Zemaria
Pinto
A
primeira vez que associei o Conselho Municipal de Cultura ao voto de cabresto
foi há muitos anos, quando o então presidente sugeriu minha candidatura a
conselheiro, explicando-me detalhadamente como eu deveria montar meu “esquema”
para me dar bem.
– Mas,
isso é voto de cabresto!
Ensaiei
encher a cabeça do meu interlocutor de sugestões éticas e técnicas para dar
seriedade ao processo. Ele alegou um compromisso urgente, virou-me as costas e
nunca mais se falou no assunto.
O
chamado voto de cabresto é uma herança do Império. O voto era aberto e os
coronéis controlavam cada um o seu “curral eleitoral”. O eleitor – homens brancos,
alfabetizados, acima de 21 anos – era conduzido por um cabresto metafórico a
votar nos candidatos do patrão.
Veio a
libertação dos escravos, a proclamação da República e o “direito” de votar para
os cargos executivos. Quase nada mudou: homens pretos alfabetizados
(raridades!) somaram-se aos brancos na composição do curral.
Com a
ditadura de Vargas, implantou-se, em 1932, o voto secreto universal e o voto
feminino; a idade baixou para 18 anos, mas analfabetos e indígenas só puderam
votar depois da Constituinte de 1988. Fim do voto de cabresto?
Não
entrarei em detalhes, mas o voto de cabresto continua sob o controle de
milícias, pastores (de todas as igrejas) e falsos líderes, que impõem, com o
uso da violência e do poderio financeiro, a vontade de seus coronéis.
E no
Concultura, como funciona? A cada eleição, faz-se um cadastro de votantes, por
atividade. O cadastro feito há poucos anos foi jogado fora, assim como o fora o
cadastro anterior, até o princípio dos tempos. Um retrabalho estúpido e
injustificável.
E qual
é o “esquema” para eleger um conselheiro? O cabresto, claro. O candidato sai em
busca de eleitores e, antes de convencê-los a se tornarem eleitores,
convence-os a votar em si. Na pior das hipóteses, arranca-lhes um compromisso,
que será ou não cumprido. E vale inflar como uma bexiga de porco o número de
falsos eleitores... Vocês devem conhecer as histórias que se contam a respeito
– não preciso repeti-las.
Lanço
aqui um desafio, válido para a atual direção do Conselho e para os conselheiros
que serão eleitos no dia 20 de fevereiro: assumam, de público, o compromisso de
mudar essa forma vergonhosa de votação, já para a próxima eleição. Definam
claramente quem pode ser eleitor, nas diversas áreas da cultura – e que esse
requisito seja comprovável.
É
importante levar em conta que alguém pode se enquadrar em mais de uma
atividade. A pessoa pode ser da Literatura, do Teatro e da Música, por exemplo
(estou pensando no poeta, dramaturgo e compositor Aldisio Filgueiras). Antes da
eleição, ela terá um prazo para se definir em qual atividade quer votar (e ser
votada, se for o caso).
Enfim, não
podemos nos omitir. Precisamos denunciar e desafiar as más práticas e os maus
praticantes. Em nome da Arte, da Cultura e da Democracia.
PS: não
sou candidato a nada, mas meu coração não se conforma; o meu peito é do contra
e por isso mete bronca neste texto-plataforma...
(a benção, mestre Aldir!)