Amigos do Fingidor

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Palavras de leitor

Jorge Tufic

Se é que existe uma poesia espontânea, leve, despojada, sem, contudo, abdicar da metáfora e do insight, aqui ela se encontra neste livro de Maria de Fátima Maia, em cujas rimas ocasionais, teatralização comedida e um lirismo permeado de sabedoria e bom humor, a simplicidade é o toque mágico de belíssimos poemas, alguns em tom de oração, outros contidos mas cheios de encantamento e ternura.

Há versos, neste livro, que mal tocam a superfície do papel, e nem precisam de reticências para flutuar entre o sonho e a realidade, entre a lágrima e o riso, entre o gesto grosseiro e a fuga para dentro de si mesma, esse abrigo sagrado donde se emana o bálsamo das grandes revelações em processo, embora lento, mas seguro do caminho que palmilha.

A poética de Fátima desvela um pouco de seu estofo bibliográfico, talvez ainda modesto, mas rico das influências recebidas a partir de Florbela Espanca, a quem dedica um dos poemas de “Palavritas”. É importante ressaltar, inclusive, a diversidade de estilos e técnicas com que deita e rola, dominando os segredos da métrica e do mais puro minimalismo, de causar inveja aos poetas que ainda insistem em confundir hai-kai com o trístico português.

Magia, precisão verbal e pudor diante da esfinge que nos devora com seu olhar feiticeiro, dão à textura de cada “objeto” deste volume um brilho diferente do outro, sendo todos, contudo, personas de uma única face iluminada pelo signo das transfigurações criadoras. Daí que, aos passos de hoje, ecos vindouros responderão com mais poesia ao que antes se reduzira a meras indagações em torno de sua existência abstrata, ou simplesmente hipotética. Por outras palavras, a tematização do fenômeno poético, de que ninguém jamais escapara, vai cedendo terreno à captura dos símbolos refratários.

Não será necessário dizer que a gente lê os poemas deste livro de um fôlego só. E o que vem a ser poesia senão uma busca contínua e pertinaz de seu nome verdadeiro, ou seja, do que é isso, afinal. Até que parece, às vezes, uma redundância tentar defini-la exatamente com as palavras de que ela nunca poderá sair, como sai a libélula de uma árvore.

E como faz, por brincadeira, Maria de Fátima Maia.