O chão do mundo
Thiago de Mello (1926-2022)
Rumo nenhum persigo. É quando sigo
as vias do mais trôpego sonhar
ou de fundos e rijos pensamentos,
chego sempre a mim mesmo; o clamor áspero
que me atraiçoa o límpido silêncio,
após ressoar em vão pelas paredes
da gasta e surda concha do infinito,
retorna, feito mágoa, à minha boca.
Não sei dar-me o que busco, se o não tenho.
A erva do tempo cresce, suavemente,
não tarda e o chão do mundo me devora.
Por isso quando em mim se faz mais noite,
minha face despida de seus medos
em sua própria treva se contempla,
onde lhe esplende a rude finitude.
Em meu ser, resignado, permaneço,
pois se tento fugir-me, eis que me vem
à boca o travo frio do negrume
que existe além de mim, e que me espera.