Amigos do Fingidor

sexta-feira, 31 de maio de 2019

Uma homenagem à cheia de todo rio



Francisca de Lourdes Louro


Gosto muito de ver a imensidão das águas, me reflito nessa “maioridade” quando, nesta época, os rios avolumam-se em grande extensão. No entanto, as plantações não escapam da força destruidora das enchentes. Mas é nesse dilúvio anual que nos fortalecemos.
As águas trepam nas viçosas plantações, depenam a terra toda que braços fortes tinham roçado para a obra da produção do alimento. E alguns interioranos veem o lar, que imaginavam estar fundado longe da bela intrusa, ser alagado, ou ser desfeito, e a grande toalha impura dobra-se em desmandos divinos. Meu Pai fugiu dessa sina. Trouxe na bagagem a vontade de uma vida melhor para as muitas filhas, que hoje reconhecem nessa fuga a bendição da vida. É, sou interiorana com muita honra. Primeiro, aprendi a remar uma canoa, agora dirijo outras montarias para realizar os sonhos de “Mundinho”, meu pai.
A beldade chega de mansinho, começa em janeiro e vai se desdobrando até junho, vai se mostrando para o futuro, pouco a pouco intumesce o ventre, é como a mulher gestando os filhos, e depois de jorrar-se, recolhe-se para no outro ano voltar, e isso é infinito, graças a Deus, sempre será. A natureza cíclica gera em nós, amazônidas, esse reverso de sim e não, essa é a sabedoria de saber esperar, chegar e ir embora.
 No entanto, desculpem-me a heresia, mostramos um projeto para ser aprovado pelo Senhor de toda Engenharia Universal, que já foi apresentado pedindo para que ELE permita que sejamos mais complacentes, e tolerantes com a natureza de todas as águas. Que as mãos não joguem para o chão a maledicente sujeira perversa que nos alcunha de preguiçosos, que as mãos preservem, plantem o amor pela natureza, que as mãos abençoem a terra e as águas, onde habitamos, pois só nós somos capazes de destruir a nossa própria casa.