Amigos do Fingidor

terça-feira, 7 de janeiro de 2025

Sem barulho

Pedro Lucas Lindoso

 

Liguei para a minha querida tia Idalina para saber como passou o réveillon. E, claro, desejar-lhe um novo ano com saúde e prosperidade. Estranhei sua carinha de tristeza no vídeo do celular. Ela foi logo dizendo, em francês: “Je suis devastée”. Em tradução rápida significa estar arrasada.

Quando ela fala francês comigo, das duas uma: ou está muito feliz ou muito triste. Perguntei-lhe o que houve. E ela continuou gastando seu francês. “Riobaldo est mort”.

Riobaldo, cachorro de estimação de Idalina, morreu na passagem do ano novo. Uma tragédia para titia. Já idoso, Riobaldo atordoado com o barulho de fogos de artifício, após latir incessantemente, começou a sentir falta de ar. Segundo tia Idalina, ele ficou ofegante. Era como se estivesse com dificuldade em puxar o ar para os pulmões.

Titia acha que Riobaldo enfartou em consequência dos fogos. Sabe-se que os fogos são terríveis não só para os animais. Crianças e autistas sofrem muito com o barulho. Idosos também.

Tia Idalina diz que apesar de ter 70 anos não se considera idosa. E complementa:

– Os fogos são desesperadores também para a terceira idade. Não é o meu caso. Mas tenho amigas idosas que ficam em pânico.

Sabemos que tia Idalina não tem só 70 anos. Ela foi ao baile do Rio Negro Club que elegeu Terezinha Morango Miss Amazonas. Em 1957. Mas voltemos aos fogos do réveillon.

Para os autistas os fogos trazem sobrecarga sensorial. O barulho é avassalador. Provocam estresse e ansiedade. As luzes brilhantes também podem causar reações aversivas.

Alguns tem dificuldade em entender o que está acontecendo. Essa situação pode fazer com que autistas fiquem, além de assustados, frustrados e desorganizados.

Teve origem no Senado Federal um Projeto de Lei que proíbe a fabricação, o armazenamento, a comercialização e o uso de fogos de artifício que produzam barulho acima de 70 decibéis. Está em tramitação na Câmara dos Deputados.

Espera-se que em breve a lei seja sancionada pelo Presidente da República. Afinal, três cachorrinhas vivem no Alvorada. Esperança, adotada na visita do presidente na cheia de Porto Alegre, Paris e Resistência. Esta última foi a cachorrinha que ficou famosa e entrou para a história por ser o primeiro animal a subir a rampa do Palácio do Planalto no dia da posse presidencial. O próximo réveillon será sem barulho. É lei.