Amigos do Fingidor

sábado, 28 de fevereiro de 2009

Vitral, 10 anos depois

O Cláudio Fonseca é um desses poetas raros que só acontecem de quando em quando, um ou dois por geração. Conheci-o antes de sabê-lo poeta. Nem sei se ele sabia que eu o era. Não falávamos sobre isso. Explico: criaturas noturnas, durante o dia somos analistas de sistemas. Geração 70: /3, /370, cartão perfurado!, balance line, sort/merge, Cobol etc. A primeira “máquina” com que trabalhei tinha 144Kb de memória, e ocupava uma sala duns 100m², a uma temperatura máxima de 18º. Só tem uma coisa que eu odeio mais que frio: cachorro! Mas essa é uma outra história. Quando os néscios nos vêem juntos, vem a pergunta inevitável: como vocês, informáticos, cartesianos e apolíneos, conseguem fazer poesia? Eu sempre respondo que eu, Zemaria, não sei porque insisto em fazer poesia. Será alguma patologia? Diz o Aldisio Filgueiras que a poesia é uma doença tropical. Quanto ao Cláudio Fonseca, eu sei: é porque ele é poeta. Um imenso poeta! Mas o Cláudio não é um poeta fácil. Ele pertence a uma casta especial: é um poeta para poetas. Vitral, que teve poemas reconhecidos e premiados Brasil afora, é um livro de leitura restrita, tal a intricada teia de referências. Mas isso não diminui sua beleza; antes, realça-a.

Cláudio Fonseca é, com o perdão da má-palavra, um neo-simbolista. E não só pelo cunho místico de que sua poesia se reveste, mas também pelo aspecto formal, pela musicalidade atonal, surpreendente. Uma seqüência de belos alexandrinos ou sáficos, de repente, deságua numa série de versos livres – musicais. Um clima de magia, associado à recorrência medieval e a uma linguagem de imagens sinestésicas e evocativas, reforçam essa classificação, de resto puramente didática. Longe da padronização estéril, ele segue a própria intuição e constrói uma poesia sofisticada e densa, sem paralelo na contemporânea poesia amazonense. Talvez alguma ressonância do Luiz Bacellar de Quatro Movimentos, não como epígono, mas como continuador de uma tradição.

Depois de 10 anos de Vitral, o primeiro livro de Cláudio Fonseca, o que temos de novo? Vitral reescrito, remodelado, cortado e acrescido... de três novos poemas. O perfeccionismo do autor nos dá a esperança de que algo está sendo trabalhado, sem pressa, buscando alcançar a altíssima qualidade que é sua marca registrada.

Zemaria Pinto - orelha de Vitral, de Cláudio Fonseca, 2a. edição, 2008.