Praça de N. Sra. dos Remédios. |
domingo, 30 de outubro de 2022
sexta-feira, 28 de outubro de 2022
quinta-feira, 27 de outubro de 2022
A poesia é necessária?
O navio negreiro (tragédia no mar) 2/3
Castro Alves (1847-1871)
III
Desce do espaço imenso, ó águia do oceano!
Desce mais, inda mais... não pode o olhar humano
Como o teu mergulhar no brigue voador.
Mas que vejo eu ali... que quadro de amarguras!
Que cena funeral!... Que tétricas figuras!...
Que cena infame e vil... Meu Deus! Meu Deus! Que horror!
IV
Era um sonho dantesco... O tombadilho
Que das luzernas avermelha o brilho.
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros... estalar de açoite...
Legiões de homens negros como a noite,
Horrendos a dançar...
Negras mulheres, suspendendo às tetas
Magras crianças, cujas bocas pretas
Rega o sangue das mães:
Outras, moças... mas nuas, espantadas,
No turbilhão de espectros arrastadas,
Em ânsia e mágoa vãs!
E ri-se a orquestra, irônica, estridente...
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais...
Se o velho arqueja... se no chão resvala,
Ouvem-se gritos... o chicote estala.
E voam mais e mais...
Presa nos elos de uma só cadeia,
A multidão faminta cambaleia,
E chora e dança ali!
....................................................................
Um de raiva delira, outro enlouquece...
Outro, que de martírios embrutece,
Cantando, geme e ri!
No entanto o capitão manda a manobra,
E após, fitando o céu que se desdobra,
Tão puro sobre o mar,
Diz do fumo entre os densos nevoeiros:
“Vibrai rijo o chicote, marinheiros!
Fazei-os mais dançar!...”
E ri-se a orquestra irônica, estridente...
E da roda fantástica a serpente
Faz doudas espirais...
Qual num sonho dantesco as sombras voam!...
Gritos, ais, maldições, preces ressoam!
E ri-se Satanás!...
terça-feira, 25 de outubro de 2022
Saudades da manduquinha e da CAMTEL
Pedro Lucas Lindoso
Estamos
celebrando neste 24 de outubro os 353 anos de Manaus. Há oito anos, conversando
com minha saudosa mãe em Brasília, disse-lhe que Manaus estava comemorando 345
anos. Ela me olhou um tanto incrédula e me disse:
– Interessante.
Seu pai e eu nos casamos em 1948. Naquele ano se comemorou os cem anos da
cidade.
De
fato, em 24 de outubro de 1848, Manaus deixou de ser vila e foi elevada à
categoria de cidade. Não somente Manaus, a cidade de Santarém, no Pará, também
foi beneficiada pelo mesmo decreto. Segundo minha saudosa mãe, houve
comemorações em 1948 pelo centenário dessa elevação.
Então,
qual seria o ano real de fundação? O certo é que historiadores e pesquisadores
chegaram à conclusão que Manaus teria sido fundada no ano de 1669. Assim, os
registros e evidências da formação de nosso núcleo urbano remontam a 353 anos.
A história desse núcleo urbano que hoje é a cidade de Manaus começou com a
construção do Forte da Barra de São José, idealizado pelo capitão de artilharia
Francisco da Mota Falcão.
Manaus
já teve vários nomes. Vila da Barra, Vila da Barra do Rio Negro e
posteriormente Manáos. Uma reforma ortográfica transformou páos e náos, em paus
e naus. E, consequentemente, Manáos em Manaus. Há controvérsias e opiniões
divergentes. No que concerne aos nomes e datas. Mas alguém já disse que não
existe unanimidade em nada.
Ao
considerarmos que a data de fundação “real” de Manaus não seja de fato 24 de outubro, não podemos
esquecer que há outras datas historicamente controvertidas. Há quem afirme que o natal não seria 25 de
dezembro. A data de nascimento de Jesus
Cristo não é citada na Bíblia. Para alguns cristãos ortodoxos a data é 6 de
janeiro.
O fato
é que em 2022 estamos celebrando 353 anos. Não me lembro se nos anos de 1960
houve celebração de 300 anos de aniversário da cidade. Fui menino aqui e me
lembro de algumas coisas. Não havia violência. Havia alguns malucos na rua,
como a Carmem doida. Não havia tantas crianças e adolescentes nas ruas. A
viatura de polícia, um fusca chamado de
Manduquinha, assustava os meninos da cidade que empinavam papagaios. A polícia
se preocupava com a fiação de rua da cidade. Tinha-se que preservar fios de
telefone e luz. Ninguém roubava celular.
Não havia TIM, nem CLARO, nem OI ou VIVO. Só havia a CAMTEL – Companhia
Amazonense de Telecomunicações. Depois a TELAMAZON. Os telefones eram fixos e
muito raros. Tinham só quatro números.
Saudades
da Manduquinha e da CAMTEL. Feliz aniversário, MANAUS. 353 ANOS.
domingo, 23 de outubro de 2022
Luiz Galvão (1937? – 22/10/2022)
sexta-feira, 21 de outubro de 2022
quinta-feira, 20 de outubro de 2022
A poesia é necessária?
O navio
negreiro (tragédia no mar) 1/3
Castro
Alves (1847-1871)
I
‘Stamos em pleno mar... Doudo no espaço
Brinca o luar – dourada borboleta –
E as vagas após ele correm... cansam
Como turba de infantes inquieta.
‘Stamos em pleno mar... Do firmamento
Os astros saltam como espumas de ouro...
O mar em troca acende as ardentias,
– Constelações do líquido tesouro...
‘Stamos em pleno mar... Dois infinitos
Ali se estreitam num abraço insano,
Azuis, dourados, plácidos, sublimes...
Qual dos dois é o céu? qual o oceano?...
‘Stamos em pleno mar... Abrindo as velas
Ao quente arfar das virações marinhas,
Veleiro brigue corre à flor dos mares,
Como roçam na vaga as andorinhas...
Donde vem?... Onde vai?... Das naus errantes
Quem sabe o rumo se é tão grande o espaço?
Neste Saara os corcéis o pó levantam,
Galopam, voam, mas não deixam traço.
Bem feliz quem ali pode nest’hora
Sentir deste painel a majestade!
Embaixo – o mar... em cima – o firmamento...
E no mar e no céu – a imensidade!
Oh! que doce harmonia traz-me a brisa!
Que música suave ao longe soa!
Meu Deus! como é sublime um canto ardente
Pelas vagas sem fim boiando à toa!
Homens do mar! Ó rudes marinheiros,
Tostados pelo sol dos quatro mundos!
Crianças que a procela acalentara
No berço destes pélagos profundos!
Esperai! Esperai! deixai que eu beba
Esta selvagem, livre poesia...
Orquestra — é o mar, que ruge pela proa,
E o vento, que nas cordas assobia...
................................................................
Por que foges assim, barco ligeiro?
Por que foges do pávido poeta?
Oh! quem me dera acompanhar-te a esteira
Que semelha no mar — doudo cometa!
Albatroz! Albatroz! águia do oceano,
Tu que dormes das nuvens entre as gazas,
Sacode as penas, Leviatã do espaço!
Albatroz! Albatroz! dá-me estas asas...
II
Que importa do nauta o berço,
Donde é filho, qual seu lar?
Ama a cadência do verso
Que lhe ensina o velho mar!
Cantai! que a noite é divina!
Resvala o brigue à bolina
Como golfinho veloz.
Presa ao mastro da mezena
Saudosa bandeira acena
As vagas que deixa após.
Do Espanhol as cantilenas
Requebradas de langor,
Lembram as moças morenas,
As andaluzas em flor.
Da Itália o filho indolente
Canta Veneza dormente,
– Terra de amor e traição –
Ou do golfo no regaço
Relembra os versos de Tasso
Junto às lavas do vulcão!
O Inglês – marinheiro frio,
Que ao nascer no mar se achou –
(Porque a Inglaterra é um navio,
Que Deus na Mancha ancorou),
Rijo entoa pátrias glórias,
Lembrando, orgulhoso, histórias
De Nelson e de Aboukir...
O Francês — predestinado —
Canta os louros do passado
E os loureiros do porvir!
Os marinheiros Helenos,
Que a vaga iônia criou,
Belos piratas morenos
Do mar que Ulisses cortou,
Homens que Fídias talhara,
Vão cantando em noite clara
Versos que Homero gemeu...
...Nautas de todas as plagas!
Vós sabeis achar nas vagas
As melodias do céu...
O navio negreiro divide-se em seis partes. As quatro partes restantes serão publicadas nas próximas quintas-feiras: 27/10 e 03/11.
terça-feira, 18 de outubro de 2022
Somos todos rionegrinos
Pedro Lucas Lindoso
Para
nós, amazonenses, o rio é tudo. Fonte de alimento e vida. Meio de transporte. É
também uma referência de nascimento, de ter uma naturalidade vinculada ao rio
pelo qual a sua cidade é banhada. Um sentimento de amor e pertencimento. Meu
saudoso pai, que nasceu em Manicoré, nas barrancas do Rio Madeira, sempre
dizia: quem nasce no Madeira é gente da melhor qualidade!
Como
nasci em Manaus sempre achei que deveria considerar o rio Negro o rio mais
bonito do mundo. E isso não é difícil. O majestoso rio possui a maravilhosa
Anavilhanas. O segundo maior arquipélago fluvial do mundo. O primeiro fica um
pouco mais acima, em Barcelos, o Mariuá. Anavilhanas tem cerca de 400 ilhotas,
já o Mariuá tem mais de mil. Um colosso da natureza.
Aqui
pertinho de Manaus, durante a vazante, temos lindas praias com areias brancas
contrastando com as escuras, porém límpidas águas de nosso rio.
A
jornalista Juliana Radler, em recente artigo publicado na imprensa local, nos
alerta que “o rio Negro pede socorro”. Ela nos lembra que vivemos no Amazonas e
temos a sorte de nos banharmos nas águas do Negro. Porém, estamos ameaçados
pela contaminação de suas águas por metais pesados oriundos de atividades
ilegais predatórias.
No
artigo de Radler fiquei sabendo que o rio Whanganui, em Nova Zelândia, vital
para o povo nativo Maori, ganhou personalidade jurídica, dada pelo Parlamento
neozelandês. Foi reconhecida a conexão espiritual entre Iwi, a tribo dos Maoris,
e o seu rio ancestral Whanganui. Para os neozelandeses o rio deve ser tratado
como um indivíduo e ter direitos.
O
Direito Ambiental no Brasil tem indiscutível respaldo constitucional. Há 23
povos indígenas que habitam o rio Negro. Além dos habitantes de Manaus, nossa
cidade sorriso que completa 353 anos agora em outubro. Nosso rio tem um
potencial turístico imenso. Basta mencionar só o encontro das Águas. Mas parece
que a cidade aniversariante virou as costas para o rio que a margeia.
Precisamos fazer a nossa parte também. O rio Negro não merece os dejetos que são diariamente lançados em suas águas. Quem nasce ou mora em Manaus tem a obrigação de amar, cultuar e proteger o rio Negro. A defesa e proteção ao nosso rio deve ser atávica. Devemos transmitir aos nossos descendentes esse sentimento. É o pedido que faço a todos os que moram aqui. Uns se dizem manauaras outros manauenses. Somos todos amazonenses. O importante é amar a cidade e o seu rio. Salve o rio Negro. Devemos agir e nos expressar como verdadeiros rionegrinos.
domingo, 16 de outubro de 2022
quinta-feira, 13 de outubro de 2022
A poesia é necessária?
Tristeza
Almir
Diniz (1929-2021)
Cavalgo,
triste, meu corcel alado
Pelas pistas
sem fim do pensamento,
De rédea
solta, solto meu lamento,
Meu protesto
de lágrimas molhado.
Galopando
sem rumo, e magoado,
Carpindo no
selim meu sofrimento,
Chego a
pensar que todo este tormento
É mero
sonho, e sonho malfadado...
Mas, se
passo trotando contra o vento
E ouço um
tropel alegre pelo prado,
Aperto o
arreio... sem... eis-me acordado!
Aí, sim,
sofro a dor que me vai dentro,
Essa dor que
mais dói, sem ferimento,
Que as
feridas de todo o meu passado!
terça-feira, 11 de outubro de 2022
A mensagem da Rainha
Pedro Lucas Lindoso
Junho
passado tia Idalina visitou Manaus. Conversamos sobre viagens e países que já
tivemos oportunidade de conhecer.
Idalina
adora a Inglaterra e tudo o que diz respeito à cultura inglesa. Da literatura
aos Beatles, incluindo a família real. Idalina me disse que houve um feriado
prolongado de quatro dias em junho como parte das comemorações do jubileu de
platina da falecida rainha.
Disse-me
que quando Elisabeth II visitou o Brasil, em 1968, realizava um trabalho
comunitário no Morro da Mangueira no Rio de Janeiro. Elisabeth II visitou o
local. Tinha recortes de jornais e fotos com a monarca. Com as celebrações do Platinum
Jubilee achou que deveria homenagear a Soberana. Escreveu uma carta para a
Rainha e enviou as fotos do evento.
Provavelmente,
ela não vai ler, disse-lhe. Mas Idalina argumentou que o importante era que
aquele material fizesse parte do acervo do Palácio de Buckingham.
Contei
a Idalina que naquela viagem de Elisabeth II ao Brasil tive a oportunidade de
vê-la em Brasília. Estudava na Escola Parque-Escola Classe. Um projeto
educacional pioneiro do educador Anísio Teixeira. A Rainha, a princípio,
visitaria nossa escola. Mas levaram a Soberana para o jardim da infância da
escola classe ao lado da nossa. Todos os alunos correram para vê-la passar.
Tínhamos
um jornal chamado Escola Parque. Eu era um dos redatores. A edição
especial da visita da Rainha foi impressa no parque gráfico do Correio
Braziliense. Até hoje o maior jornal do Distrito Federal. A elaboração do Escola
Parque era feita na aula de biblioteca. Lá aprendíamos a diferença entre
obras de referências e obras de ficção. Os alunos eram incentivados a ler e
escrever. Dessa aula “de biblioteca” saiu a edição especial de nosso
jornalzinho sobre a visita da Rainha.
Idalina
insistiu para que eu também mandasse uma carta encaminhando esse material para
o Palácio de Buckingham. É muito fácil. Escreva em Inglês. Na internet há dicas
de como se dirigir a ela. No final é só colocar num envelope para Her Majesty
The Queen, Palácio de Buckingham, London SW1A 1AA, Reino Unido.
Idalina
me disse que com certeza minha carta chegaria às mãos da dama de companhia ou
escreventes oficiais da rainha. Lembre-se de que a rainha recebe muitas cartas todos
os dias. Pode não ler pessoalmente a sua. No entanto, ela valoriza todos
aqueles que escrevem para ela.
Idalina havia postado sua carta ainda no mês
de maio. Eu resolvi obedecer a titia. Só por farra e curiosidade. Minha carta
foi postada em julho. E não é que houve resposta! Ambos recebemos a mesma mensagem
impressa. A Rainha agradecia pelas nossas mensagens pela ocasião dos setenta
anos de sua ascensão ao Trono. A postagem de Idalina na Inglaterra foi em
julho. A minha foi postada em 09 de agosto de 2022. Um mês antes de seu
falecimento.
domingo, 9 de outubro de 2022
quinta-feira, 6 de outubro de 2022
A poesia é necessária?
Polonaise
Paulo Leminski (1944-1989)
um dia
a gente ia ser homero
a obra nada menos que uma ilíada
depois
a barra pesando
dava pra ser aí um rimbaud
um ungaretti um fernando pessoa qualquer
um lorca um éluard um ginsberg
por fim
acabamos o pequeno poeta de província
que sempre fomos
por trás de tantas máscaras
que o tempo tratou como a flores
terça-feira, 4 de outubro de 2022
03 de outubro – comemore com apfelstrudel
Pedro Lucas Lindoso
A
Alemanha é um país fabuloso. Tive a oportunidade de conhecer e fiquei
encantado. Tudo funciona. Tudo é limpo e organizado. Saí de Frankfurt e fui até
Munique de carro. Por razões de marketing turístico chamam essa viagem de rota
romântica. De fato, viajamos por uma Baviera que sobreviveu estoicamente o pior
dos estragos da II Guerra Mundial. O fascismo e Hitler são um trauma que a
Alemanha quer esquecer. As atrocidades devem ser lembradas somente para que não
se repitam.
A
Alemanha nem sempre apresentou essa unidade política como vemos hoje. Coube ao
chanceler Bismarck, diplomata e político prussiano, a unificação da Alemanha
ainda no século 19. Otto von Bismarck, o chanceler de ferro, foi o estadista
mais importante da Alemanha daquele século. Coube a ele a administração do
segundo Reich por mais de 11 anos. O Segundo Reich durou de 1871 até 1918.
Depois
tivemos a divisão da Alemanha pelo muro de Berlim. O famigerado muro separava
Berlim Ocidental da Oriental. A Alemanha foi novamente unificada. Em 3 de outubro
de 1990 foi definitivamente anunciada a Unificação. Assim, 3 de outubro se
tornou feriado e é a data nacional da Alemanha.
Eu tive
o privilégio de ir a uma grande celebração na Embaixada da Alemanha em Brasília
naquele 3 de outubro de 1990. Fazia parte da equipe do Senador Bernardo Cabral
no Ministério da Justiça. Como Diretor de Assuntos da Cidadania fui convidado
para o histórico evento. Nunca me esqueci porque foi nesse dia que comi o doce
mais gostoso da minha vida. O famoso apfelstrudel, o strudel de maçã.
Quando
se fala em Alemanha as pessoas lembram logo de chucrute, da deliciosa cerveja e
dos diversos embutidos. Mas a coisa mais deliciosa que eles sabem fazer é
apfelstrudel. Apfelstrudels são populares desde o século 18, segundo Brigitte,
uma grande amiga alemã que mora em Brasília. Disse-me que a palavra “strudel”
deriva da palavra do alemão antigo para “redemoinho”. Apfel é maçã.
A
apfelstrudel da Brigitte é muito gostosa. Normalmente, a massa folhada é feita
a partir de uma massa elástica que é amassada e esticada até que fique bastante
fina. Brigitte serve as suas deliciosas apfelsturdels quente e em fatias
generosas. Lembro ainda de vê-la polvilhar com um pouco de açúcar de
confeiteiro. Ela também costuma servir com sorvete de baunilha ou creme chantilly.
Brigitte
gentilmente nos disponibilizou a sua receita. Vamos comemorar esse 3 de outubro
comendo uma magnífica apfelsturdel, celebrando a Alemanha.