Amigos do Fingidor

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2025

A poesia é necessária?

 

Espartanas tardias

Ecila Mabelini



Mulheres fortes se esconderam atrás de homens fracos que o mundo saudou.


Mulheres fortes se entregaram com fúria e vontade, sem temor e nem autopiedade às verdades que o coração revelou.


Mulheres fortes viveram dores escondidas em poços sem vaidades e macularam verdades, sem culpa ou crueldade, apenas porque o corpo sonhou.


Mulheres fortes maceraram sentimentos como unguentos capazes de curar as feridas e os lamentos anavalhados pelo tempo.


Mulheres fortes foram punidas por serem aguerridas, incontidas, pervertidas, incomuns.


Por não serem santas, por serem loucas, por serem soltas.


Por não serem rastros, por terem lastro.


Mulheres fortes descalçaram algozes, acenderam vozes, marcaram espaço; território sacro, fogueira que ninguém nunca apagou.



terça-feira, 25 de fevereiro de 2025

Fisioterapeuta de passarinho

Pedro Lucas Lindoso

 

Uma queda. Abaulamento discal e artrodese me levaram a uma cirurgia da coluna. Fiquei com a mobilidade comprometida.

Foi assim que precisei dos serviços profissionais de um fisioterapeuta.  Sabia que a fisioterapia era importante para recuperação e melhora da minha mobilidade.

Minha experiência com fisioterapeutas tem sido a melhor possível e bastante gratificante. O fisioterapeuta que me atende no momento é o Reinaldo Souto. Ele combina exercícios terapêuticos com mobilização articular e hidroterapia. Eventualmente usa terapia manual e aplicação de ventosas.

Além da melhoria da mobilidade, com aumento da amplitude de movimento e flexibilidade, a fisioterapia alivia a dor, o desconforto e desenvolve força e resistência muscular.

Nosso objetivo principal é melhorar o equilíbrio e aumentar a coordenação, para que eu possa voltar a andar novamente sem ajuda de andador, muleta ou bengala.

As sessões de hidroterapia são feitas na piscina do condomínio. Após o atendimento, aproveito para pegar sol e aumentar o nível de vitamina D. Não adianta tomar suplementos e não tomar sol. Os dermatologistas que me perdoem, mas tenho abusado do nosso sol.

Enquanto recebia minha dose essencial de vitamina D, observava o Reinaldo resgatar um passarinho que havia se autoaprisionado no gradil da cerca da quadra de tênis. O bichinho tinha os pés contorcidos em volta de um grosso e inflexível fio de metal.

Com toda uma técnica, o rapaz conseguiu desvencilhar o passarinho daquela arapuca.

A ave parecia traumatizada e com medo de voar. Colocado numa cadeira, na sombra, com acesso a uma tijelinha com água, o passarinho descansou e se recuperou.

Reinaldo tomou o bichinho em suas mãos e o lançou para voar. E lá se foi ele: livre, leve e solto. Plenamente recuperado.

Dei os parabéns ao Reinaldo (soutoreinaldo@hotmail.com) e disse-lhe:

– Mano velho, parabéns. Faz fisioterapia até de passarinho.

 

domingo, 23 de fevereiro de 2025

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2025

A poesia é necessária?

 

Alvorada

Saturnino Valladares

 

A Vítor Hugo Martínez Ballesteros

 

Largamente as ondas se retiram

cada vez mais longe, até alcançarem

as raízes do novo amanhecer.

 

De garra e de carícia

gravados na areia,

filamentos de umidade,

memória dos líquidos amantes,

testemunhas da gota de silêncio.

 

Tradução: Zemaria Pinto

 

terça-feira, 18 de fevereiro de 2025

Basta um click


Pedro Lucas Lindoso

 

Aqui no meu condomínio há quarenta unidades. Somente três apartamentos recebem o jornal A Crítica. Eu sou um desses assinantes. Possivelmente, serei um dos últimos leitores de jornal físico do planeta.  Tenho acesso às edições eletrônicas, é verdade. Mas há um certo prazer em ler o jornal físico. O inconveniente de espirrar em razão do cheiro da tinta não me incomoda. Eu costumo separar ou recortar algumas matérias. Sei que posso fazer isso eletronicamente. Algumas vezes faço isso. Mas não abro mão de manipular os jornais físicos.

Sinto saudades de algumas edições de domingo, com suplementos fantásticos. Inclusive na área literária.

Sinto também saudades de bancas de revistas apinhadas de jornais e revistas diversas, vindas principalmente do Rio. E São Paulo.

Morei anos em Brasília. Quem conhece a nossa capital federal sabe que lá não moramos em ruas. Mora-se em superquadras, ou simplesmente quadras, como dizem os locais.

Cada quadra tem, ou tinha, uma banca de revista.  Ser proprietário ou permissionário de uma banca de revista de quadra era difícil e caro. Hoje não deve ser tanto. Nas bancas também tinha fichas telefônicas, cigarros e máquina xerox. Se fosse freguês podia até trocar cheque por dinheiro. Não se faz mais nada disso. Na rodoviária de Brasília havia uma enorme banca de revista. Com jornais de todos os estados brasileiros. Inclusive os de Manaus.

Aqui em Manaus muitas desapareceram. A grande resistente parece ser a da Praça Chile, perto do cemitério. Outras resistem no centro. Mas não são mais tão atrativas. Uma lástima.

Quando jovem adolescente colecionava revistas como a Conhecer. De tantos em tantos fascículos vinha uma capa para encadernar. Formava-se uma enciclopédia a conta gotas. Dentre várias, colecionei História do Brasil. Quatro volumes em capa branca. Cada revista focava um personagem da nossa História. As gravuras eram primorosas. Tenho essa coleção até hoje.

Essas coleções enciclopédicas feitas nas bancas foram uma opção importante para meus trabalhos no colégio. A maioria consultava a famigerada Barsa. O Google da minha época. As coleções de banca eram uma alternativa para se obter uma nota melhor. Tinham mais gravuras. Não se recortava, mas podia-se tirar xerox das pirâmides do Egito e tirar 10 no trabalho de História Geral. Hoje tudo se resolve bem rápido. Basta um click.


domingo, 16 de fevereiro de 2025

Manaus, amor e memória DCCX


Prédio da Academia Amazonense de Letras.
No nível da rua, onde hoje fica a área administrativa da AAL,
estava a FNME, ligada ao MEC.

 

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2025

A poesia é necessária?

 

4 haicais

            Carlos Guedelha

 

pássaro cativo

nas grades de uma gaiola

não canta mas chora

 

lágrimas no canto

exprimindo dor de exílio

pássaro cativo

 

o céu taciturno

nuvens escondem o sol

o dia nublado

 

a paisagem turva

horizonte embaçado

prenúncio de chuva

 

terça-feira, 11 de fevereiro de 2025

Formiga não visita tamanduá

Pedro Lucas Lindoso 


O problema do ladrão não é roubar uma corneta. É até muito fácil. A questão vai ser onde e como o larápio vai tocar a corneta roubada.

O pix tem sido usado para gastar dinheiro ilícito e não comprovado. Mas os grandes larápios sabem. Não é de hoje que todos os governos controlam as grandes movimentações de numerário. Pode ser de direita ou esquerda. De centro ou misturado, que é como chamam a tal coalizão. Vários partidos apoiando e governando. Tudo junto e misturado. Enfim, não é de hoje que grandes transações são controladas. Com pix ou sem pix.

Portanto, dinheiros são levados para paraísos fiscais ou lavado. Mesmo porque quem tem rabo de palha não dança perto de fogo.

Como sabemos, nos paraísos fiscais há a facilidade para aplicação dos capitais que são de origem desconhecida, protegendo a identidade dos proprietários desse dinheiro. Garantindo o sigilo bancário. É um refúgio fiscal e um refúgio para macaco safado e ladrão. Porque onde tem onça macaco não pia.

Outro dia uma pessoa humilde, funcionário de uma academia de ginástica, veio me perguntar o que é lavagem de dinheiro. Ora, disse-lhe que era como se transforma dinheiro roubado parecer dinheiro ganho honestamente. Tentar dificultar a origem criminosa.

Se o cabra começa a gastar o dinheiro desviado vão pegá-lo. Quem tem perna de pau tem que ficar longe do fogo.

Uma maneira bastante comum é transferir o dinheiro para uma outra pessoa. Essa pessoa tem o nome de laranja. O rapaz olhou-me com os olhos arregalados. E perguntou-me porque chamam de laranja.

Ninguém sabe ao certo. Dizem que é porque laranja só sobra o bagaço quando pegam o ladrão. A gíria substitui a palavra testa de ferro.

Dizem que os larápios eram punidos antigamente com ferro em brasa na testa. Os ricos pagavam pessoas pobres para terem a testa marcada com ferro no lugar deles. Há controvérsias.

O rapaz me perguntou se ainda faziam isso. Eu disse que não. Hoje o laranja ou testa de ferro vai mesmo para cadeia. Ou aparece morto com a boca cheia de formiga.

O rapaz me agradeceu a explicação. Aliás me agradeceu muito efusivamente. E disse-me:

– Bem que minha vó dizia que formiga não deve visitar tamanduá.

Aprendi mais um ditado.

 

domingo, 9 de fevereiro de 2025

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2025

A poesia é necessária?

 

Maternidade

Myriam Scotti

 

quando lá atrás

apenas a imaginava

era delicada, suave

desenhava-a bem s

                         o

                              l

                        t

                  a

em meu corpo

com espaço

pra que eu coubesse inteira:

o que eu costumava ser

externa e internamente

 

idealizava-a até mesmo frouxa

não queria correr o risco

de encolher nenhum pensamento

 

costurando-me de dentro pra fora

minha modista às avessas

ignorou não apenas medidas

como também minha essência

 

às vezes sinto falta de pedaços meus

aqueles que cortaste fora

tornaram-se retalhos

só servem para a memória de outros tempos

 

as partes de mim sobejantes

tardaram até se acomodar

levei anos pra descobrir como caber

existindo apenas em intervalos


terça-feira, 4 de fevereiro de 2025

Presente de casamento

 Pedro Lucas Lindoso

 

Hoje em dia transfere-se dinheiro para outra pessoa num piscar de olhos. Pelo pix, é claro. Antigamente, até mesmo as transferências on-line levavam algum tempo.  Antes da internet precisávamos ir a uma agência bancária para se mandar dinheiro a alguém.

Meu saudoso querido tio Moisés era padre secular. Morava no Recife. Meu pai mandava sempre uma mesada para ele. Padres seculares ou diocesanos não são vinculados a ordens religiosas, como os salesianos, dominicanos e franciscanos, dentre outras. Alguns trabalham. Outros a Diocese ou Arquidiocese os sustentam. Geralmente precisam de uma ajudinha, como meu querido tio.

Para mandar sua mesada precisávamos ir ao banco. Havia três opções de transferências. Por telex, por telefone ou carta via malote. Essa última tinha a taxa mais barata. Mas demorava até três dias. Por telex poderia chegar no mesmo dia, dependendo do horário. Por telefone era garantido chegar no dia. Mas a taxa era a mais cara. Chamavam-se “orpag”, ou seja, ordem de pagamento.

Tio Moisés era um homem extremamente humanista. Um padre compromissado com o social. Preocupava-se com os menos favorecidos. Aqui em Manaus, nos anos de 1960 liderou a Ação Católica (ACB). Trabalhou principalmente com jovens nos JEC’s. Juventude Estudantil Católica.

A ACB foi um movimento da Igreja Católica com o objetivo de formar leigos para colaborar com a missão da Igreja.

Tio Moisés era muito inteligente. Falava Francês. Esteve no Quebec. Parte de maior influência francesa do Canadá.

Morou muitos anos no Recife onde faleceu já bem idoso. Foi auxiliar de Dom Helder e um padre que quebrou. paradigmas. Houve um tempo que suicidas não tinham direito a missa de sétimo dia. Ele as rezava. Felizmente essa proibição não existe mais.

Há alguns dias conversei on-line com o padre Joao Carlos, do Recife. Ele conheceu tio Moisés. O tio foi padre diocesano por muitos anos numa usina em Jaboatão dos Guararapes. Era muito respeitado e querido na comunidade.

Tio Moisés celebrou nosso casamento em Brasília em 1981. Meu pai mandou buscá-lo em Pernambuco. Para Vera e eu, o nosso melhor presente de casamento.

 

domingo, 2 de fevereiro de 2025