Amigos do Fingidor

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Apresentação do livro O Sétimo Dia, de Jorge Tufic 1/2

Zemaria Pinto*


Foi há exatos 25 anos que travei, por intermédio de jovens amigos comuns, contato pessoal com o poeta Jorge Tufic, a quem aprendera a admirar a distância. Uma qualidade desconhecida foi logo realçada naqueles encontros iniciais: a generosidade do poeta, capaz de dedicar horas de seu raro tempo para nos passar noções de poética – versificação, metro, ritmo. Falar, nem sempre bem, das vanguardas ainda em voga: a poesia concreta, a poesia-práxis, o poema-processo, a poesia de muro. Sobre os poetas que, parte do cenário mundial, começavam a ser conhecidos e estudados no Brasil, e mereciam nossa atenção, como Eliot, Pound, Cummings. A sua paixão pelo soneto, da qual eu não compartilhava, inicialmente. Tudo isso entremeado por deliciososcausos”, envolvendo os amigos do Clube da Madrugada. O dedicado professor seria contemplado, 23 anos mais tarde, com o Prêmio Nacional de Ensaio, da Academia Mineira de Letras, para o seu Curso de Arte Poética. “Um lance de dados jamais abolirá o acaso.” O professor Tufic não o era por acaso...

Poeta não se define: é um ser à parte.” A análise de uma obra literária de qualidade dispensa a teoria literária e todos os seus (pre)conceitos, buscando engendrar uma nova teoria, específica e apropriada unicamente àquela obra sobre a qual nos debruçamos. Um novo livro de Jorge Tufic é uma oportunidade ímpar para deixarmos de lado tudo aquilo que aprendemos e iniciarmos um novo aprendizado do que é a poesia lírica neste início do século XXI.

Estreando em livro em 1956, com Varanda de Pássaros, Jorge Tufic construiu, nestes quase 50 anos, uma poesia rigorosa e reflexiva, mas sobretudo inquieta: Das pedras que lavro, diz ele no poemaOfício”, 

soltam-se, às
vezes,
clarões e
gemidos.
Estalos, brilhos
que imitam
palavras.

Não à toa, a pedra é uma imagem recorrente neste livro de Tufic, ora como elemento natural, ora, no mais das vezes, como metáfora da liça cotidiana. Mas um poema não é apenas um amontoado de palavras. As pedras-palavras a que se refere o poeta precisam ser trabalhadas exaustivamente para que logrem alcançar o “estado de Poesia”. É o que temos neste O Sétimo Dia, uma referência explícita ao Gênesis, quando Deus deu sua obra por terminada e descansou, ou melhor deu-a ao uso do homemque desde então tem-se dedicado a destruí-la. O “sétimo dia” é, pois, o dia da contemplação, do lazer, do prazer. É o dia da poesia. O poeta conclui mais uma coletânea a e entrega para deleite de seus leitores. Mas, com certeza, não descansa. Antes, trabalha lavrando pedras, pois tem sido assim desde o início, e é assim que ele chega, com este, ao 43° título de sua brilhante carreira.

(*) Discurso em sessão pública da Academia Amazonense de Letras, no dia 18 de junho de 2005, apresentando o livro O sétimo dia, de Jorge Tufic.
Foi publicado no n° 27 da Revista da AAL.