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quarta-feira, 29 de janeiro de 2025

Mostra de cinema CABA, a Amazônia como ela é

 Zemaria Pinto

 

Aconteceu na última sexta-feira, 24 de janeiro, a “Mostra de Cinema CABA”, da Companhia de Artes Bacaba, no Teatro Gebes Medeiros, que está abrigando a programação do Cine Guarany, em obras.

(Você já sacou, leitora/leitor, que a caba em questão não é o simpático himenóptero, de ferroada terrível, mas um acrônimo para Companhia de Artes...)

A CABA (essa fusão é prevista) já nasce grande: “acreditamos que a arte é uma ferramenta poderosa para celebrar, questionar e refletir sobre o mundo ao nosso redor”, diz o prospecto de apresentação da Mostra, o que os curtas-metragens apresentados, mais o show musical de abertura – “Na trilha do maraká” –, confirmam plenamente.




  Vendo Boto (2020), dirigido pelo ícone do teatro amazonense Nonato Tavares, mostra Fidelis Baniwa no papel do mitológico sedutor dos beiradões amazônicos.

Tributo a Chico Mendes (2020), direção de Bruno Pantoja, o líder da Companhia de Artes Bacaba, faz o registro audiovisual da leitura da peça que dá título ao filme, de autoria de João das Neves. Mais que teatro filmado, com as limitações da leitura, Tributo... é um exercício de criatividade e beleza, potencializando o efeito da tragédia do líder acreano.

Feira do Troca (2022), dirigido por Bruno Pantoja, mostra a ativista Olga D’Arc conduzindo um evento inusitado: uma feira onde não se usa dinheiro, mas apenas o “escambo”, isto é, a troca de produtos e o compartilhamento de experiências e muitas histórias.

Viva Sebastião! (2023), sob a direção de Bruno Pantoja, assistimos a festejos em homenagem a São Sebastião que remontam a mais de cem anos, sustentados unicamente pela fé popular e pelas imbricações entre religiosidade e cultura.

Santo Antônio da Terra Preta (2024), o mais recente trabalho da CABA, também dirigido por Bruno Pantoja, retoma o tema do filme anterior, analisando a festa de Santo Antônio, em Manacapuru, outra tradição centenária, aliás, perto de bicentenária, pois nasceu das promessas dos parentes que temiam perder seus entes queridos que lutavam na guerra da Cabanagem (1835-1840). Pela qualidade técnica, bem como a combinação entre entrevistas e registros, o filme destaca-se dos demais, mostrando a evolução da Produtora e do diretor.

O próximo filme é um desafio ainda maior: Garrote, ambientado na Manaus de 2021, em plena crise de oxigênio, que ceifou a vida de milhares de amazonenses. É um filme de ficção que passa longe do panfletarismo, investigando a deterioração das relações num ambiente que combinava o descaso pela saúde pública e o negacionismo. Aguardemos. 

  

  

quarta-feira, 11 de outubro de 2023

segunda-feira, 4 de novembro de 2019

segunda-feira, 13 de maio de 2019

Teatro e Resistência: a História no centro do palco





Zemaria Pinto

Teatro contra o cinismo
O ciclo de leituras dramáticas Teatro e Resistência, promovido pela Cia Vitória Régia em janeiro e fevereiro de 2019, no palco do Sinttel-AM, nasceu da necessidade que o grupo, dirigido por Nonato Tavares, sentiu de mostrar, especialmente aos mais jovens, que houve, sim, uma ditadura no Brasil, que se estendeu por 21 anos – período em que se prendeu, torturou e matou muita gente. Há um movimento do mais deslavado cinismo negando esses fatos que já pertencem à História e procurando transformar notórios torturadores e assassinos em heróis.
Como o grupo lida com o teatro, era elementar trabalhar com a leitura dramática – uma por semana, de modo a produzir uma amostra abrangente – de peças que retratassem a época. Partimos de quinze títulos iniciais, que foram sendo filtrados no decorrer do processo, até chegarmos aos sete títulos trabalhados – todos eles relacionados ao intervalo de tempo que vai de 1964, ano do golpe militar, até 1979 – ano da anistia e início efetivo da “distensão” ou “abertura”, que só se concretizaria em 1985, com a saída dos militares do poder. A exceção foi o emblemático Eles não usam black-tie, encenado pela primeira vez em 1958, mas ainda hoje atualíssimo.

Teatro de Resistência
O termo designa peças e/ou autores que se posicionaram francamente contra o regime instaurado em 1964, denunciando-o e criticando-o. Não foi, a rigor, um movimento, como querem alguns apressados, até porque reunia tendências opostas e inconciliáveis, tanto do ponto de vista político como do estético. Olhando pelo ângulo dos detentores do poder no exercício da censura, eram textos e autores a serviço da “conspiração comunista internacional” contra os “valores da civilização cristã ocidental”, conforme atesta Yan Michalski, no seu clássico O palco amordaçado. Para quem pensa que os donos do poder no Brasil de 2019 estão sendo originais, eles apenas repetem a mesma ladainha de 55 anos atrás, usada para justificar o estrangulamento da democracia. 
Além dos autores com os quais trabalhamos, vistos adiante, destacaram-se como “resistentes” Chico Buarque, Millôr Fernandes, Maria Adelaide do Amaral, Consuelo de Castro, Augusto Boal, João das Neves, Jorge Andrade, Paulo Pontes, entre outros.

Teatro e Resistência
Trabalhamos três noites por sete semanas: na segunda-feira, fazíamos a primeira leitura, com o “elenco” disponível; na quarta, fechávamos o elenco e fazíamos uma segunda leitura, pensando nas marcações de palco; na quinta-feira, era feita a leitura para o público. A dificuldade oferecida pela arquitetura dramática de Patética, a segunda peça lida, nos permitiu um salto de qualidade em relação à leitura de O abajur lilás, que foi extremamente convencional, com as rubricas sendo lidas quase integralmente. A Patética nos fez inventar a figura do “narrador”, que, baseado nas rubricas, situava o público no tempo e no espaço, método utilizado nas três peças seguintes, até que, nas peças finais – Zona Franca, meu amor e Papa Highirte – abolimos também a figura do narrador, fazendo pequenas inserções no próprio texto da peça, de modo a situar o espectador, uma vez que não dispúnhamos dos recursos mais elementares como cenário, figurino e luz. Foi um aprendizado. Deu certo. 
Trabalhamos com os seguintes textos:
O abajur lilás (Plínio Marcos) – partindo de uma base alegórica, uma representação realista do Brasil pós AI-5, três prostitutas, um explorador do lenocínio e seu segurança mostram o absurdo das relações entre o poder e os que a ele são submetidos, levando à tortura, à delação e ao assassinato.
Patética (João Ribeiro Chaves Neto) – A trajetória do jornalista Vladimir Herzog – até seu assassinato, sob tortura, em outubro de 1975 – recriada com engenho e arte.
Eles não usam black-tie (Gianfrancesco Guarnieri) – retrata, em primeiro plano, o movimento sindical-trabalhista da era JK; mas a grande tensão da peça está fundamentada no relacionamento entre o pai Otávio e o filho Tião, muito além de um conflito de gerações: um conflito ideológico, discussão muito atual.
Campeões do mundo (Dias Gomes) – o sequestro de um embaixador, contado em flashback por dois sobreviventes anistiados, é o mote para mostrar os conflitos da guerrilha urbana, a tortura e o assassinato, num período que cobre de 1963 a 1979, discutindo também a condição feminina e o exílio a que muitos foram forçados.
Vejo um vulto na janela, me acudam que sou donzela (Leilah Assumpção) – passa-se entre o final de 1963 e os primeiros dias do golpe militar. Uma comédia de costumes espicaçando o extremo conservadorismo da época; um libelo feminista que escancara e ridiculariza esse conservadorismo.
Zona Franca, meu amor (Márcio Souza) – escrita dez anos antes de ser encenada pela primeira vez, manteve-se, e mantém-se, muito atual, na crítica ácida ao modelo Zona Franca de Manaus.
Papa Highirte (Oduvaldo Vianna Filho) – alegoria sobre a solidão de um ditador latino-americano no exílio, em algum momento entre os anos 1940 e 1960. Personagens infames, caricaturas sub-humanas, humor áspero. Vianinha constrói suas personagens como um demiurgo, cheias de sutilezas, para em seguida destruí-las, furioso, sem nenhuma delicadeza.   

Teatro, território livre
Território do livre pensamento, o teatro é de natureza rebelde, mas não inconsequente: ensina criticando e critica ensinando. Mas não ensina verdades – ensina a vida: questionando as verdades estabelecidas, colocando a dúvida acima de qualquer dogma. Isto é a arte. É provocando abalos que ela se renova. Isto é o teatro, há dois mil e seiscentos anos.
Em síntese, a Cia Vitória Régia escolheu o Teatro para iluminar o passado e denunciar as semelhanças com o presente – uma forma de resistência.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

“Papa Highirte”, de Vianinha, encerra ciclo de leituras dramáticas Teatro e Resistência




O ciclo Teatro e Resistência – leituras dramáticas, promovido pela Cia Vitória Régia, chega à sua edição final nesta quinta-feira, com a leitura da peça de Oduvaldo Vianna Filho, o Vianinha, Papa Highirte.

Com excelente repercussão junto ao público, foram feitas as leituras de Abajur Lilás, de Plínio Marcos; Patética, de João Ribeiro Chaves Neto; Eles não usam black-tie, de Gianfrancesco Guarnieri; Campeões do mundo, de Dias Gomes; Vejo um vulto na janela, me acudam que eu sou donzela, de Leilah Assumpção; e Zona Franca, meu amor ou Tem piranha no pirarucu, de Márcio Souza. Seis peças que, sem perder a condição de arte, retratam com muita propriedade a vida brasileira nos (mal)ditos anos de chumbo.

A mostra teve como objetivo colocar em discussão a situação do teatro e do Brasil, nas décadas de 1960 e 1970, dominadas pela repressão imposta pela ditadura militar e pelas milícias “anticomunistas”, muito parecidas com as milícias assassinas em ação hoje, com o apoio de gente acima de qualquer suspeita.

A Cia Vitória Régia escolheu a ARTE e o TEATRO para esclarecer o passado e denunciar as semelhanças com o presente, resistindo.

Os textos escolhidos botam o dedo em diversas feridas: a repressão aos movimentos populares, a censura, a prisão arbitrária, o exílio, a tortura, o assassinato.

A peça desta quinta-feira, 28 de fevereiro, sob a direção de Nonato Tavares – Papa Highirte, de Vianinha – mostra um típico ditador sul-americano, que, no exílio, amarga o abandono de todos. Escrita em 1968, só pôde ser encenada quando os ventos da “abertura” sopraram, 11 anos depois.

Highirte é um ser desprezível, cercado de seres desprezíveis. Vianinha opta pelo simbolismo, construindo personagens que representam parcelas do continente (e do Brasil) nos anos 30 a 60, mas que se mantêm ainda muito atuais: generais golpistas, torturadores não-oficiais, um delator arrependido, um representante do “big brother” do norte, oferecendo “ajuda humanitária”... 

Ator e diretor, Vianinha escreveu “Chapetuba Futebol Clube”, “Allegro desbum” e “A mão na luva”, além ter sido o criador, juntamente com Armando Costa, do humorístico “A grande família”, em 1972. Morreu em 1974, aos 38 anos, logo após concluir sua obra-prima “Rasga Coração”.

Serviço:
Evento: Teatro e Resistência – leitura dramática de Papa Highirte, de Oduvaldo Vianna Filho
Finalidade: mostra de peças de autores censurados
Quando: dia 28 de fevereiro, às 19h
Onde: SINTTEL – Alexandre Amorim, 392, Aparecida
Recomendado para maiores de 16 anos
Entrada franca



segunda-feira, 4 de fevereiro de 2019

Campeões do mundo: leitura dramática


A caminho de Argel, os 40 presos políticos trocados pelo embaixador da Alemanha: inspiração para Dias Gomes.

A Cia de Teatro Vitória Régia apresentará por todo o mês de fevereiro, sempre às quintas-feiras, o ciclo Teatro e Resistência – leituras dramáticas.

Com grande participação de público, já foram feitas as leituras de Abajur Lilás, de Plínio Marcos; Patética, de João Ribeiro Chaves Neto; e Eles não usam black-tie, de Gianfrancesco Guarnieri.

A mostra visa colocar em discussão a situação do teatro e do Brasil, nas décadas de 1960 e 1970, dominadas pela repressão imposta pela ditadura militar e pelas milícias “anticomunistas”, muito parecidas com as milícias assassinas tão caras aos círculos poderosos de hoje.

Escolhemos a ARTE, para resistir e denunciar.

Para isso, o grupo selecionou textos representativos, que expõem as entranhas do fascismo: a repressão aos movimentos populares, a censura, a prisão arbitrária, o exílio, a tortura, o assassinato.

Nesta quinta-feira, 7 de fevereiro, sob a direção de Nonato Tavares, será feita a leitura de Campeões do mundo, de Dias Gomes, uma verdadeira aula de história, se não fosse pura ficção.

A trama, que cobre o período de 1963 a 1979, conta o sequestro do embaixador americano, em plena copa do mundo de 1970, abordando temas como o feminismo, a guerrilha urbana, a tortura, o exílio. Ficção, sim, porém, montada “em cima de fatos acontecidos e hoje amplamente divulgados”, como afirmou o autor no programa da peça.

Encenada pela primeira vez em 1980, em plena “distensão”, Campeões do mundo já não usa subterfúgios retóricos ou simbólicos para mostrar os acontecimentos como se passaram na realidade. Pelo contrário, sem fazer julgamentos ou tomar partido, lança mão de um realismo visceral e, infelizmente, verdadeiro.

Autor de clássicos da dramaturgia brasileiro, como O pagador de promessas e O santo inquérito, Dias Gomes (1922-1999) consagrou-se como autor de telenovelas, com destaque para Bandeira 2, O bem-amado, Saramandaia e a censurada Roque Santeiro. Com Dias Gomes, o folhetim televisivo, antes desprezado, foi elevado à categoria de cult.

Serviço:
Evento: Teatro e Resistência – leitura dramática de Campeões do mundo, de Dias Gomes
Finalidade: mostra de peças de autores censurados, como Leilah Assumpção, Márcio Souza, Millôr Fernandes e outros
Quando: dia 7 de fevereiro, às 19h
Onde: SINTTEL – Alexandre Amorim, 392, Aparecida
Recomendado para maiores de 16 anos.
Entrada franca.


segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

Cia Vitória Régia lê “Eles não usam black-tie”




A Cia de Teatro Vitória Régia segue apresentando, sempre às quintas-feiras, em janeiro e fevereiro, o ciclo Teatro e Resistência – leituras dramáticas.

A mostra visa colocar em discussão a situação do teatro e do Brasil, nas décadas de 1960 e 1970, dominadas pela repressão imposta pela ditadura militar e pelas milícias “anticomunistas”, muito parecidas com as milícias assassinas tão caras aos círculos poderosos de hoje.

Escolhemos a ARTE, para resistir e denunciar.

Para isso, o grupo selecionou textos representativos, que expõem as entranhas do fascismo: a repressão aos movimentos populares, a censura, a prisão arbitrária, o exílio, a tortura, o assassinato.

Nesta quinta-feira, 31 de janeiro, sob a direção de Nonato Tavares, será feita a leitura de Eles não usam black-tie, de Gianfrancesco Guarnieri, um testemunho da vida do operário e do movimento sindical brasileiro.

Escrita em 1958, quando o autor tinha apenas 25 anos, Eles não usam black-tie tornou-se um clássico da dramaturgia brasileira, tendo sido, nos últimos 60 anos, montada dezenas de vezes, com uma excelente adaptação para o cinema, em 1981, sob a direção de Leon Hirszman, que, entre inúmeros prêmios internacionais, ganhou o Leão de Ouro de Veneza, de melhor filme.

Sem maniqueísmos nem julgamentos de qualquer espécie, o texto de Guarnieri explora o impasse do ser humano diante de decisões importantes para si, como indivíduo, mas também para a coletividade – a família, os amigos, os vizinhos, os companheiros de trabalho. Destaque para as personagens femininas, Maria e Romana, que antecipam em uma década a discussão sobre o feminismo – discussão, aliás, que já deveria estar superada, mas ainda perdura em certos meios...

Serviço:
Evento: Teatro e Resistência – leitura dramática de Eles não usam black-tie, de Gianfrancesco Guarnieri
Finalidade: mostra de peças de autores censurados, como Dias Gomes, Augusto Boal, Chico Buarque, Oduvaldo Vianna Filho e outros
Quanto: dia 31 de janeiro, às 19h
Onde: SINTTEL – Alexandre Amorim, 392, Aparecida
Recomendado para maiores de 16 anos.
Entrada franca.

terça-feira, 15 de janeiro de 2019

Teatro e Resistência – leituras dramáticas




A Cia de Teatro Vitória Régia apresenta, sempre às quintas-feiras, em janeiro e fevereiro, o ciclo Teatro e Resistência – leituras dramáticas.

A mostra tem a finalidade de colocar em discussão o retrocesso que se instala no país com a censura a eventos artísticos, disfarçada sob o argumento falacioso da proteção à moral e aos bons costumes.

Para isso, o grupo selecionou textos representativos dos anos 1960 e 1970, que expõem as entranhas da ditadura instalada em 1964: a repressão aos movimentos populares, a censura, a prisão arbitrária, o exílio, a tortura, o assassinato.

A primeira peça, a ser apresentada, nesta quinta-feira, 17 de janeiro, sob a direção de Nonato Tavares, é O abajur lilás, de Plínio Marcos, que ficou onze anos sem poder sem ser encenada, de 1969 a 1980.

O texto é uma alegoria do Brasil da época, mas permanece muito atual. Nas palavras do crítico Sábato Magaldi, “De todas as peças que analisaram a situação brasileira pós-1964, O abajur lilás se distingue certamente como a mais incisiva, dura e violenta. Plínio Marcos fundiu nela, mais do que em outras obras-primas suas, talento e ira. A estrutura do poder ilegítimo está desmontada, para revelar, com meridiana clareza, seu ríctus sinistro.”

Serviço:
Evento: Teatro e Resistência – leituras dramáticas

Finalidade: mostra de peças de autores censurados, como Plínio Marcos, 
Gianfrancesco Guarnieri, Chico Buarque, Millôr Fernandes e outros

Onde: SINTTEL – Alexandre Amorim, 392, Aparecida

Recomendado para maiores de 16 anos.

Entrada franca.


quinta-feira, 30 de novembro de 2017

Leitura dramática: Estrela de Belém, uma jornada ao ventre da floresta





Estrela de Belém, uma jornada ao ventre da floresta, nasceu de uma demanda da prefeitura de Santa Isabel do Rio Negro, que está com uma forte atuação na área cultural, a cargo de Bosco das Letras. A ideia era montar um auto de natal, com cores regionais, de modo a proporcionar a identidade da população local com a atividade dramática. O diretor Nonato Tavares foi o encarregado de arregimentar o necessário para viabilizar a solicitação. Tavares contatou com o dramaturgo Zemaria Pinto, que aceitou de pronto o desafio. Detalhe: o tempo era muito exíguo, pois o segundo semestre do ano já estava em curso. Com a primeira parte do texto pronto, o diretor viajou a Santa Isabel, para a escolha de elenco e local da encenação. Infelizmente, entretanto, o projeto não vingou. Não para este ano, pelo menos. Com o texto completo, Nonato e Zemaria resolveram mostrar ao público o resultado do trabalho na forma de leitura do texto. Assim, no próximo sábado, 2 de dezembro, no MUSA do Largo, o diretor e o autor, mais doze atores, estarão promovendo a leitura do auto de natal Estrela de Belém, uma jornada ao ventre da floresta.
A peça divide-se em duas partes: “A viagem” e “O encontro”. A primeira parte se passa dentro do barco apropriadamente chamado “Estrela de Belém”, aquela que, segundo a tradição cristã, guiou os reis magos até a manjedoura onde nascera Jesus. Nesse barco viajam vários personagens. A maioria vai para Santa Isabel do Rio Negro sem saber bem a razão. Começam tensos, mas aos poucos vai se instalando um clima de harmonia dentro do barco, até a chegada à cidade.
A segunda parte mostra o encontro dos viajantes com representantes da população local: o pajé Coaraci e o casal de índios José e Maria, pais da pequena Maria de Jesus. Os nomes dos pais e da criança têm relação clara com o natal; porém, a intenção do texto é passar ideias de valores que vão muito além das religiões: valores humanos, aceitos por todos aqueles que acreditam que o mundo pode ser um lugar de paz entre os povos e entre os indivíduos. Os viajantes fazem oferendas à pequena Jesus e a jovem Manu transforma as falas em canções.
Para quem acompanha a tradição dramática brasileira, o autor, Zemaria Pinto, explica que utilizou a estrutura de Morte e vida Severina, de João Cabral de Mello Neto, publicado em 1955, tanto na divisão em duas partes (viagem e encontro) quanto na forma poemática. Mas enquanto João Cabral faz de seu poema um libelo pela reforma agrária, Zemaria coloca seus personagens no centro dos problemas mais imediatos do século XXI: depressão, solidão, abusos sexuais, fragilização da estrutura familiar etc. Mas a chama da esperança é mantida acesa, com o nascimento de Maria de Jesus – uma alegoria da renovação da vida e da valorização da mulher na sociedade deste novo século.     
(release) 


quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Avacavoa: o elogio da loucura


Zemaria Pinto

 

O Romantismo brasileiro produziu dois grandes mártires: o dramaturgo Qorpo-Santo (1829-1883) e o poeta Sousândrade (1833-1902). Não estranhe a grafia dos nomes: os editores de texto do século 21 (o futuro!) ainda não a reconhecem. À frente de seu tempo, incompreendidos, iconoclastas − ou apenas doidos varridos −, estes autores, ignorados ao seu tempo, têm exigido dos historiadores da literatura brasileira uma revisão consistente daquele período, conhecido do grande público através de seus heróis consagrados: Gonçalves Dias, José de Alencar, Castro Alves − estes acima de todos.

O gaúcho José Joaquim de Souza Leão, autoproclamado Qorpo-Santo, um funcionário público típico da pequena Porto Alegre da segunda metade do século 19 − professor, vereador, subdelegado de polícia −, começa a manifestar debilidade mental com pouco mais de 30 anos. Escreve freneticamente e produz dezenas de pequenas peças, numa linguagem caótica e com uma estrutura dramática anárquica, que somente 100 anos mais tarde encontraria reconhecimento. De vez em quando, o louco escarnecido das ruelas da provinciana Porto Alegre sai de sua condição de protomártir do antirromantismo para os píncaros da glorificação que, para um autor que trazia o teatro tatuado na alma, só pode se traduzir na representação de seu trabalho junto ao público.

E é isso o que o grupo Avacavoa nos traz, nas noites de sábado e domingo, até o final de setembro: o texto Mateus e Mateusa, de Qorpo-Santo, “rebatizado” como O que era e o que não devia ser. Mas o autor não vem sozinho: num espetáculo de celebração da loucura − dedicado a alguns loucos famosos da cidade de Manaus, como Eduardo Ribeiro, Carmen Doida e Bombalá −, homenageia também o artista plástico Bispo do Rosário, um arquiteto de minudências, um oráculo do detalhe, onipresente na cenografia do espetáculo. Ah, há também a música insana de Tom Zé.  

Falar que Qorpo-Santo é precursor do teatro do absurdo parece-me uma impropriedade, uma vez que é pouquíssimo provável que Jarry, ou mesmo Beckett ou Ionesco o tenham conhecido. Acautelemo-nos, pois e, sensatamente, como o momento pede, declaremos em alto e bom som: Qorpo-Santo é o inventor do teatro do absurdo! Que seria inventado também por Alfred Jarry, em 1896, quando o nosso herói (ou mártir) já em pó se tornara...

Mateus e Mateusa ou O que era e o que não devia ser é uma das mais representadas e representativas comédias de Qorpo-Santo: mostra um casal de cerca de 80 anos discutindo sobre sexo (no casamento) e as relações familiares com suas três (jovens) filhas. Não se espante o espectador com as cenas de puro pastelão; são para divertir a platéia, pois a isso serve o teatro. Mas observe a simbologia por trás dos gestos dos personagens e dos objetos em cena. E reflita. O humor de Qorpo-Santo é corrosivo e cruel. Dentro de uma perspectiva histórica meramente pedagógica, podemos afirmar que Mateus e Mateusa é a carnavalização do teatro bem comportado de José de Alencar e Martins Pena, modelos consagrados do período − neste sentido é antiteatro, anticonvencional, o avesso do avesso do avesso.      

Nonato Tavares acertou (mais uma vez) em cheio: no entrecruzamento de texto, cenografia e música, no tom burlesco da representação, rompendo com todos os limites do realismo, e na escolha dos atores – especialmente de Eric Fonseca, vivendo Catarina, uma das filhas, uma escolha repleta de significados e referências a outros trabalhos de Qorpo-Santo, cuja temática jamais se deixou escravizar pelo pudor ou pelo preconceito.

 
Publicado no Amazonas em tempo, em setembro de 2001.

domingo, 26 de dezembro de 2010

O rei não está nu, está de fralda! Valei-me Qorpo Santo!

Jorge Bandeira


O Rei geriátrico é posto em cena na peça Hoje sou um: e amanhã outro, pela Cia Vitória Régia, regida por Nonato Tavares, na sequência de uma trilogia programada para este singular e inclassificável autor do teatro brasileiro: Qorpo Santo. O ciclo fecha-se, segundo nos indicam, com As Relações Naturais. Vamos à peça: O regime político aos frangalhos, um reinado louco que está perdido nas próprias burocracias que engendrou, mas trata-se de uma farsa barroca, onde o encenador prioriza o que de melhor encontra-se em Qorpo Santo, o brincar na cena, a liberdade sem limites no criar as mais prosaícas circunstâncias que fazem da trama uma delícia de se acompanhar, feito súditos da insanidade. E a brincadeira não nos deixou nestes 40 minutos em que pontificou este rei, da mesma linhagem que fez surgir, tempos depois, obviamente por pura coincidência, o Ubu Rei de um certo Alfred Jarry.

A inserção dos elementos “regionais”: o boi, a toada, os políticos locais, nada escapou dos éditos e decretos lunáticos do barroco rei, que ostenta como forma ultrapassada, a linguagem quinhentista. Isso nos meados do século XIX,, quando o romantismo que envolvia a realeza no Brasil já estava sucumbindo às trapaças republicanas, ou seja, o Rei já está velho, caduco e as fraldas devem ser colocadas nele para que a merda real não escorra pelo palácio, para que o poder republicano não entre com sua higienização e peça a cabeça do Rei, como aconteceu na Revolução Francesa. Coisas do poder, uns estão equilibrados nele, enquanto outros tentam entrar e se locupletar dele, de qualquer forma ou meio. Maquiavélico rei, mas que trama apenas em sua incapacidade de ser são, lúcido.

A montagem de Nonato Tavares é de uma elegância em detalhes, como é de praxe em suas obras. A roupa como estética do barroco acompanha o zeloso trabalho de Koia Refkalefsky (que também é a Rainha), sendo importante destacar que esse barroco funciona com poucas variações cromáticas, onde o vermelho e o negro são as mais evidentes no palco, o que facilita a iluminação, com precisas alternâncias de focos e de refletores e suas tonalidades.

O quinhentismo linguístico foi uma opção de garantir o registro da época de Qorpo Santo, e a cavalaria galopa de forma absurda, e lembra os cavaleiros medievais do Monty Python no “em busca do cálice sagrado”. As referências a Alfred Jarry e ao clássico personagem do Ubu Rei são notórias, e que coroa de Rei é aquela, de efeito cênico deslumbrante, não dá para imaginar mais aquele Rei sem a sua estonteante coroa. A pomposidade do figurino, a maquiagem, tudo foi calculado com zelo máximo pela produção e pelo encenador.

A loucura pelo poder atravessa etapas históricas e prossegue por toda civilização, antiga e futura, e entre a tênue linha entre sanidade e loucura, encontra-se o poder, os mandatários, semiloucos num mundo que teima a se tornar curado, uma tarefa vã, de terrível constatação. Qorpo Santo já alertava em seus textos sobre essas questões paradoxais, existenciais e políticas. Vivemos a insanidade de nossos refluxos de lucidez. A música na medida certa, sem arroubos desnecessários, faz da sonoplastia ao vivo desta obra de 40 minutos um espetáculo meticuloso, não barulhento, que chega aos ouvidos de forma suave, mas contundente.

As damas que acompanham a Rainha são invólucros de uma desfaçatez, dançarinas provocantes de um boi-bumbá de “Paristins”, por isso que o Rei passeia em seu boulevard de Versailles. Para relaxar, para se esquecer... Os Soldados, com seus figurinos à sadomasoquismo, lembram os centuriões na versão moderna das dominatrix. Os decretos absurdos pululam de um palácio feito colônia de loucos, onde o ministro tenta, em vão, subverter uma ordem; claro que não consegue, pois o caos domina sempre o ambiente, mesmo nos momentos de aparente controle físico e emocional do Rei, mesmo nos seus destemperos de personalidade e na sua senilidade.

Um dado curioso e que remete aos aparatos da nobreza no Brasil: nos tempos do império realmente havia uma equipe que tratava da higiene do Rei, e alguns tronos tinham um fundo falso, espécie de vaso sanitário, para quando o Rei participasse de uma longa reunião não precisasse interrompê-la, evacuando ali mesmo no “trono-vaso”. Um escravo, então, recolhia a merda real e a levava no penico real para a rua real. Era dessa forma mesmo. A Atualidade em Qorpo Santo é incontestável, e por mais que seja uma precipitação e até mesmo preciosismo patriótico vinculá-lo às vanguardas teatrais que o sucederam, é notória sua capacidade de inovar nas letras e na dramaturgia feitas naquele momento histórico, nos meados do século XIX.

Um teatro límpido e objetivo, de uma trupe que funciona perfeitamente bem no que se propõe a colocar em cena, e mesmo que algumas falas tenham se “atropelado” ou que engasgaram na voz da Rainha, tudo isso é irrelevante, pois a perda de voz da Rainha também representa, no meu ensejo de observador não implacável, a própria fraqueza do poder real. A cenografia econômica de Nonato Tavares, um bobo musical e um trovador que são este duo da sala real, tudo se encaixa na proposta de cena. Uma cena, aliás, que de tão simples levou o público a aplaudir o “voo da cavalaria”, num movimento tão simples, mas que transmitia uma maneira de brincar e de sonhar, tal qual uma Cavalgada das Valquírias num palco onde esse mesmo público fez esforços pendulares com a cabeça e pescoço, este, o único problema a ser resolvido, evitar este incômodo ao espectador, pois o mesmo plano de cadeira no palco do Teatro Amazonas impossibilita visão total das cenas. Mas isso não chega nem a coçar, pois o riso aparece e depois a gente trata do torcicolo. E viva o Rei!

Manaus, 10 de outubro de 2010

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Cia de Teatro Vitória Régia comemora 25 anos... trabalhando em dobro

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A Cia de Teatro Vitória Régia comemora 25 anos de atividade com uma programação dupla de Qorpo Santo. Direção geral de Nonato Tavares.

Local: Espaço Cultural Sinttel – rua Alexandre Amorim,  392, bairro de Aparecida (em frete à igreja de Aparecida)

Entrada : R$ 5,00

Às sextas-feiras, dias 17 e 24 de Setembro, e 08, 15, 22 e 29 de Outubro, sempre às 20h00:


Aos sábados, dias 18 e 25 de Setembro, e 09, 23 e 30 de Outubro, sempre as 20h00:

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

El Perikiton cerra las puertas

Depois de mais de 20 anos de atividade, o restaurante El Perikiton encerrou suas atividades no último sábado, 14 de agosto. Dona Dulce e Seu Pedro resolveram se aposentar. Ponto de encontro de artistas e intelectuais, o El Perikiton vai deixar um vazio na vida boêmia da cidade.
Abaixo, alguns flagrantes da festa que deixou um travo amargo em cada um. 

D. Dulce com a mascote do El Perikiton.

A atriz Koya Refkalefski e a quase-advogada Paloma Figueiredo.

Professores Doutores Allison Leão e Marcos Frederico Krüger.


(Foto censurada.)


Célio Cruz, cantor e compositor, e Edunira Assef, arquiteta.

Escritores Zemaria Pinto e Luiz Bacellar.

O ator Nonato Tavares e a mascote.


Lydia Lucia, produtora de TV.

Fotos e vídeo: Lydia Lucia.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Chico Mendes (15/12/1944-22/12/1988)
Cena de Tributo a Chico Mendes, com a Companhia Vitória Régia, esta noite. Direção: Nonato Tavares.

domingo, 21 de dezembro de 2008