Amigos do Fingidor

Mostrando postagens com marcador Drops de pimenta. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Drops de pimenta. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Para a orelha de “Drops de pimenta”


Dori Carvalho

Zemaria Pinto se mostra cada vez mais uma figura surpreendente. Os seus livros de poesia com títulos inusitados – Fragmentos de Silêncio, Música para Surdos – deixam versos-navalhas cortando nossas almas para sempre.

Não satisfeito com isso, como todo poeta poderia ser, continua desafinando o coro dos contentes, passando longe da literatura certinha, bem-comportada, que toma conta da nossa terra. Se nos apresenta (surpresa!) escrevendo peças teatrais hilárias e ferinas como Papai Cumpriu sua Missão, tratando a política como deve ser tratada; Cenas da Vida Banal, brincando com a harmonia reinante entre macho e fêmea; e leva a sério Shakespeare, Eurípides e Kafka, com a solidão de Otelo, a Medéia que há em todos nós e a distância entre nós e a Justiça. Volta ao mundo infantil com a sua Cidade Perdida dos Meninos-Peixes, preocupado com este nosso planetinha tão maltratado. Zemaria trilha um caminho que não é o da facilidade, da mesmice, da produção em larga escala e sem talento, tão costumeira. Talento em seu trabalho, aliás, é o que não falta; risco, muito menos, gesto tão raro em professores de literatura.

Dito isto deste artista universal do Amazonas, vamos ao Drops de Pimenta ou, bem poderia ser, “vida, a arte do desencontro” ou “pimenta no amor dos outros é refresco” ou ainda “nos menores frascos estão os melhores venenos”. São divertidas e displicentes porradas desfechadas contra nosso peito e em nosso pequeno cotidiano amoroso cheio de descaminhos, silêncios e perversidades, nos intervalos da paixão ou nos crimes que cometemos a todo instante contra o ser amado.

Se o(a) leitor(a) não quer cometer nenhum ato tresloucado, tipo fugir de casa, mudar o destino tão previamente traçado, leia apenas um por dia desses pequenos-grandes-contos ou haicontos. A princípio parecem brincadeiras (e são), você vai rir muito, depois, toma conta um certo mal-estar gostoso, um desconforto agradável, desses que fazem a gente rir da própria desgraça e, finalmente, quando você começa a se sentir dentro do livro, uma raiva incontida de si mesmo é inevitável – e vai se perguntar: o que é que eu estou fazendo que não mudo essa droga de vida? Aí vai uma amostra grátis para amantes ou desamados ansiosos e aflitos:

─ Pra ganhar tempo, a gente divide. Eu pego a lataria e os frios. Você, o material de limpeza.

─ Não é possível! Nem no supermercado a gente fica junto?

Mas, como diria o Barão de Itararé, é melhor não levar a vida toda a sério, afinal ninguém sai dela com vida. Drops de Pimenta é mais um presente que Zemaria Pinto nos dá, a todos nós, inconformados, inconstantes, espíritos livres, amantes, apaixonados...

Drops de pimenta, o livro, deveria ter saído na segunda leva dos Valores da Terra, quando ainda era prefeito de Manaus o cabo Pereira. Três alcaides depois, Valores da Terra é um projeto morto e enterrado. Mas o Drops continua vivo.

Ilustração: Tamara de Lempicka (1898-1980), Adão e Eva.

quarta-feira, 30 de junho de 2010

drops de pimenta 69

.
Mirinha, a solidão é como um tiro na noite. Você imagina uns dez motivos, todos banais. Ninguém tem um motivo sério para dar um tiro na noite.

(Zemaria Pinto)









FIM



de



DROPS DE PIMENTA

quarta-feira, 23 de junho de 2010

drops de pimenta 68

.

─ Tanta mala...

─ É pra dar um tempo? Então que seja tempo suficiente!

─ Mas não precisa levar tanta coisa. Tenho certeza que você volta...

─ Quer checar pra ver se estou levando algo que não devo?


(Zemaria Pinto)

quarta-feira, 16 de junho de 2010

drops de pimenta 67

.


─ Dez anos de casamento... Não podemos deixar escorrer assim, entre os dedos...

─ Eu prefiro nem pensar no tempo perdido!


 
(Zemaria Pinto)

quarta-feira, 9 de junho de 2010

drops de pimenta 66

.

─ Vamos dar um tempo...

─ ...

─ Você pode ficar aqui; eu vou pra casa da mamãe.

─ ...

─ Você vai ter liberdade, poder se organizar...

─ Vamos ser práticos; nada de casa de mamãe: você dorme com as crianças, eu fico com o nosso quarto!


(Zemaria Pinto)

quarta-feira, 2 de junho de 2010

drops de pimenta 65

.


A verdade é que já não somos mais os mesmos: marasmo, repetição, mesmice. A temperatura baixa e a gente nem percebe. Mas gelo também queima, não?

(Zemaria Pinto)

quarta-feira, 26 de maio de 2010

drops de pimenta 64

.



─ Que é isso? Fumando?

─ ...

─ Há mais de 10 anos que você... Lembra? Eu disse que só aceitava namorar se você deixasse de fumar...

─ É como diz o dito: não há bem que sempre dure...

 
(Zemaria Pinto)

quarta-feira, 19 de maio de 2010

drops de pimenta 63

.



─ Você chegou tarde de novo, ontem...

─ Estava com uns amigos...

─ Tenho certeza que sim; sua timidez não lhe permitiria varar a noite com estranhos!


(Zemaria Pinto)

quarta-feira, 12 de maio de 2010

drops de pimenta 62

.

─ Perdi a aliança...

─ Onde? No serralheiro ou no ralo do motel?


(Zemaria Pinto)

quarta-feira, 5 de maio de 2010

drops de pimenta 61

.


─ Nós precisamos conversar...

─ ...

─ Já não é mais a mesma coisa...

─ ...

─ Talvez ainda seja possível...

─ Não me leve a mal, mas a gente pode jantar primeiro?


(Zemaria Pinto)

quarta-feira, 28 de abril de 2010

drops de pimenta 60

.

─ Podemos conversar?

─ Qual o personagem de hoje? O mocinho ou o bandido?


(Zemaria Pinto)

quarta-feira, 21 de abril de 2010

drops de pimenta 59

.




─ Chorando?

─ Cebola...

─ ...

─ Por que a pergunta? Remorso?


(Zemaria Pinto)

quarta-feira, 14 de abril de 2010

drops de pimenta 58

.




─ Eu imagino a gente, velhinhos...

─ ...

─ Eu sinto uma ternura... O que você imagina?

─ Artrite, senilidade, pressão alta, pressão baixa e muita muita muita broxa...


(Zemaria Pinto)

quarta-feira, 7 de abril de 2010

drops de pimenta 57

.



Joca, deixa de bobagem. Me atende. Você sabe que nada daquilo que eu disse é verdade. Não é aquilo que eu sinto, Joca. Mas você me chateia, poxa. Perdoa, vai... Liga pra mim...


(Zemaria Pinto)

quarta-feira, 31 de março de 2010

drops de pimenta 56

.



A solidão é broxante. Não tenho vontade de nada. Nem de sair. Nem de escrever. Nem de ficar só. Se saio, encontro com ela. Se escrevo, é sobre ela. Ficar sozinho é bem pior: há sempre um fantasma me espreitando no escuro. Deve ser o espelho. Droga!



(Zemaria Pinto)

quarta-feira, 24 de março de 2010

drops de pimenta 55

.



Joca, eu estou partida. Ao meio. Rachada. Ainda não acredito que você fez isso comigo. Depois de 10 anos, Joca? Como você pode ser tão filho da puta?


(Zemaria Pinto)

quarta-feira, 17 de março de 2010

drops de pimenta 54

.



─ Surpresa!

─ ...

─ Flores...

─ Que aconteceu? Viu passarinho verde?


(Zemaria Pinto)

quarta-feira, 10 de março de 2010

drops de pimenta 53

.
─ Mas é seu aniversário!

─ Por isso mesmo...

─ Mas eles são uns chatos!

─ São meus amigos...

─ ...

─ Vamos fazer o seguinte: eles vêm, sim. No seu aniversário você pode convidar até o babaca do seu chefe!


(Zemaria Pinto)

quarta-feira, 3 de março de 2010

drops de pimenta 52

.



─ Vamos deitar?

─ Eu vou ver o vale-tudo.

─ Tá vendo?... Você me trocando por aqueles fortões!


(Zemaria Pinto)

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

drops de pimenta 51

.
─ Você escolhe...

─ Meia calabresa, meia portuguesa.

─ Falta de imaginação... Olha só: banana com canela, tomate seco, cupuaçu...

─ Tudo bem, você escolhe a outra metade. A minha é calabresa!


(Zemaria Pinto)