Amigos do Fingidor

segunda-feira, 27 de julho de 2015

Como Eva



Inácio Oliveira

           Rafaela está nua, de tamancos, sobre a cama. Ela os calça para fazermos amor, às vezes põe também os meus óculos. Diz que assim me vê mais forte, mais perto, mais dentro. Gosto destes simples acessórios que não interferem na sua beleza. Repousa de bruços no travesseiro. A luz da tarde, em conjunção com os espelhos, reflete sobre a penugem dos seus braços fazendo lembrar um campo de trigo. Sinto-me generoso ao pensar quantos homens compartilham comigo o corpo desta mulher. Eu não os conheço, nunca vi seus rostos, não sei das suas histórias; mas sinto-me a eles irmanado. Como se fizéssemos parte de uma sociedade secreta, tão secreta que nem mesmo seus membros sabem que dela participam, nem que ela existe. No entanto esta sociedade existe, uma sociedade de homens tristes, entediados e solitários.

          Rafaela se vira na cama. Os peitos mantêm uma proporção correta, ainda são íntegros e rijos, apesar de muito manuseados. Ela se move com a leveza de alguém sozinho dentro de um quarto. Diz que o meu tempo acabou, mas posso ficar mais se quiser. Não há qualquer constrangimento em seus gestos, como Eva antes de ter comido o fruto.