Amigos do Fingidor

domingo, 26 de outubro de 2025

Manaus, amor e memória DCCXLVI


Mercado Adolpho Lisboa.

 

quinta-feira, 23 de outubro de 2025

A poesia é necessária?

 

Busca

Tenório Telles

 

 

Navegante de mim mesmo:

– mar inconsútil de lembranças

do que fui

do que poderia ter sido

: desse sendo que sou

 

Tudo o que perdi:

os sonhos da infância

o pai que não chegou ao porto

as primeiras dores

a descoberta da vida

a descoberta da morte

 

os seres lendários das matas

os encantados do rio

os amores que não se cumpriram

as flores que não se abriram

os poemas, os livros que sonhei

a esperança que não floresceu

os amigos que partiram

 

[– tantas promessas perdidas:]

 

O que não fui e perdi

renasceu no que sou

– matéria do meu canto

– flores do meu jardim

 

Sou essas pedras

essas flores caídas

esses sonhos inconclusos

esses amores partidos

esses poemas sem voz

esses livros sem história

 

Sou esse mar e seus náufragos

esse céu sem estrelas

esse deserto florido.

 

terça-feira, 21 de outubro de 2025

Falta tudo, mas tem lastro

Pedro Lucas Lindoso

 

Tia Idalina chegou do Rio de Janeiro. Um acontecimento. Chegou bastante mal-humorada. Reclamou do calor. Fez péssima viagem. Conexão em Brasília. Desembarcou no portão 2. O embarque para Manaus foi no Portão 28. Quase perde o voo. Não teve tempo de lanchar.  Não ofereceram nada saudável no avião. Saudades do serviço de bordo da Varig. Essas empresas aéreas de hoje são uma lástima. Passagens caras e serviço de bordo péssimo.

Estava mesmo sem sorte. Foi tomar banho. Faltou água. Limpeza na caixa do prédio. O porteiro avisou. Então não é culpa da COSAMA. Não existe mais COSAMA. Agora é Manaus Ambiental. Não tem problema faltar água. Pior foi faltar oxigénio nos hospitais, na pandemia.

Idalina foi à farmácia. O remédio para diabetes estava em falta. Mas onde falta oxigénio em hospital, faltar remédio não é nada. À noite faltou luz. Idalina imaginou as pessoas morrendo sufocadas por falta de oxigênio e no escuro.

Ela não se esquece da tragédia da falta de oxigénio. Sua afilhada ligou. Comadre Anita internada com Covid. A moça desesperada relatando que sua mãe estava morrendo com falta de ar. Não havia mais oxigênio disponível nos hospitais. Coitada da minha comadre. Perguntou se a família havia recebido alguma indenização. Que nada. Centenas de pessoas morreram com falta de ar. Ninguém fala mais no assunto. A tragédia da falta de oxigênio parece que virou um tabu. Escreveram um livro sobre isso? Fizeram um documentário? Daria uma minissérie. Alô, Rede Globo! Ninguém foi preso então? Absurdo. O escritor Zemaria Pinto fez um roteiro. A produtora Bacaba, sob a direção de Bruno Pantoja, transformou o roteiro em um curta-metragem: Garrote. É uma ficção que retrata a realidade vivida. Assistam. Vale a pena. Foi só. Ninguém fala no assunto.

Falta água, falta luz, falta remédio. Falta até oxigênio na pandemia. Não fala mal de Manaus. Só amazonense pode reclamar da cidade. E isso mesmo. Não está feliz aqui bye bye e benção. Ora bolas. Eu estou exilada em Copacabana porque quero. Se tivesse que nascer de novo nasceria aqui.

Estamos em outubro. Manaus vai fazer 356 anos dia 24. Como assim? Perguntou Idalina. Eu me lembro tão bem. 24 de outubro de 1948. Celebramos o aniversário de 100 anos da cidade. Estava no IEA. Instituto de Educação. Manaus deixou de ser vila para se tornar cidade em 24 de outubro de 1848. O mesmo aconteceu com Santarém. Na mesma data. De onde tiraram esses 356 anos? Então não sabem que há mais de dez mil anos já se comia jaraqui por aqui?

Pois é. Faltam muitas coisas em Manaus. Até bom senso falta. Pode faltar tudo, mas presta. Eu amo essa cidade. Como dizia a quase-finada Odete Roitman: a cidade tem lastro.


domingo, 19 de outubro de 2025

Manaus, amor e memória DCCXLV


Palácio da Justiça.


quinta-feira, 16 de outubro de 2025

A poesia é necessária?

 

I don’t like myself

Geraldo Carneiro

 

queria ser outro, perambular

entre as bandeiras enfunadas de pasárgada

bailar no bas-fond de Baudelaire

navegar no barco de Rimbaud

às vezes veranear nos subúrbios do Inferno

na selva selvagem de Dante

sempre argonauta de ultramares

sem o terror narcísico do espelho:

o mesmo círculo a mesma escrita o mesmo rosto

o mesmo animal confinado

em sua ridícula circunstância


terça-feira, 14 de outubro de 2025

Dia das Crianças

Pedro Lucas Lindoso

 

Dia 12 de outubro chegou com o cheiro de panqueca vindo da cozinha da Vovó Vera. E o som alto das falas, risos e algazarras das quatro primas, nossas netinhas. Vovô Pedro, fantasiado de professor Girafoles, montou e dirigiu um teatro com as quatro garotinhas amadas.

Maria Luísa foi a primeira a entrar em cena, vaidosa e estudiosa como sempre. Ela chegou empunhando um caderno como se fosse um mapa do tesouro. “Abre o pote de mel karo!” Exclamou, referindo-se ao mel colocado nas panquecas da vovó. Depois, mostrou uma chave que guarda como se fosse de uma escola flutuante. Tema da feira de Ciências da escola. Malu já descobriu que ciência pode ser deliciosa. Podemos misturar cores e fantasias para provar, entre risos, que a matemática também gosta de brigadeiro.

Maria Helena, carinhosa, espontânea e sensível, chegou trazendo o sol dentro da mochila. Abriu espaço na sala para um recital de abraços. Cada abraço tinha uma promessa de cuidado. Maria Helena em cada sorriso pedia para não se esquecerem da lição da feira de ciência da escola. Tomar maracujá para se acalmar. Usar babosa para fortalecer cabelos. Depois, Maria Helena decidiu que a casa precisava de mais música. Então criou um coral de brinquedos, onde o relógio marcava o tempo com uma batida de coração. Tudo numa cadência que pareceu abraçar todo mundo.

Catarina, curiosa, carismática e conciliadora, assumiu a missão de organizar o reino das perguntas. “Por que a Lua não mora aqui?”, “Os botos moram no rio junto com os jacarés?”, E assim nasceu uma oficina de curiosidade. Perguntas em papel colorido, respostas em forma de histórias, e, claro, uma competição. Quem vai encontrar mais rápido o objeto perdido pelo professor Girafoles? O resultado foi em risadas, porque o objeto perdido era, na verdade, a bengala do vovô Pedro.

Isadora, simpática, espevitada e de personalidade forte, trouxe a coragem de quem não tem medo do palco aberto. Ela conduziu uma apresentação improvisada sobre superpoderes. Cada uma escolhia um poder, demonstrava com gestos, e descobriam que o maior superpoder é a alegria de partilhar. Isadora organizou uma corrida de sorrisos, onde quem sorri mais ganha um pastel de vento feito pela prima Bolha.

Entre tantas brincadeiras, a casa ganhou o brilho das pequenas vitórias. Quem acerta a pergunta do professor Girafoles ganha o direito de escolher o desenho da Netflix. Quem come tudo direitinho recebe um diploma de “Experta em Sabor”; quem encontra o brinquedo escondido antes do almoço pode escolher o tema da próxima história.

Os avós, os papais e as mamães aprendem que a beleza está nos gestos simples, no riso que sobe do peito, nos olhos que brilham quando alguém descobre que o mundo é maior quando dividido com quem se ama. Brincar com Maria Luísa, Maria Helena, Catarina e Isadora é lembrar que o futuro promissor e feliz não é apenas uma ideia distante. Começa hoje, no compasso de cada abraço aceito, na curiosidade que não se cala, na gentileza que se multiplica. E, no final do dia dedicado as crianças e a Nossa Senhora o coração dos pais e avós fica mais leve, satisfeito, cheio de promessas de que amanhã haverá novas aventuras, novas risadas e, principalmente, novas memórias para guardar com muito cuidado no baú do afeto.

Feliz Dia das Crianças, minhas queridas netas. Que a alegria de ser vovô seja sempre a nossa brincadeira mais bonita.


segunda-feira, 13 de outubro de 2025

"Garrote" no Festival Taguá de Cinema

 

Se você ainda não viu Garrote – ou viu mas ainda não votou para a fase presencial do Festival Taguatinga de Cinema, você pode votar até o próximo sábado, dia 18.



É muito simples. Entre no site e clique em CADASTRAR – precisa somente do seu nome e um e-mail. Depois é só seguir as instruções.

https://festivaltaguatinga.com.br/festivalTagua/18/assista/curta/filme/4351

 


 

domingo, 12 de outubro de 2025

Manaus, amor e memória DCCXLIV

 

Mercado Público de Manaus.

sexta-feira, 10 de outubro de 2025

Garrote, algumas considerações


Donaldo Mello

 

Boa noite, velho amigo Zemaria!

 

Grato por compartilhar seu Garrote. Parabéns pela sua estreia, como roteirista, na linguagem cinematográfica. Você é um trabalhador incansável e ousado, graças a Deus. Com sua proverbial simpatia, sempre encontrará bons parceiros. Claro que se trata de uma sua primeira experiência. Nós, seus leitores, já nos acostumamos à sua afinada voz nos contos, poemas, ensaios, teatro. Precisamos treinar o ouvido para a linguagem do cinema. A propósito, sua voz, literalmente, ficou bem, em off, no filme Garrote, reportando notícias no rádio.

Ao cumprimentar o diretor Bruno Pantoja, suponho que, provavelmente, ele deve estar 'buscando afiar' um olhar próprio, no contexto de um texto de ficção. Algo que difere, da visão do cineasta voltado para o “gênero” documentário, como você informou sobre a experiência do jovem cineasta. A respeito, lembro-me das memoráveis 'lições de cinema', do notável documentarista Eduardo Coutinho. Este, que se dedicava, exclusivamente (quase), ao cinema - documentário. Tendo conseguido, bem antes de se tornar um ícone no gênero, produzir uma das suas obras ÚNICAS, que consistiu em um misto de documentário e ficção. Refiro-me ao clássico Cabra Marcado para Morrer, com fotografia do nosso inesquecível amigo cineasta e professor da UnB Vladimir Carvalho (irmão de Valter Carvalho, ambos paraibanos).

Pois então, com esse referencial, entre outros, desses dois amantes do cinema é que gostava de pensar sobre essa particular carpintaria. Recordo, por outro lado, que Glauber Rocha dizia, mais ou menos, que "para fazer cinema, basta uma filmadora e uma ideia na cabeça. O curta metragem Garrote, com mérito, deixa documentado um fato histórico trágico: a falta de oxigênio para atender aos pacientes da Covid-19, em Manaus. A falência do setor da Saúde, na capital do estado do Amazonas. A meu ver, ainda não bem conhecida país afora, todavia numa perspectiva intimista, que sublinha, na trama do cotidiano, o conflito ideológico e a tragédia política, perpetrada na conjuntura conflituosa, que a pandemia da Covid-19, singularmente, produziu em Manaus tristemente. Abraço amazônico saudoso, extensivo aos seus familiares.

P. S.: Somente, agora, pude tentar atender, se é que o fiz, seu pedido quanto à minha opinião sobre o curta metragem Garrote. Torço para que seja bem acolhido pelo público em geral. Enviei para alguns amigos e recebi, poucas, mas boas opiniões.

 

Donaldo Mello é amazonense, radicado em Brasília há mais de 40 anos, e tem dois livros de poesia publicados:

Véspera de azul (Valer/Massao Ohno, 2002) e

Bordado para iniciantes (Valer, 2008).



quinta-feira, 9 de outubro de 2025

A poesia é necessária?

A mulher e a casa

João Cabral de Melo Neto (1920-1999)

 

Tua sedução é menos

de mulher do que de casa:

pois vem de como é por dentro

ou por detrás da fachada.

 

Mesmo quando ela possui

tua plácida elegância,

esse teu reboco claro,

riso franco de varandas,

 

uma casa não é nunca

só para ser contemplada;

melhor: somente de dentro

é possível contemplá-la.

 

Seduz pelo que é dentro,

ou será, quando se abra:

pelo que pode ser dentro

de suas paredes fechadas;

 

pelo que dentro fizeram

com seus vazios, com o nada;

pelos espaços de dentro,

não pelo que dentro guarda;

 

pelos espaços de dentro:

seus recintos, suas áreas,

organizando-se dentro

em corredores e salas,

 

os quais sugerindo ao homem

estâncias aconchegadas,

paredes bem revestidas

ou recessos bons de cavas,

 

exercem sobre esse homem

efeito igual ao que causas:

a vontade de corrê-la

por dentro, de visitá-la.

  

terça-feira, 7 de outubro de 2025

O cupim desrespeita a tudo e a todos

Pedro Lucas Lindoso

 

Minha querida tia Idalina outro dia disse: “cupim não é jabuticaba, que só dá no Brasil. Essa praga é mundial”. Titia tem razão. O cupim pode ser encontrado em todo o planeta. Exceto na Antártida e no Alasca. Essa praga cosmopolita, presente em qualquer cidade do mundo, danifica estruturas de madeira, móveis e outros materiais.

Devido a sua preferência por umidade, os cupins prosperam em regiões quentes e úmidas. Portanto, em Manaus eles fazem a festa.  As casas antigas da cidade têm porões ou sótãos. Uma forma de adaptação ao clima tropical da Amazônia, especialmente com a umidade e a temperatura. Os porões ajudavam a criar uma maior circulação de ar e afastar a umidade do solo, proporcionando um ambiente mais fresco e ventilado dentro da casa. E também para evitar os terríveis cupins. Há controvérsias.

Nossa casa da Henrique Martins tinha um porão de cerca de 1 metro. Obviamente sob um assoalho de madeira. De repente, o assoalho ficou infestado de cupim. Retiraram-se as tábuas para assentar cerâmicas. Os habitantes ficaram na casa. Inclusive eu, garoto danado, de 8 anos. Um buraco no meio da sala. Eu pinotando de lá pra cá, não vi o buracão. Malsinados cupins!

Caí no buraco, fraturei o braço. Chamaram seu Dico Paiva, um técnico prático que engessava braços e pernas das pessoas, na Manaus de antigamente. Era o pavor de curumins danados e de médicos ortopedistas. Por razões distintas.

Malditos cupins. Eu achava que só existiam aqui em Manaus. Em Brasília são raros devido ao clima seco. A praga gosta de umidade.

Retornei a Manaus há alguns anos. Novamente, encontro-me aterrorizado pelo cupim. Eles têm poder de destruição extremamente alto e podem, em pouco tempo, acabar com a estruturas de casas e até prédios.

De acordo com a revista National Geographic, estas pragas podem causar prejuízos anuais de mais de 10 bilhões de dólares. Os insetos são organizados em colônias mundo afora. Em Inglês, francês e italiano são os terríveis “termite”. Só mudam as respectivas pronúncias. No espanhol, “las termitas”. Não sei como se diz em mandarim, mas fazem estragos lá pela China também.

O cupim não respeita país, nacionalidade, nada e ninguém. Por último, infestaram o prédio da AAL – Academia Amazonense de Letras.  Nem os imortais amazonenses escapam do cupim!


domingo, 5 de outubro de 2025

AJUDE "GARROTE" A CHEGAR NA TELONA!**

 ✨ **AJUDE "GARROTE" A CHEGAR NA TELONA!** ✨


Nosso curta-metragem "Garrote" está na fase online do Festival Taguatinga de Cinema e precisamos do seu voto para ir para a mostra presencial!


🎬 **Como votar é super fácil:**

1. Acesse o link: https://festivaltaguatinga.com.br/festivalTagua/18/assista/curta/filme/4351 

2. Faça um cadastro rápido (se ainda não tiver).

3. Procure por "Garrote" e clique para votar!


O filme mais votado garante exibição presencial no festival de 19 a 22 de novembro. Sua ajuda é fundamental para levar o cinema amazonense mais longe!


**A votação vai até 18 de Outubro!**


Contamos com você! 🙏


#Garrote #FestivalDeTaguatinga #VoteNoGarrote #CinemaNacional #CurtaMetragem










Manaus, amor e memória DCCXLIII

 

Vista do Igarapé do Espirito Santo (George Huebner - circa 1890).

sábado, 4 de outubro de 2025

Garrote está no 18° Festival Taguatinga de Cinema, no DF





Se você ainda não viu, é uma boa oportunidade. Garrote está no 18° Festival Taguatinga de Cinema, no Distrito Federal. Mas se você já viu e está sem tempo de rever, deixe o seu voto, em:

https://festivaltaguatinga.com.br/festivalTagua/18/assista/curta/filme/4351

Siga os passos: entre no link acima, cadastre-se (e-mail e senha) e clique no botão de votação. Disponível até 18 de outubro.

Mais informações: https://festivaltaguatinga.com.br/    


 

quinta-feira, 2 de outubro de 2025

A poesia é necessária?

 

Reis do agronegócio

Chico César e Carlos Rennó

 

 

Ó donos do agrobiz, ó reis do agronegócio

Ó produtores de alimento com veneno

Vocês que aumentam todo ano sua posse

E que poluem cada palmo de terreno

E que possuem cada qual um latifúndio

E que destratam e destroem o ambiente

De cada mente de vocês olhei no fundo

E vi o quanto cada um, no fundo, mente

Vocês desterram povaréus ao léu que erram

E não empregam tanta gente como pregam

Vocês não matam nem a fome que há na terra

Nem alimentam tanto a gente como alegam

É o pequeno produtor que nos provê

E os seus deputados não protegem, como dizem

Outra mentira de vocês, pinóquios véios

Vocês já viram como tá o seu nariz, hein?

Vocês me dizem que o Brasil não desenvolve

Sem o agrobiz feroz, desenvolvimentista

Mas até hoje na verdade nunca houve

Um desenvolvimento tão destrutivista

É o que diz aquele que vocês não ouvem

O cientista, essa voz, a da ciência

Tampouco a voz da consciência os comove

Vocês só ouvem algo por conveniência

 

Para vocês, que emitem montes de dióxido

Para vocês, que têm um gênio neurastênico

Pobre tem mais é que comer com agrotóxico

Povo tem mais é que comer se tem transgênico

É o que acha, é o que disse um certo dia

Miss motosserrainha do desmatamento

Já o que acho é que vocês é que deviam

Diariamente, só comer seu “alimento”

Vocês se elegem e legislam, feito cínicos

Em causa própria ou de empresa coligada:

O frigo, a multi de transgene e agentes químicos

Que bancam cada deputado da bancada

Té comunista cai no lobby antiecológico

Do ruralista cujo clã é um grande clube

Inclui até quem é racista e homofóbico

Vocês abafam, mas tá tudo no youtube;

Vocês que enxotam o que luta por justiça;

Vocês que oprimem quem produz e que preserva

Vocês que pilham, assediam e cobiçam

A terra indígena, o quilombo e a reserva

Vocês que podam e que fodem e que ferram

Quem represente pela frente uma barreira

Seja o posseiro, o seringueiro ou o sem-terra

O extrativista, o ambientalista ou a freira

 

Vocês que criam, matam cruelmente bois

Cujas carcaças formam um enorme lixo

Vocês que exterminam peixes, caracóis

Sapos e pássaros e abelhas no seu nicho

E que rebaixam planta, bicho e outros entes

E acham pobre, preto e índio “tudo” chucro:

Por que dispensam tal desprezo a um vivente?

Por que só prezam e só pensam no seu lucro?

Eu vejo a liberdade dada aos que se põem

Além da lei, na lista do trabalho escravo

E a anistia concedida aos que destroem

O verde, a vida, sem morrer com um centavo

Com dor eu vejo cenas de horror tão fortes

Tal como eu vejo com amor a fonte linda

E além do monte o pôr-do-sol porque por sorte

Vocês não destruíram o horizonte... ainda

Seu avião derrama a chuva de veneno

Na plantação e causa a náusea violenta

E a intoxicação “ni” adultos e pequenos

Na mãe que contamina o filho que amamenta

Provoca aborto e suicídio o inseticida

Mas na mansão o fato não sensibiliza

Vocês já não tão nem aí co’aquelas vidas

Vejam como é que o agrobiz desumaniza...:

Desmata Minas, a Amazônia, Mato Grosso...;

Infecta solo, rio, ar, lençol freático;

Consome, mais do que qualquer outro negócio

Um quatrilhão de litros d´água, o que é dramático

Por tanto mal, do qual vocês não se redimem

Por tal excesso que só leva à escassez

Por essa seca, essa crise, esse crime

Não há maiores responsáveis que vocês

Eu vejo o campo de vocês ficar infértil

Num tempo um tanto longe ainda, mas não muito

E eu vejo a terra de vocês restar estéril

Num tempo cada vez mais perto, e lhes pergunto

O que será que os seus filhos acharão de vocês

Diante de um legado tão nefasto

Vocês que fazem das fazendas hoje um grande deserto verde

Só de soja, de cana ou de pasto?

Pelos milhares que ontem foram e amanhã serão

Mortos pelo grão-negócio de vocês

Pelos milhares dessas vítimas de câncer

De fome e sede, e fogo e bala, e AVCs

Saibam vocês que ganham com um negócio desse

Muitos milhões, enquanto perdem sua alma

Que eu me alegraria se afinal morresse

Esse sistema que nos causa tanto trauma

 

Eu me alegraria se afinal morresse

Esse sistema que nos causa tanto trauma

 

Eu me alegraria, ô

Esse sistema que nos causa tanto trauma

 

Ó donos do agrobiz, ó reis do agronegócio

Ó produtores de alimento com veneno...