Amigos do Fingidor

quinta-feira, 10 de agosto de 2017

Deuses, deusas e médicos na Grécia


João Bosco Botelho


As relações da Medicina com a compreensão mítica da realidade se perderam no tempo. É impossível separar as ideias míticas do entendimento do homem sobre a saúde e a doença.
Das primitivas relações do homem com outros animais, posteriormente substituídas pelas relações com a terra, surgiu empiricamente o uso das plantas na busca da saúde. A utilização do vegetal, indispensável à sobrevivência do homem, se processou em complexa compreensão mítica, que foi marcada pelas explicações que se sucederam nos milênios da origem primeira e do destino final do ser humano. Elas evoluíram da epopeia de Gilgamesh, dos babilônios, à teoria do Big Bang, dos modernos astrofísicos, passando pela gênese judaico-cristã e pela Yebá Beló da lenda desana da criação do Sol.
Apesar da melhor compreensão que temos hoje das metamorfoses do pensamento mítico, a dificuldade de interpretação aumenta na proporção que recuamos no tempo. Entretanto, parece ser a partir do século 6 a.C., na Grécia, que chegou o material historiográfico suficiente para traçar, com alguma segurança, um perfil da Medicina da mitologia.
De acordo com a mitologia grega, a Medicina começou com Apolo, filho da união de Zeus com Leto. Inicialmente, Apolo foi considerado como o deus protetor dos guerreiros, posteriormente, foi identificado como Aplous ou aquele que fala verdade. Ele agia purificando a alma, por meio das lavagens e aspersões, e o corpo, com remédios curativos. Era considerado o deus que lavava e libertava o mal.
Um dos filhos de Apolo, Asclépio, recebeu educação do centauro Quirão para ser médico.  A escolha do centauro mítico para dirigir a educação de Asclépio se consolidou porque ele dominava o completo conhecimento da música, magia, adivinhações, astronomia e da Medicina. O centauro, além destas habilidades, tinha incomparável destreza, manejava com a mesma habilidade o bisturi e a lira.
O centauro Quirão além de ter educado Asclépio, na Medicina, também orientou Jasão na arte de vencer os mais incríveis obstáculos, e Dionísio, o deus da vegetação e do vinho, conhecedor dos mistérios da religião, do êxtase e da embriaguez. 
Hipócrates, talvez para evitar o mesmo destino de Sócrates, não abrigou o confronto com os deuses e deusas do panteão grego, em especial, com o deus Asclépio, o mais importante deus curador daquela época. Ao contrário, a Escola Médica de Cós, na ilha de Cós, no século 4 a.C., onde foi produzida a maior parte dos textos que possibilitaram o avanço na Medicina em direção à melhor compreensão da saúde e da doença, se consolidou ao lado do maior templo grego dedicado ao Deus Asclépio.