James Zar. |
sábado, 31 de janeiro de 2015
quinta-feira, 29 de janeiro de 2015
Miniconto, microconto, nanoconto, contos são? 1/7
Zemaria Pinto*
INTRODUÇÃO
A definição mais
simplória de conto é “narrativa de curta extensão”. Não há métrica, entretanto,
para calcular essa dimensão espacial e classificá-la como mais ou menos curta.
Os clássicos – e aqui estou com a cabeça no século XIX – escreviam contos de
40, 50, 60 páginas. Machado de Assis, confundindo gênero com forma, escreveu na
“Advertência” a Papéis Avulsos, livro
que abre com “O alienista”, que “quanto ao gênero deles, não sei que diga que
não seja inútil”. Ironizando, Mário de
Andrade achou de escrever que conto era tudo aquilo que ele, autor, chamasse de
conto: tem gente bo(b)a que o leva a sério ainda hoje (PINTO, 2011a, p. 7-9).
O conto clássico
confunde-se muitas vezes com a novela, que tem pelo menos duas acepções
contraditórias, o que acaba enrolando o romance no quiproquó. Mas uma definição
simples e universalmente aceita é: fábula bem definida, poucos personagens,
tempo e ação muito concentrados, passados num só ambiente (PINTO, 2011b, p.
82-83).
O nosso escopo de
trabalho é definir o que é, afinal, miniconto, microconto e nanoconto,
nomenclaturas que andam soltas por aí, sem o necessário lastro teórico.
Necessário para quem? Para o leitor é que não. Este não precisa de teorias,
precisa, sim, de obras que o agradem. E pela repercussão, e por alguma
idiossincrasia que ainda não identificamos, os contos minis, micros e nanos têm
sido bastante apreciados. Há séculos.
1. INTENSÃO, TENSÃO,
INTENSIDADE
Os minis, micros e
nanocontos são identificados ordinariamente pela sua, digamos, curtíssima
extensão, mas, como não temos o instrumental para medir com precisão o tamanho
ou a área de cada um, deixemos de lado o problema da extensão. Mas não nos
esqueçamos de que o miniconto, o microconto e o nanoconto podem variar entre
uma página em branco e um texto pouco maior que isto – a página em branco. E
aqui nos deparamos com o nosso conceito-chave: intensão – força, vigor,
veemência, energia, aumento de tensão, tensionamento; numa palavra: intensidade.
No embate extensão X intensão, portanto, nossa torcida está
com esta.
Desçamos um pouco mais
nessa gruta escura. Aos poucos, nossos olhos se acostumarão com a pouca luz. Intensão é o ato de intensar, tornar
algo mais intenso, senti-lo em toda a sua força e vigor. A intensidade vem a ser a qualidade do que é intenso. Ainda que não
saibamos o que temos pela frente, a intensidade será a sua medida. A intensão é
também, por metonímia, o aumento de tensão
– estado do que é ou está tenso. Invertendo as variáveis da equação, podemos
afirmar que tenso é todo corpo sob tensão, e que esta varia de acordo com a
intensidade dirigida ao corpo sob observação. Sintetizando: tensão é uma força
que age sobre um corpo, por unidade de área – de parte do corpo ao todo dele –,
provocando-lhe alterações. Por exemplo: um soco na cara. O sujeito 1 usa a
força do seu punho (que, na verdade é parte de um sistema: o seu corpo), para,
com intensidade, atingir o sujeito 2, deformando-o na área atingida.
A intensão é a carga de
tensão – medida pela intensidade – que o sujeito 1 usou para atingir o rosto do
sujeito 2. Tomando emprestado um conceito elementar da física, quanto maior a
intensidade maior o fluxo de energia na área de abrangência. E para concluir
nossa incursão pela metáfora da porrada, nunca é demais lembrar Cortázar, referindo-se
ao conto moderno, para quem o romance ganha por pontos; o conto por nocaute. Valia
para o boxe, vale para o MMA, acrescentando-se ao nocaute a finalização, de
preferência com um mata-leão.
Voltando ao nosso
objeto de estudo, temos a extensão do conto como a área a ser atingida.
Portanto, quanto menor a extensão, mais fácil será obter a intensidade para o
conto ter, verdadeiramente, intensão. Ou, de maneira inversa, quanto maior a
extensão, maior deve ser o tensionamento, o esforço, para o conto ser
considerado intenso. Em um caso e outro, tensão é a palavra de toque. (**)
(*) Comunicação apresentada no Simpósio Nacional do GEPELIP, realizado na UFAM, na tarde de 05 de junho de 2014. Publicado na revista Valer Cultural no. 12, de ago/set 2014, p. 82-89.
(**) Este texto será publicado em sete partes, sempre nas noites de quinta-feira.
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Zemaria Pinto
Medicina grega do século 4 a.C. influenciando o século 19
João Bosco Botelho
O marco
organizador da nova e fundamental etapa da Medicina na construção dos
procedimentos éticos atados à busca da materialidade da doença ocorreu na
escola de Cós, sob a liderança de Hipócrates. Apesar de saber-se, pelos
indicativos etimólogos e linguísticos, que das 72 obras contidas no “Corpo
Hipocrático”, conjunto de textos produzidos na ilha de Cós, somente 12 foram
reconhecidamente escritos por Hipócrates. Esse conjunto filosófico-médico
iniciou o processo da separação da Medicina-oficial das idéias e crenças
religiosas.
Nesse
contexto, num dos livros mais importantes, “Da Medicina Antiga”, escrito por
Políbio, genro de Hipócrates, está elaborada a teoria dos Quatro Humores, a
primeira estrutura laica edificada com o objetivo de explicar a saúde e as
doenças fora das idéias e crenças religiosas. O processo teórico explicita o
corpo humano constituído de quatro humores: sanguíneo, linfático, bilioso
amarelo e bilioso preto. A saúde seria consequente ao equilíbrio dos humores e
a doença apareceria após o desequilíbrio, isso é, a predominância de um sobre
os outros.
É importante
ressaltar que Políbio estratificou a teoria dos Quatro Humores atada à teoria
dos Quatro Elementos de Empédocles. Esse genial médico e filósofo
pré-socrático, tentando entender o mundo, fora das idéias e crenças religiosas,
explicou o mundo visível por meio da combinação de quatro elementos
fundamentais: água, terra, fogo e ar. Desse modo, para cada elemento de
Empédocles, existiria um humor.
Como
imediata resposta à genialidade de Políbio, duas transformações mudariam a
Medicina no Ocidente:
– As
terapêuticas ficaram mais livres da presença dos deuses e deusas curadoras e
firmaram propósito para retirar do corpo o excesso dos humores desequilibrados,
por meio das sangrias, suadouros, diarréias, vômitos e diurese.
– O primeiro
código de ética médica – juramento de Hipócrates – com admirável avanço,
indicou, simultaneamente, a necessidade de os bons resultados estarem unidos ao
respeito à dignidade do doente.
Por essa
razão, usando a linguagem do filósofo francês Gaston Bachelard, é possível
considerar esse acontecimento – a teoria dos Quatro Humores – como o primeiro
corte epistemológico da Medicina-oficial.
A historicidade
do Juramento de Hipócrates atada à teoria dos Quatro humores assinala pontos
marcantes: bons resultados, respeito à intimidade e autonomia do doente, competência,
sigilo e responsabilidade profissional.
Os quatro elementos
de Empédocles (água, terra, ar e fogo) e os Quatro Humores de Políbio (sangue,
fleuma, bílis preta e bílis amarela), da Escola de Cós, ambas do século 4 a.C.,
foram retomados por Galeno, um dos mais famosos médicos romanos, do século 1, para
edificar a teoria dos Temperamentos, inserindo componentes sociais nas doenças.
Assim, se
alguém estivesse com “um humor desequilibrado” e possuísse determinado
“temperamento dominante”, seria mais suscetível a certa doença. Hoje, parece tudo
sem sentido, mas é importante ressaltar que as teorias dos Quatro Humores e a
dos Quatro Temperamentos se situavam fora dos poderes divinos e continuaram
citadas até a primeira metade do século 19, quando o viajante alemão Von
Martius, esteve no Amazonas, em 1844, entendeu os índios: “de temperamentos
fleumáticos, com pouco sangue”, com o objetivo de explicar a equivocada leitura
do comportamento dos indígenas quando comparado ao dos europeus.
quarta-feira, 28 de janeiro de 2015
terça-feira, 27 de janeiro de 2015
Só vou se for pela VARIG
Pedro
Lucas Lindoso
Na última vez que fui ao Rio de Janeiro,
visitei Tia Idalina. Vaidosa ao extremo, pinta os cabelos de preto graúna e as
unhas de vermelho paixão, combinando com batom vermelho tango. Fez 85 anos
outro dia. Mas para todos diz que
completou 72. Ela mesma se trai. Alguém que diz aos quatro ventos que quando
menina vestia-se igual à Shirley Temple. E chama comercial de TV de ”reclame”!
Essa pessoa não pode ter menos de 80 anos.de idade.
Tia Idalina gosta de fazer palavras cruzadas e
poemas. Escreve-os à mão. Até hoje não enfrentou o computador. Quando cheguei a
sua casa havia terminado um soneto cujo tema era vaidade. Elogiei o texto.
Tecnicamente perfeito, mas um pouco sem graça. Ela então pediu a sua neta Tina:
– Minha filha, bata este poema. Um original e
duas cópias, por favor.
Traduzindo para linguagem do século
XXI, Tina foi solicitada a digitar e imprimir três cópias do poema.
Tia Idalina mora em Copacabana. Diz
ela que há mais amazonenses e seus descendentes em Copacabana do que em Manaus. Um exagero. Mas
explica que antigamente todas as pessoas de bem tinham apartamento no Rio de
Janeiro. Agora muitos vão para São Paulo e Fortaleza. Compram imóveis por lá. Tia
Idalina tem saudades de Manaus, mas diz que não volta mais.
– Todos morreram e o casarão do
centro foi destruído.
Eu disse a ela que Manaus estava
muito bonita, com vários shopping centers.
Ela rebateu:
– Detesto shoppings. Gostava mesmo do Mercado Adolpho Lisboa. Mas dizem que
não existe mais.
Expliquei-lhe que o Mercadão estava
fechado para restauro, mas que iria reabrir em breve. Perguntei-lhe
se fazia muitos anos que não visitava Manaus. Ela me disse que quando foi por
lá não havia festivais de ópera.
Lembrou-se da última vez em que esteve no Teatro Amazonas. Foi assistir
a Dercy Gonçalves.
– Falava
tanto palavrão que o lustre do Teatro tremia. Até os fantasmas gargalhavam. Um
horror. Que Deus a tenha.
Então eu lhe disse que ela devia
visitar novamente a cidade. O Mercadão vai reabrir. A Praça da Polícia estava
uma beleza. O antigo quartel estava transformado em Palacete Provincial.
Derrubaram aquele prédio modernoso que ficava em frente ao Rio Negro Clube. A Praça
da Saudade estava toda restaurada. Uma maravilha. Então, ela disse:
– É mesmo? Então, vou voltar! Tina,
amanhã vamos a uma loja da VARIG comprar as passagens.
Expliquei-lhe que não havia mais
loja da VARIG. Passagens se compram pela internet. E que a VARIG não voa mais
para Manaus. Ela, bastante decepcionada, me disse:
– Já decidi. Não volto mais, então!
Do Rio para Manaus, só vou se for pela VARIG.
domingo, 25 de janeiro de 2015
sábado, 24 de janeiro de 2015
quinta-feira, 22 de janeiro de 2015
Dabacuri – da arte de amar 7/7
Zemaria Pinto
longa travessia,
repousa o corpo em silêncio
– porto-calmaria
ondas cavalgadas
nos limites do infinito
– relâmpago sob o sol
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Zemaria Pinto
Medicina e direito sob a égide laica
João Bosco Botelho
Nas culturas
que se desenvolveram mais intensamente durante o segundo milênio a. C., no
Oriente, as práticas médicas também estavam claramente dependentes das idéias e
crenças religiosas por meio de muitos deusas e deuses taumaturgos. Não existia
um processo teórico para explicar a saúde, a doença e os delitos fora das
idéias e crenças religiosas.
O primeiro a
reconhecer e legislar a prática médica e os julgadores, atribuindo claramente
deveres e direitos aos médicos e aos julgadores, além de estabelecer o valor do
pagamento pelos serviços e penalidades pela má prática médica, foi o rei
Hammurabi (1728-1686 a.C), da Babilônia, autor do código de Hammurabi. Em
outras palavras, estava iniciado o julgamento laico da má prática do médico
ligada ao mau resultado, que prejudicava o doente e gerando indenização ao
paciente ou à família.
Apesar de o
código de Hammurabi não ter sido a primeira tentativa de legislar os conflitos
envolvendo médicos e julgadores, fora das crenças e idéias religiosas, sem
dúvida, foi pioneiro para reconhecer o trabalho do médico arbitrado pelo
julgador como capaz de administrar os conflitos sociais suficientemente fortes
para provocar resposta disciplinadora da autoridade dominante.
Antes de
Hammurabi, outros dirigentes legislaram, no Oriente Antigo, as relações sociais
do homem. Os mais conhecidos foram: o código do rei Ur-Nammu (2050-2030 a.C.),
a coleção de leis de Urukagima, de Lagas, da mesma época, o código do rei
Bilalama, de Eshnuma, (1825-1787 a.C.) e o de Lipit-istar, de Isin, (1875-1865
a.C).
O Código de
Hammurabi permite entender certos critérios, sempre em torno dos bons
resultados, das leis que regiam a ação médica, na Babilônia, governada pelo rei
Hammurabi. Se pensarmos que as leis também exercem função de evitar conflitos,
os artigos penalizando ou premiando o médico, por estarem na mesma coluna
daquela regulamentando as profissões dos barbeiros, pedreiros e barqueiros, é
possível pressupor um elo comum: se tratavam de categorias envolvidas em
conflitos inquietantes à administração. Dessa forma, somente a ação do
julgador, ligado ao poder dominador, estaria suficientemente organizada para
mediar os conflitos geradores de conflito.
A
regulamentação da ação médica contida no código de Hamurabi cita a inequívoca
relação da ética do médico ligada aos bons resultados do trabalho médico, onde
o julgador é o árbitro absoluto. No parágrafo duzentos e quinze e nos seguintes
consta:
-
215:
Se um médico fez em um awilum uma incisão difícil com uma faca de bronze e
curou o awilum ou se abriu a nakkaptum (supercílio) de um awilum com uma faca
de bronze e curou o olho do awilum: ele tomará dez sicios de prata.
-
216:
Se foi o filho de um muskenum: tomará cinco sicios de prata.
-
217:
Se foi o escravo de um awilum: o dono do escravo dará ao médico dois cicios de
prata.
Após quase quatro mil anos de o Código de Hammurabi ter sido
elaborado, existem diversos pontos naquelas leis que merecem reflexão: início
do julgamento laico, monetarização do trabalho médico, os médicos remunerados de
acordo com a complexidade do trabalho e o sucesso alcançado pelo tratamento e
camada social do doente. A penalidade muito mais severa se a má prática fosse
realizada em alguém com destaque social. Esse ajuste sócio-político do julgador
também é importante sinal da historicidade do Direito atado ao poder dominador.
É necessário repetir como as leis também surgem a partir das
necessidades sociais, é admissível supor que as leis babilônicas, no Código de
Hammurabi, foram feitas para coibir o grande número de maus resultados que
geravam conflito social. Dessa forma, o Direito e a Medicina, nesse ponto,
inauguraram níveis de conflitos que continuam se reconstruindo até os dias
atuais, isto é, o julgador se interpõe favorecendo os interesses pessoais e
coletivos frente a algumas práticas médicas consideradas desajustadas à ética e
à moral.
quarta-feira, 21 de janeiro de 2015
terça-feira, 20 de janeiro de 2015
Só compro no bate palmas
Pedro Lucas Lindoso
O Jurídico de
uma grande empresa do PIM (Polo Industrial de Manaus) mudou significativamente
sua rotina com a chegada dos novos estagiários.
Um deles, um
jovem e garboso aficionado em sites de compra, chamado Dartagnan.
O jovem
estagiário, fluente em francês e lutador de artes marciais, fez a cabeça do Seu
William, para adquirir produtos chineses via internet.
William é um
quarentão carioca, radicado há anos em Manaus. Trabalha
como assistente administrativo do Jurídico. È torcedor fanático do boi
caprichoso. Casado com amazonense, gosta de tomar tacacá. Come pupunha com café
e já se considera um típico manauara.
Ocorre que
nosso amigo William jamais havia comprado algo pela internet. Mas foi na onda
do Dartagnan. O tal site de que Dartagnan tanto fala, oferece vários produtos: –
lingerie, bijus, relógios, camisas, sapatos etc. Tudo devidamente cotado em
dólares americanos.
William se
encantou com uma estilosa blusa de US$6.00 (seis dólares americanos), frete
incluído. A tal blusa, branca, de mangas
compridas e detalhes nos punhos, parecia uma verdadeira pechincha. A foto no
site era realmente inspiradora.
No sul do
Brasil, blusa é um componente primordialmente do vestuário feminino. No
Amazonas blusa e camisa é a mesma coisa. È como farda
e uniforme. No sudeste farda é só
para militares. Aqui em Manaus as crianças vão para as escolas fardadas.
Mas voltemos à
aquisição da blusa chinesa pelo William. Paga através de cartão de crédito
internacional, a encomenda foi
ansiosamente rastreada.
Saiu da cidade
chinesa de NingBo, passando por CiXi, Hai Yan, até chegar a PingHu. De PingHu
foi rastreada até FengXian, passando por NanHui finalmente chegou à grande e
famosa cidade de Xangai. De lá, foi despachada para Hong Kong e enviada
diretamente para o Rio de Janeiro. Chegou a Manaus após longo 47 dias de
ansiosa espera. Mas chegou!
William usa
camisa número quatro. Mas o seu assessor para assuntos de compras internacionais
chinesas, o nosso já conhecido Dartagnan, recomendou-o a escolher o tamanho
extra-large. Ou XL, que no Brasil seria o GG. Ora, William usa quatro, que
seria tamanho médio para grande. “Mas chinês é pequenino”, gitinho, como se diz
em Manaus.
Com a chegada
da blusa, a grande decepção. Apesar da etiqueta XL, a blusa era muito gitinha
para o William. O material não era tão bom quanto aparentava na foto do site. E
a estampa era o suprassumo do tradicional material “shing ling”. Que mico!
A Dra. Mariana
de Lisieux, uma jovem e intrépida advogada, ofereceu a módica quantia de
R$10,00 (dez reais) pela tal blusa. Todavia, William recusou a oferta de
imediato.
Atenta a toda
aquela confusão, dona Lucinda, a contadora, muito sabiamente, comentou:
– É por essas
e outras, que eu só compro roupas, seja “shing ling” ou não, na Rua do bate
palmas, conhecida como Marechal Deodoro. Eu hein!!
segunda-feira, 19 de janeiro de 2015
Lábios que beijei 39
Zemaria Pinto
Menina de olhos verdes
É um sonho recorrente:
estou em um palácio, no andar mais baixo; quando olho para cima, vejo, no ponto
mais alto, os olhos verdes da menina, em mim fixados. Essa cena se repetiu por
muitos meses – anos, talvez –, no pátio interior do Pedro II. Jamais trocamos
uma palavra. Sequer sorríamos. Apenas nos olhávamos. Seus olhos verdes incrustados na pele acobreada, cercados pelos cabelos negros à altura do
ombro, pareciam um enigma infinito. Hoje sei que ele vai durar apenas até o derradeiro
momento da minha consciência.
domingo, 18 de janeiro de 2015
sábado, 17 de janeiro de 2015
quinta-feira, 15 de janeiro de 2015
Dabacuri – da arte de amar 6/7
Zemaria Pinto
contas amendoadas
veludo lilás na pele
– faróis de naufrágios
vale natural
universo em movimento
– essências e mel
colinas que se erguem
num poema de Neruda
– rochedos de sonho
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A poesia é necessária?,
Dabacuri,
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Zemaria Pinto
Medicina e direito na busca do justo, do bom, do belo
João
Bosco Botelho
Historicamente,
a Medicina e o Direito construíram, ao longo de milhares de anos, a estrutura
sustentadora da credibilidade coletiva para nortear o bom, o certo, o belo.
Dessa forma, não é inconveniência argumentar que o desejo coletivo de
administrar os conflitos, que certamente estavam presentes tanto nos ancestrais
muito distantes de caçadores-coletores quanto nos mais próximos, após o
sedentarismo, moldaram pensamentos e comportamentos pessoais e coletivos inseridos
nas memórias-sócio-genéticas (MSG).
Parece
razoável pressupor que o conhecimento historicamente acumulado, desde os
primeiros registros do médico e do julgador como personagens sociais, se
ajustou na maior inclusão dos curadores e dos julgadores, aqui, compreendidos:
–
Agentes das práticas curadoras: tanto dos curadores laicos quanto dos benzedores,
erveiros, parteiras, sacerdotes, encantadores e muitos outros agentes da
Medicina-divina e da Medicina-empírica.
–
Agentes das práticas julgadoras: tanto os ligados ao poder dominador quanto os
que intermediavam os incontáveis conflitos que nunca chegavam à administração
laica, de certo modo semelhante na atualidade de muitas culturas-linguagens-sociedades.
Nos
mesmos milhares de anos, os curadores e julgadores que não conseguiram firmar o
reconhecimento coletivo em torno da competência na solução dos problemas
expostos pelos postulantes, não recebiam o reconhecimento coletivo.
Entre
esses dois grupos — aquele obtendo bons resultados e os que não satisfaziam as
demandas pessoais e coletivas —, as organizações sociais, em diferentes
instâncias, ao mesmo tempo em que reconheciam e nominavam o médico e o julgador,
compondo parte do conjunto das profissões que conviviam em conflito e
reconstruindo, procuraram refletir, identificar, coibir e punir as más práticas
e estabelecendo fortes critérios na edificação da historicidade da ética do
médico e do julgador.
De
modo geral, a má prática esteve e continua mais ligada ao resultado desfavorável
na Medicina e no Direito, o fracasso na busca da cura pelo doente e a sentença
considerada injusta. Nenhum procedimento, na Medicina e no Direito, no passado
e no presente, tem sido aceito se provoca, respectivamente, piora de qualquer
natureza no enfermo ou a suspeição de não ter sido justa.
Esse
esboço normativo ético-moral voltado aos bons resultados, no movimento de secularização
das práticas da Medicina e do Direito, claramente exposto no Código de
Hammurabi, no século 16 a.C., culminou com o aparecimento na Grécia, no século
4 a.C., do conceito de deontologia (do gr. déontos, “o que é obrigatório, necessário” + logia), que evoluiu para “o estudo
dos princípios, fundamentos e sistemas de moral”.
A
palavra deontologia, em torno do conjunto ético-moral, alcançou a maior parte
das especialidades sociais. Na Medicina, apareceu pela primeira vez, em 1845,
no Congresso Médico de Paris, no trabalho do médico M. Simon intitulado
“Deontologia médica ou dever e direitos dos médicos no estado atual da civilização”.
No Direito, por meio dos escritos do filósofo inglês Jeremy Benthan,
considerado fundador do Utilitarismo.
De
modo interessante, os códigos de ética do médico e do julgador comportam
fundamentos estruturantes deontológicos semelhantes:
–
O médico e o julgador devem estar sempre a serviço do indivíduo, respeitando a
vida e sua dignidade;
–
O médico e o julgador devem exercer a profissão com liberdade de decidir.
quarta-feira, 14 de janeiro de 2015
terça-feira, 13 de janeiro de 2015
Quem nasce para ruelo...
Pedro
Lucas Lindoso
Em
viagem pelo interior do Amazonas conheci seu Francisco, também conhecido
carinhosamente como Seu Chiquinho. Órfão de mãe aos 10 anos de idade, Chiquinho
foi criado por uma tia índia velha, que pouco falava. Diziam que era muda
porque esqueceu a língua da tribo e nunca aprendeu o Português.
Chiquinho é o típico ribeirinho da Amazônia e
vive da pesca. Mora no interior do interior. Mas vem sempre à sede do município.
Participa ativamente de uma associação de pescadores.
Chiquinho estava conversando comigo quando
chegou um moço falante, com muita conversa, se dizendo candidato à presidência
da associação dos pescadores. Falou muito e não disse nada. Seu Chiquinho é
analfabeto, mas não é bobo. Explicou-me que novembro estava chegando e vinha então
o defeso.
Seu Chiquinho contou que Matrinxã, Pacu,
Sardinha, Pirapitinga, Aruanã, Mapará, Tambaqui e Pirarucu devem ser os peixes
escolhidos para serem protegidos pelo Defeso. Esse moço nem pescador é. Tá
querendo se aproveitar. Eu conheço essa conversa. Papo de aracuã, sapateado de
catita. Dança de rato.
Vão começar a habilitação dos pescadores.Esse
caboco quer fazer maracutaia. Mas aqui ele não se cria. Depois que a confusão
tá feita, ele some e nos deixa na mão.
A Superintendência Regional
do Trabalho realiza o cadastro e a habilitação. Aí o cara se diz presidente da
associação e cadastra gente que nem sabe pescar.
Sabe-se que o Seguro Desemprego do Pescador Artesanal é um
beneficio correspondente a quatro salários mínimos pagos mensalmente, o que
facilita a composição da renda familiar para o pescador na época mais difícil
que é a do defeso. Esse valor é pago nas agências da Caixa Econômica Federal ou
nas casas lotéricas através do Cartão Cidadão para os pescadores que são
habilitados.
Perguntei ao Seu Chiquinho se ele podia me explicar melhor esse
negócio de defeso. Ele me disse que o período do defeso é uma época
em que muitas espécies sobem o rio em direção à nascente, para fazer a desova.
Os peixes ficam mais frágeis e, às vezes, se consegue pegá-los com as mãos
quando encontram obstáculo para subir.
Chiquinho é analfabeto, mas é um caboclo
consciente e tem espírito de cidadania. Não vai permitir que esse moço, recém
chegado na cidade, prejudique os seus colegas pescadores. Eu perguntei se o
rapaz ia conseguir se eleger presidente da associação dos pescadores. Seu
Chiquinho então me ensinou a lição: Quem
nasce para ruelo nunca chega a ser tambaqui.
segunda-feira, 12 de janeiro de 2015
Contribuição
Se agir sempre com dignidade e
probidade, você pode não melhorar em nada o mundo – mas haverá na Terra um
canalha a menos.
(Millôr Fernandes)
domingo, 11 de janeiro de 2015
sábado, 10 de janeiro de 2015
quinta-feira, 8 de janeiro de 2015
Dabacuri – da arte de amar 5/7
Zemaria Pinto
chuva na vidraça,
nossos corpos aquecidos
em abraçosbeijos
teus lábios roçando
minha barba por fazer
– aragem noturna
invento lembranças
de tormentas e mães-d´água
– a brisa traz um beijo
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quarta-feira, 7 de janeiro de 2015
Wolinski assassinado!
Os quatro cartunistas do Charlie Hebdo, assassinados com mais 8 pessoas por terroristas muçulmanos fundamentalistas. Da esquerda para a direita: Wolinski, Cabu, Charb e Tignous. |
Wolinski: só o humor liberta! |
Wolinski parodiando Manet: o pior do futuro. |
Toda paixão é estúpida! Mas quando se misturam a paixão política e a paixão religiosa quem paga a pena é a liberdade.
(João Sebastião – poeta nefelibata, filósofo de boteco, profeta do caos –, puto com o assassinato de um de seus maiores ídolos)
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terça-feira, 6 de janeiro de 2015
Próspero mingauzeiro
Pedro
Lucas Lindoso
Maria
de Nazareth, com th, conhecida como dona Naná, ou simplesmente Naná, mas só
para os muito íntimos, é uma cabocla balzaquiana de bem com a vida. Ex-moradora
do Igarapé do 40, hoje tem uma habitação digna e respeitável em um dos novos conjuntos
no centro da cidade.
Ultimamente,
Naná só fala sobre a abertura do Mercadão. Depois de anos em processo de
restauro, finalmente o nosso mercado Municipal Adolpho Lisboa vai ser reaberto
ao público, em outubro próximo. Naná tem um sentimento atávico e familiar com o
Mercadão. Seu pai e seu avô foram comerciantes no local.
Naná está ansiosa para ver
como ficaram os "novos"
pavilhões. Sabe-se que a estrutra do mercado é formada por beirais abertos,
encimados por arcos de ferro, os quais são sustentados por colunas, também em ferro. Nas duas
fachadas principais, fechando os arcos, há gradis de ferro com ornatos
decorados, acompanhados por vidros coloridos. O Mercadão vai ficar uma beleza,
segundo um amigo de Naná que trabalha na municipalidade. Amigo esse que está
providenciando uma colocação para o Zé Mugunzá, atual marido de Naná, que sonha
em trabalhar por lá.
Apesar de seus quase
quarenta anos, Naná é casada atualmente com o Zè Mugunzá, um cabocão forte e
bem apessoado, de vinte anos de idade, que está monopolizando o comércio de
mingau no centro da cidade.
Naná, não trabalha, nunca
trabalhou e jamais vai trabalhar. É dona de casa. Tem quatro filhos, dois de
cada casamento anterior ao atual, com Zé Mugunzá. Além das pensões que recebe
dos ex-maridos, é teúda e manteuda pelo Zé Mugunzá, que, como já dito, produz e
vende, por conta própria, mingau nas ruas do centro de Manaus.
Vaidosa, Naná alega
absoluta falta de tempo para o trabalho. Afinal, tem que cuidar dos filhos, da
casa, do marido. E, claro, das unhas, dos
cabelos e da pele. No último domingo foi vista na Praia do Açutuba sendo
literalmente pincelada dos pés a cabeça por Zé Mugunzá, com uma substância branca
aquosa, vinda de uma tijelinha, com o objetivo de clarear os pelinhos do corpo
e suavisar a pele.
Uma amiga, também
ex-moradora do Igarapé do 40, pergunta a Naná se ela vai ajudar o marido no
comércio de mingau, quando o Mercadão reabrir. Nana foi enfática: Nem pensar!
Sou dona de casa. E nem preciso, meu marido é um próspero mingauzeiro.
segunda-feira, 5 de janeiro de 2015
Lábios que beijei 38
Zemaria Pinto
Neuzinha
Neuzinha era miúda,
magra, sem encantos. Mas tinha apenas 16 anos. Era filha de uma colega de
trabalho e estudava em um colégio do Centro, o que a tornava parte da humana
paisagem cotidiana. Um dia, aproximou-se de mim e chamou-me pelo meu nome – e
não tio, como me acostumara. Disse que queria ajuda em alguma matéria que a mãe
não dominava. Marcamos no sábado, em um hotel discreto. Eu chegaria antes,
preparando o ambiente. Nua, Neuzinha era um encanto. Especialmente, porque só
tinha 16 anos. Seios salientes, bunda abaulada, lábios fartos, Neuzinha
aprendia rápido. Meu caso com Neuzinha foi um flerte com a tragédia. Impossível
evitar a publicidade na província. Escândalos doméstico e funcional. Inquérito
administrativo. Ameaças de morte. Tudo porque ela só tinha 16 anos. A última
vez que a vi foi em Brasília. Ela fora admitida no banco e estava noiva de um
barnabé do senado. Fizemos uma festinha de despedida no Hotel Nacional,
recém-inaugurado, relembrando os velhos tempos. Estava mais bonita: plena de
carnes, os seios abaulados, a bunda farta, os lábios salientes. Mas já contava
22 anos.
domingo, 4 de janeiro de 2015
sábado, 3 de janeiro de 2015
quinta-feira, 1 de janeiro de 2015
Dabacuri – da arte de amar 4/7
Zemaria Pinto
caminhos cumpridos,
repousam sobre meu peito
teus pés minerais
repousam sobre meu peito
teus pés minerais
chá de capim-santo
descansa em breve infusão
– promessas de sonhos
descansa em breve infusão
– promessas de sonhos
lua na janela –
teu corpo banhado em luz
pousa entre os lençóis
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Top! Top! Top!
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