu estava –, foi inesquecível. Aliás, há uma tendência a transformar os antigos mercados em amostras da vocação cultural de uma cidade, refletindo seus vários matizes. O Projeto Nosso Mercado passava essa mensagem, que, parece, não foi escutada.
Tenho em mãos a Antologia de Contos do SESC, publicada no final do ano passado. Eis um belo exemplo do trabalho de Tadros. Conforta-me encontrar nomes conhecidos de ex-alunos, mas, principalmente, alegra-me vislumbrar naquele pequeno livro o futuro acontecendo: ali estão, saindo do casulo, alguns dos nossos vindouros companheiros de ofício.  
Não deixo de registrar a Galeria Moacir Andrade, palco de incontáveis exposições. Aliás, o nosso querido confrade Moacir vai ganhar agora do SESC um Memorial, o que enfatiza a preocupação de Tadros com a valorização do artista amazonense. O interior começa também a ser contemplado, com a restauração de uma casa antiga em Manacapuru, onde funcionam projetos de cinema, leitura e atividades ligadas à música e ao teatro. Todos esses projetos contam com o apoio integral e o acompanhamento direto de José Roberto Tadros.
Tendo iniciado suas atividades nos anos 60, o TESC, o Teatro Experimental do SESC, ficou um longo tempo emudecido, retornando às suas atividades há cinco anos, com o apoio incondicional de Tadros. Os bons tempos voltaram, com Márcio Souza à frente, enchendo de criatividade aquele iluminado espaço da Henrique Martins. Aos balzaquianos A Paixão de Ajuricaba, Dessana Dessana e As Folias do Látex juntaram-se os novos Hamlet, Marx na Zona e Sábados Detonados – irreverentes, antropofágicos, escrachados, mas sobretudo críticos e independentes.
Música, dança, artes plásticas, teatro, literatura. Essa tem sido a açãodiscreta, mas determinada; simples, mas ousada – de José Roberto Tadros em favor da cultura e das artes do nosso Estado. A justa homenagem que hoje lhe prestamos é um pedido para que faça mais e mais: o Amazonas, penhorado, agradece.

Sábado na Academia: Armando de Menezes fala sobre Araripe Júnior




Academia Amazonense de Letras promove 10ª edição da Medalha do Mérito Cultural Péricles Moraes



Nesta sexta-feira, 25 de abril, às 20h, a Academia Amazonense de Letras estará promovendo, pelo 10º ano consecutivo, a entrega da Medalha do Mérito Cultural Péricles Moraes, em homenagem a um de seus fundadores, presidente do sodalício durante muitos anos, e intelectual de renome nacional.
A Medalha do Mérito Cultural contempla três áreas: Letras, Artes e Mecenato. Nos anos anteriores, 27 diversos escritores, artistas, empresários e instituições foram contemplados com a Medalha, como Milton Hatoum, Astrid Cabral, Coral João Gomes Júnior, Nivaldo Santiago, Phelippe Daou, Ivete Ibiapina, Oscar Ramos, Instituto Dirson Costa, entre outros.  
Este ano, a Academia Amazonense de Letras concederá a comenda a:
LETRAS – Alcides Werk, in memoriam. Um dos mais expressivos poetas do Amazonas, nasceu no Mato Grosso do Sul, mas viveu grande parte de sua vida no interior amazonense, notadamente em Maués e Nhamundá. Sua poesia, além de grande força telúrica, é representativa do repúdio ao golpe militar de 1964 e à ditadura que se instalara então. Deixou vários livros de poesia, entre os quais Trilha dágua, Poemas ribeirinhos e Da noite do rio
ARTES – Sergio Cardoso. Artista plástico, fotógrafo, cineasta e dramaturgo, é o mais inquieto artista de sua geração, sempre em busca do novo, sempre desafiando o óbvio. Com uma produtividade impressionante, mantém o ritmo de duas exposições ao ano, sem deixar cair a qualidade. Como dramaturgo, é um dos mais produtivos, com mais de 15 peças encenadas. Está por lançar o livro, já pronto, Teatro urbano das mulheres de Lazone.
MECENATO – Fazenda da Esperança. Uma obra social mantida pela Arquidiocese de Manaus, tendo à frente o bispo auxiliar D. Mario Pasqualotto, foi fundada em 2001. É um centro para recuperação de dependentes químicos, com 100 vagas para o público masculino e 30 vagas para o feminino, além de manter uma unidade em São Gabriel da Cachoeira, também com 30 vagas, para o público masculino. A metodologia empregada, baseada em valores cristãos, assenta-se no tripé “religiosidade, trabalho e convivência, social e familiar”. Trabalho essencialmente voluntário, a Fazenda da Esperança tem contribuído para a recuperação de centenas de jovens, que voltaram ao convívio da família e a tornar-se cidadãos.   

A saudação aos agraciados será proferida pelo acadêmico Zemaria Pinto.

O pajé tupinambá



João Bosco Botelho


         Em maio de 1986, as agências de notícias divulgaram a pajelança do cacique Raoni no pesquisador Augusto Ruschi, gravemente enfermo, com cirrose hepática. O aparecimento da doença foi associado ao veneno de um sapo dendrobata, que teria sido inoculado no ornitólogo durante uma das suas viagens ao Amazonas.
         As imagens da pajelança foram vistas por milhões de pessoas, no mundo, fascinadas com o cacique Raoni soprando fumaça de tabaco sobre o pesquisador e fazendo gestos invocando os espíritos dos mortos, para ajudar na cura do grande naturalista.
         O ritual se prolongou alguns dias e não mudou o curso da enfermidade. O inesquecível Augusto Ruschi morreu algumas semanas depois, num centro de tratamento intensivo, em Vitória do Espírito Santo.
         As sociedades científicas divulgaram notas explicativas sobre certas características das mais de quarenta espécies da família Dendrobatidae: apesar de bem estudada, não existia registro de os venenos serem capazes de determinar cirrose hepática. Esses anfíbios possuem algumas glândulas subcutâneas onde secretam  alcaloides que em contato com a pele humana causam somente pequenas queimaduras na pele.
         Chamou atenção da imprensa internacional o apoio oferecido pelo presidente da república para que o ritual fosse consumado o mais rápido possível, tendo inclusive oferecido o transporte aéreo para levar o pajé até o pesquisador.
         Como ponte para compreender aquele interesse coletivo em torno da pajelança para salvar a vida do ornitólogo, seria bom relembrar a importância do pajé tupinambá no Brasil colônia.
         Existem várias expressões de origem tupi para designar o personagem que exercia durante os primeiros séculos da colonização portuguesa o domínio das práticas de curas entre os tupinambás. Stradelli reconhece o pajé como sinônimo de paié: ''É o médico, o conselheiro da tribo, o padre, o feiticeiro, o depositário autorizado da ciência tradicional. Pajé não é um qualquer. Só os fortes de coração, os que sabem superar as provas de iniciação, que têm o fôlego necessário para ser pajé''. Por outro lado, pagi, pay, payni, paié, paé, piaecé, piaché, pantché são variações de pajé, formadas etimologicamente por pa-yé, aquele que diz o fim ou profeta.
         A relevância social do pajé tupinambá pode ser entendida a partir das várias descrições dos agentes coloniais, entre séculos 16 e 18. A maior parte identificando-os como elementos de resistência à dominação; poucos, elogiando os saberes historicamente acumulados.
         O jesuíta José de Anchieta, um dos primeiros a olhar o pajé como feroz inimigo, escreveu: ''Já não ousas agora servir de teus artifícios, perversos feiticeiros, entre povos que seguem a doutrina de Cristo: já não podes com mãos mentirosas esfregar membros doentes...". Contrariamente, o médico Guilherme Piso, chefe dos Serviços Médicos das Índias Ocidentais, da comitiva de Maurício de Nassau, registrou: “Prescindem de laboratórios, ademais, sempre têm à mão sucos verdes e frescos de ervas. Rejeitam os remédios compostos de vários ingredientes, preferem os mais simples”. Ao retornar para a Holanda, após a expulsão dos holandeses, Piso levou consigo muitos remédios prescritos pelos pajés tupinambás, em especial as que evitavam as amputações dos pés, quase sempre seguidas da penosa morte pela infecção.

         A esperança de curar o imortal ornitólogo Augusto Ruschi com o sopro da pajelança estava justificada numa história de longa duração.

quarta-feira, 23 de abril de 2014

Fantasy Art - Galeria


Renso Castañeda.

terça-feira, 22 de abril de 2014

O mau-humor no tempo da ópera




As pessoas se enganam quando dizem que a ópera já não é a mesma. Ela é a mesma – e este é o problema.
(Noël Coward)


Não quero saber em que língua a ópera será cantada – desde que seja numa língua que eu não entenda.
(Wilson Mizner)


O cúmulo da estupidez é o sujeito dar um dó de peito com um punhal cravado no dito cujo.
(Luiz Bacellar)


segunda-feira, 21 de abril de 2014

Lábios que beijei 18



Zemaria Pinto
Emiliana


A história da família de Emiliana emprestava-lhe uma aura trágica: traições, vinganças, assassinatos. Mas Emiliana era uma flor silvestre colhida nos ermos daquela cidadezinha do interior. Era de uma brancura extrema, um cor-de-rosa tênue, que se intensificava no contraste com os cabelos negros, encrespados, curtos. A visão das pernas de Emiliana era arrebatadora: na minha lembrança, elas estão sempre envolvidas em uma indefinível luz. Sabendo-se desejada, era generosa, sempre vestida em leves peças coloridas e um tanto transparentes. Em certa ocasião, não lembro exatamente por qual motivo, pois ela vivia cercada de gente, atraída pela sua beleza e pelas fábulas do seu entorno, vi-me sozinho com Emiliana. Conversávamos banalidades, coisas de escola, sentados no chão. Era um sofrimento desviar os olhos das pernas de Emiliana. Percebendo meu desconforto, ela chegou mais perto, tomou minha mão direita e estendeu-a sobre a carne rija de sua coxa de sonho. Na boca de Emiliana, o aroma das flores do campo, a doce doçura da língua de Emiliana e uma vertigem que ainda hoje me toma, quando relembro aquela cena. Nunca mais, nunca mais fiquei sozinho com Emiliana.

domingo, 20 de abril de 2014

Manaus, amor e memória CLVI


Panorâmica do porto de Manaus.
Ao fundo, à esquerda, o Teatro Amazonas, São Sebastião e a Matriz.

sábado, 19 de abril de 2014

Fantasy Art - Galeria

 
Andrômeda.
Boris Vallejo.
 

quinta-feira, 17 de abril de 2014

Medalha do Mérito Cultural Péricles Moraes 2007 – 1/7



Zemaria Pinto

I

Em sua terceira edição, a medalha do Mérito Cultural Péricles Moraes ainda suscita algumas dúvidas curiosas. Quais os critérios para a escolha dos nomes? Por que um mecenas entre dois artistas? Quem foi mesmo esse Péricles Moraes? Este ano, me perguntaram se a Ivete homenageada era filha daquela quenome à Casa Ivete Ibiapina, na 10 de Julho... Também me perguntaram se o Milton Hatoum era mesmo amazonense...
À primeira pergunta, com relação aos critérios, tenho respondido que, além de ser amazonense ou aqui militar em sua área, a Academia leva em consideração para a escolha dos homenageados o conjunto da obra. Hoje temos aqui três amazonenses, manauaras, de sucesso: um empresário que aposta nos artistas locais, uma pianista que fez história como professora de várias gerações e um romancista consagração pela crítica e pelo público.
À pergunta sobre o mecenas, digo que acho que deveríamos homenagear não um, mas dois, pois assim talvez estimulássemos o aparecimento de outros, pois os artistas e a arte precisam deles.
Sobre o velho Péricles Moraes, respondo que eu mesmo atépouco tempo, ignorante, não o conhecia. Esta festa anual em sua memória tem o objetivo de tornar sua lembrança perene entre nós, pois, não à toa, os mais antigos metaforizam a Academia como a “casa de Péricles Moraes” – aqui ele esteve por 48 anos, tendo sido um de seus fundadores e, além do presidente Adriano Jorge, o único a discursarduplamente, inclusive – na memorável noite de 09 de janeiro de 1918, quando se deu a instalação da Sociedade Amazonense de Homens de Letras, da qual esta Academia é legítima sucessora. Naquela ocasião, Péricles Moraes fez a apologia do seu patrono, o romancista e ensaísta Gonzaga Duque, tecendo um breve estudo crítico de sua obra e salientando as características de sua arte, conforme noticiou um jornal da época.[1] Gonzaga Duque, autor de Mocidade Morta, era o profeta daquela religião que tinha deuses franceses e um mártir brasileiro, jamais canonizado, dito João da Cruz e Sousa, também chamado de Cisne Negro e Dante de Ébano.
Na sequência, o orador discorreu sobre “O Tolstoismo e a verdadeira concepção da beleza”. O mesmo jornal arremata que “no desenvolvimento da tese que constituiu a parte mais importante de sua conferência, o orador foi imaginoso e fecundo, fazendo a longa e torturada psicologia artística de Tolstoi, o incomparável solitário de Yosnaia Poliana, misto de demagogo e de artista, cujo nome atravessou as fronteiras da Rússia e causou a admiração do mundo, como o filósofo mais singular do seu tempo.” É claro que o sentido que o jornal dava para a palavra demagogo não era o mesmo que damos hoje para classificar certos tipos públicos.
Parece-me que aquela jornada dupla do bom Péricles, na noite de 09 de janeiro de 1918, falando em nome dos 30 fundadores da nossa Academia, inoculou-nos para sempre esse pendor pelos discursos acadêmicos

Obs: Discurso proferido pelo acadêmico Zemaria Pinto, por ocasião da solenidade de entrega da medalha do Mérito Cultural Péricles Moraes, realizada na sala do Pensamento Amazônico, sede da Academia Amazonense de Letras, a 28 de abril de 2007.





[1] A CAPITAL. Manaus: 11 de janeiro de 1918. Arquivo do IGHA. Não temos elementos para afirmar com precisão, mas no livro de Péricles Moraes Intérpretes da Amazônia (Manaus, Valer, 2001) há um ensaio intitulado “Pela glória de Gonzaga Duque”, que poderia ser o mesmo texto de 1918.  

Gabriel Garcia Márquez (06-03-1927 / 17-04-2014)

Gabriel Garcia Márquez, por Toscano.

Práticas de curas no cristianismo primitivo



João Bosco Botelho

         As ideias e crenças religiosas continuam explicando aspectos da natureza circundante e, ao mesmo tempo, são usadas em certos controles sociais. As teogonias (nascimento dos deuses e deusas relacionados à formação do mundo) e a cosmogonia (narrativa, doutrina ou teoria que explica a origem do mundo e do Universo) estão ligadas aos ciclos naturais visíveis como à chuva, fecundação do solo, seca e às pestes.
         As regras garantindo a saúde e evitando a morte, no Antigo e no Novo Testamento, são suficientes para estabelecer vínculo entre o processo histórico da consolidação da medicina como instrumento social voltado à compreensão e cura das doenças, entre os séculos 1 a.C. e o 1 d.C.,  e o cristianismo primitivo.
         Tanto naquele tempo quanto nos dias atuais é facilmente identificável a grande distância entre a medicina dos ricos e a dos pobres. Parece-nos ser importante partir desse pressuposto: as práticas médicas oferecidas aos cidadãos romanos e os próximos da corte eram melhores que a recebida pelos escravos e oprimidos pela ordem dos imperadores.
         O cristianismo surgiu em condições sociopolíticas sob o regime escravista do Império Romano. Nessa época, as massas populares, parte delas de origem judia, que continuavam fugindo após a diáspora, tiveram um papel fundamental na construção do pensamento cristão. É possível que a medicina praticada por esse povo, habitante nova no espaço geográfico aonde se formaria o cristianismo, fosse impregnada dos preceitos médicos do Antigo Testamento.
         De acordo com os exegetas as fontes cristãs que remontam às origens do cristianismo não são muitas. Apesar das controvérsias uma das tendência acredita que a mais antiga seja o Apocalipse de São João, do ano 68; seguido das Epístolas, da metade do século 2; dos Evangelhos, da segunda metade do mesmo século, e a mais recente de todas as fontes históricas cristãs, o Ato dos Apóstolos. Isto quer dizer que não foi encontrado documento cristão produzido no século 1.
         Por essas razões é razoável pressupor que a medicina praticada pelos cristãos dos primeiros séculos estivesse mais próxima das práticas médicas judaicas. Possivelmente, por essa razão, o cristianismo primitivo pode ter incorporado o conceito da doença como castigo pelos pecados cometidos, existente séculos antes, entre os judeus da diáspora. Na realidade, essa interpretação da doença, sob a exclusiva interpretação das ideias e crenças religiosas, compreensão do sagrado, está presente desde os primeiros registros, na Mesopotâmia, Egito e Índia, nos respectivos livros sagrados dessas respectivas culturas.
         Afora o sentido sagrado neotestamentário, de inigualável senso religioso, os Apóstolos também entenderam Jesus Cristo como profeta (Mt 16,14; Lc 7,16; Jo 4,19 e 9,17) capaz de provocar milagres.
         Estabelecendo o juízo de valor, o grande Thomás de Aquino dividiu os milagres em absolutos ou de primeira ordem e relativos ou de segunda ordem. O milagre apologético, sempre de primeira ordem, serve de louvor. Deve ser perceptível e confirmar a origem divina da revelação. Tem particular interesse o aspecto físico porque é observável nos corpos. Logo, a cura de uma doença, considerada fatal e irreversível, pode ser entendida como milagrosa e um sinal de Deus.

         A extraordinária beleza descritiva apostólica dos milagres operados por Jesus Cristo, inclusiva na prática médica dos primeiros tempos cristãos, envolve a essência da medicina como prática social: a generosidade que cativou o mundo e consolidou a Nova Aliança. 

quarta-feira, 16 de abril de 2014

Fantasy Art - Galeria

 
Luis Royo.



terça-feira, 15 de abril de 2014

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Sobre versejadoras histéricas e medíocres



Não intento aludir, é claro, à farândola desconcertante das versejadoras histéricas e medíocres que, à sombra dos dislates de um falso modernismo, e numa linguagem referta de cacologias, no mesmo passo corrompem e desmoralizam a arte e o idioma.

Péricles Moraes (1882-1956),

no ensaio “Exaltações da poesia tropical”, onde ele analisa a poesia de Violeta Branca, tirando o corpo e a pena fora da poesia rola-bosta.

Quanta atualidade!

domingo, 13 de abril de 2014

Manaus, amor e memória CLV


Chegada de um navio no porto de Manaus, antes da construção do Roadway.
O desembarque era feito em pequenos barcos, pois os navios de grande calado não podiam atracar.
Ao fundo, a matriz da Conceição.

sábado, 12 de abril de 2014

Fantasy Art - Galeria


Steven Kenny.

sexta-feira, 11 de abril de 2014

Otelo Solo na Aparecida


Otelo Solo - de Zemaria Pinto, dirigido por Nereide Santiago, com o ator Arnoldo Chaves -
será apresentado sábado, dia 12 de abril, às 19h,
no Teatro Comandante Ventura - Centro de Convivência do Idoso,
no bairro de Aparecida.  

quinta-feira, 10 de abril de 2014

Caravana Literária – gênese e apocalipse



Zemaria Pinto

No princípio era a palavra. E a palavra vestiu-se de música. E a palavra se fez canção. No princípio era a canção.  E a canção fez-se poema. E do poema brotou a poesia. No princípio era a poesia. Assim nasceu a poesia. Porque o poema e a canção nasceram da mesma semente e mesclaram-se e fundiram-se e viraram-se pelo avesso, feito dois amantes enlouquecidos, confundindo pernas e braços e peitos e línguas – os olhos fechados fitando o infinito.

O que é poesia?, pergunta a menininha, com um brilho estranho nos olhos: ela sabe que essa pergunta não tem resposta. Poesia não se define, garota. Poesia é emoção? Não, a gente faz poesia pra não sofrer do coração. Poesia é confissão? Não, poesia é ficção e fricção. Poesia é comunhão? Não! Poesia é fratura exposta. Poesia é rompimento, fragmentação. Poesia é (revire os olhinhos) “exercício de linguagem”? Não! Poesia é imaginação. “Um boi e um homem são levados ao matadouro. O primeiro a berrar é o homem. Mesmo que seja o boi.”

O que é poesia, então?, pergunta o garotinho, com um sorriso igualzinho ao do Chuck. Poesia não se define, menino, não enche. Poesia é luz? É escuridão! Poesia é sonho? É a realidade da vida banal! Poesia é sentimento? Não, poesia é alegria, alegoria, fantasia. Poesia é carnaval!

Antes mambembes, agora somos profissionais. Mas não tente tirar a máscara da nossa face. Nãomáscara, somos assim mesmos... A Caravana Literária, de fevereiro a fevereiro, saúda o distinto público e pede passagem. Evoé!

Manaus, Fevereiro de 2006

__________________________________________

A Caravana Literária começou a atuar nas escolas públicas em 2004, como uma forma de divulgar a produção poética dos participantes e incentivar alunos e professores a apreciar a literatura que se faz no Amazonas. A partir de meados do ano seguinte, o grupo estruturou-se em torno dos poetas Aldisio Filgueiras, Davi Ranciaro, Dori Carvalho e Zemaria Pinto, com a participação do grupo Jiquitaia, que, tendo à frente o compositor Mauri Marques, tem um trabalho voltado para, por meio da música, divulgar a poesia amazonense.

Sábado na Academia, Abrahim Baze e Estelita Tapajós

 

Deuses gregos curadores: Apolo e Asclépio



João Bosco Botelho

         O contínuo movimento dos homens e mulheres é uma das principais diferenças da cultura grega das anteriores que se desenvolveram nas margens dos rios Indo e Nilo. Ao contrário das pinturas e esculturas, estáticas frontais ou laterais, egípcias e mesopotâmicas, a grega mostrava os corpos em movimentos.
         De maneira semelhante, talvez mantendo laços na construção cultural, a teogonia (nascimento dos deuses e deusas relacionados à formação do mundo) e a cosmogonia gregas (narrativa, doutrina ou teoria que explica a origem do mundo e do Universo) se assentaram na grande mobilidade de deuses e deusas descritos com qualidades e defeitos equiparados aos dos humanos.
         Na complexa construção do panteão (conjunto de deuses e deusas de determinada religião politeísta) grego reproduzindo o nascimento das divindades, como se atavam às agruras humanas e os caminhos míticos das soluções, sem dúvida, receberam destaque os deuses mais competentes para curar doenças temidas.
         Apolo, filho de Zeus e Leto (uma das amantes prediletas de Zeus), adorado na Grécia e nas cidades do Mediterrâneo oriental, como deus da luz do sol, vencia a obscuridade; da purificação, trazia a benção da pureza do belo; da harmonia, vencia os conflitos; e da adivinhação, mostrava aos homens e às mulheres o caminho da cura. Ao mesmo tempo, o povo grego também reconhecia e temia Apolo como cruel vingador quando se sentia contrariado, matava os inimigos com as flechas de ouro certeiras, presentes de Zeus, logo após seu nascimento.    
         Na Grécia, o mito da carruagem trazendo o sol luminoso se ligou a Hélios e seu filho Faetonte.  Após a conquista romana, nas representações artísticas que incluem moedas, pinturas e esculturas de mármore e bronze, Apolo se confunde com Hélios, o deus-sol grego. As imagens metamórficas desse poderoso deus curador penetraram no território romano, sempre ligadas às proteções das doenças, talvez por essa razão, indissoluvelmente atado ao controle do sol radiante.
         Com as qualidades e defeitos humanos, Apolo foi infeliz em algumas paixões, rejeitado e traído em outras. Contudo, gerou descendências de natureza divina, de heróis e de semideuses. Entre as onze mulheres amadas por ele que geraram onze filhos, se destacou a paixão avassaladora com Coronis, filha de Flégia, rei da Tessália. Dessa união plena de dramas e artimanhas nasceu Asclépio, que se tornaria o mais importante deus curador grego, a partir do século 4 a.C., vivamente festejado no dia 12 de outubro em grandes procissões nas ruas.
         Após a conquista da Grécia pelas legiões romanas, Asclépio absorvido na cultura mítica do conquistador, recebeu o nome de Esculápio. As grandes festas públicas que comemoravam Asclépio e Esculápio continuaram com grandeza crescente. O cristianismo em franca ascensão não conseguia conter o culto desses deuses curadores. O sincretismo não tardou, as autoridades eclesiásticas determinaram que 12 de outubro fosse o dia do nascimento de Lucas, o apóstolo médico. Desse modo, na atualidade, muitos médicos continuam comemorando o “Dia do Médico” sem saberem que se trata do “Dia de Asclépio”.

Como no mito de Gilgamesh, do panteão mesopotâmico, no qual o herói presenciou a planta da vida eterna ser comida pela cobra, que imediatamente após, renasceu perdendo a pele, a condição mortal humana está expressa na morte de Asclépio, determinada por Zeus por meio dos raios dos Ciclopes, temendo que a ordem natural do mundo fosse alterada pela ressuscitação os mortos.

quarta-feira, 9 de abril de 2014

Fantasy Art - Galeria


Arantza Sestayo.


terça-feira, 8 de abril de 2014

Edifício Marquês de Sade


No livro Edifício Marquês de Sade, o escritor amazonense Tenório Telles estreia no universo dos contos eróticos. Ele é organizador da obra, junto com os paulistas Roberto Fabra e Daniel Vas, e também assina dois textos: “A sétima lua cheia” e “Os peitos de mamãe”. 

A obra é resultado de uma oficina de criação literária que Tenório participou em São Paulo. “O livro é fruto de um trabalho que participei sob orientação do escritor Marcelino Freire que promove anualmente uma oficina de criação literária com ênfase no conto. Uma das atividades práticas foi criar contos com temática erótica. Ao final, nós fizemos uma seleção com os melhores textos e dessa seleção resultou o livro”, comenta.

Conhecido por seu trabalho com a poesia, Tenório conta como foi a experiência nesse novo gênero: “Eu já havia escrito alguns contos como exercício mesmo, mas a minha relação de criação literária é com a poesia. Não tinha pretensão de escrever ficção e, sim, meus ensaios e textos para o teatro. Mas com essa experiência me senti estimulado. Foi  um bom exercício até de sutileza porque ao escrever um conto erótico, você corre o risco, se não souber dosar, de descambar para a vulgaridade, para a pornografia. É um exercício de contenção”, pontua.

O escritor adianta que está escrevendo novos textos do gênero para, em breve, publicar.

“Já penso em publicar um livro só com textos eróticos. Já estou escrevendo. É uma experiência libertadora. As pessoas têm muitos pudores, ficam constrangidas de falar sobre sexualidade. Isso é uma grande bobagem porque a sexualidade é inerente à vida”.

Sobre a obra

Edifício Marquês de Sade (o título já acende a nossa curiosidade) traz, na sua apresentação, o seguinte parágrafo: “Pode entrar. No Edifício Marquês de Sade, são bem-vindos todos os gêneros, credos, medos, arroubos. Venha você de onde for. E parta para onde quiser. Quem chega aqui só não consegue sair igual ao que entrou”

A porta do Edifício encontra-se aberta, aliás, escancarada. O anunciante do convite diz que todos são convidados, mas, pergunto-me: Todos mesmo? Ou somente os de “passos mansos”, os “sem pudor”, os “poucos com maldade”, os “todos sem saciedade”?

A resposta às questões só poderá ser encontrada se entrarmos no Edifício Marquês de Sade; quando nos ambientamos nos seus quartos ou olhamos para além das suas janelas; quando, na imaginação, construímos a sala, com um piano, diante dele um pianista sem rosto, num restaurante vazio. A ideia do Edifício começa, então, a ser nítida.

No Edifício, vivem-se sentimentos, insinuam-se queixas, lamentos e situações doces e, ao mesmo tempo, caóticas, por serem esperas desesperançadas, por serem, apenas, memórias, coisas do inconsciente, aparentemente sem nexo ou importância. Mas também dores e sentimentos reais: abandono, sofreguidão, esperança e amor.

O Edifício alardeia um fogaréu. É Cecília, a esposa dedicada de um grande investidor, num dos seus atendimentos em horário comercial. E... por aí vai... até os contos finais, que se fecham em “A sétima lua cheia”, que tem Morgana (a fantasia, o júbilo, a artimanha e o ardil) como protagonista. Não seria o Edifício Marquês de Sade se não entrelaçasse a loucura, a fantasia, a virgindade, a prostituição, a beleza e o torpor espelhados pela Sétima Lua Cheia sobre finos lençóis de linho.

 

Evento: Lançamento de livro

Título: Edifício Marquês de Sade

Organizadores: Tenório Telles, Roberto Fabra e Daniel Vas

Data: 12 de abril de 2014 (sábado)

Horário: 10h

Local: Livraria Valer - Avenida Ramos Ferreira, 1195 ─ Centro

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Lábios que beijei 17



Zemaria Pinto
Monga


Nunca lhe soube o nome verdadeiro, mas as duas semanas em que Monga, a mulher-gorila, esteve na cidadezinha à margem do verde rio foram de absoluto êxtase. O espetáculo era tosco. A maquiagem, pré-King Kong – filme que assistíramos no ano anterior, no poeira da cidade, em rolos insuportavelmente picotados. Mas Monga, a atriz – por que não? –, era de uma beleza angelical. Como faziam aquela monstruosidade de mau gosto a uma moça tão bela? Magra, alta (pelo menos, para os meus 12 anos), os cabelos crespos, negros, derramados sobre a pele rosacobreada, o nariz afilado, os olhos negros e a boca – a boca sutilmente desenhada, num matiz carmim. Por trás da tenda onde se dava a metamorfose em duas sessões noturnas, havia um trailer, que funcionava como camarim. Por uma fenda na parede, amei Monga noturnamente, por duas semanas – antes e depois dos espetáculos. O seu corpo, despido do leve vestido cotidiano, cobria-se inteiro com a negra roupa de cena, botas e luvas negras – somente o rosto à mostra.  Passados mais de setenta anos, ainda sonho com Monga, o seu rosto, apenas – os olhos semicerrados –, flutuando assimétrico na escuridão, onde não distingo mais nada, nem mesmo as minhas criminosas mãos.