Amigos do Fingidor

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Zero em Geografia


Pedro Lucas Lindoso


Rocharleston Wylson nasceu no rio Juruá. Aos dezesseis anos veio para Manaus estudar. Foi morar na casa de uma tia, em Petrópolis. Fez um curso técnico e conseguiu empregar-se numa fábrica do Distrito Industrial.

 Depois do casamento com Katyanne, Rocharleston foi morar numa invasão na Zona Norte de Manaus. Conseguiu fazer uma casinha bem chibata, como diz o caboclo, na Rua da Penetração, que depois virou Rua Número Um. Então, um líder comunitário resolveu inovar, e trocou os nomes das ruas por letras. A Rua Número Um ficou Rua A, para não confundir com os números das casas.

 O tal líder, suplente de vereador, esteve por um ano na Câmara Municipal. Seu feito mais importante foi mudar, pela quarta vez, o nome da rua onde mora Rocharleston e Katyanne. Agora a rua tinha o pomposo nome de sua genitora, Dona fulana de tal.

É comum trocar-se nomes de ruas em Manaus. O hábito é antigo. A Rua Marechal Deodoro já foi Rua das Flores, em priscas eras. Tornou-se Rua do Imperador. Com o advento da República, Marechal Deodoro. Getulio foi homenageado trocando-se a Rua 13 de maio por Avenida Getúlio Vargas.  O problema é que nem sempre avisam aos carteiros e a população teima em continuar chamando pelo nome antigo. Há muita carta extraviada.

Depois de ser promovido a chefe de setor, Rocharleston pôde comprar, em 60 meses, um carro popular. O carnê do banco, inevitavelmente, extraviou-se. Tentou comunicar-se com a financeira, mas não obteve sucesso. Iria à agência, assim que tivesse uma folga.

Feriado em Manaus. Dia do aniversário da Cidade. Rocharleston dormia o sono dos justos quando foi acordado, às 06:05 horas da manhã. Tomou um susto. Lembrou-se de sua mãe, já idosa, que mora em Benjamim Constant, um dos municípios mais distantes de Manaus.

Mas era o “call Center” do banco. Rocharleston, educadamente, reclamou com a operadora, dizendo-lhe que o fuso de Manaus, no horário de verão, era de duas horas em relação ao sudeste.

 A moça parecia não entender. E repetia:

– São oito horas aqui em São Paulo, senhor.

E Rocharleston respondia:

– Eu sei, mas aqui em Manaus são seis da manhã.

E a moça continuava a insistir que eram oito em são Paulo. Rocharleston então perguntou se ela sabia o que é fuso horário. A operadora simplesmente disse que não sabia. Rocharleston retrucou:

 – Ora, a senhora não é obrigada a saber que hoje é feriado em Manaus, mas é uma temeridade fazer-se uma cobrança, aliás injusta, às seis horas da manhã. Vou explicar mais uma vez: No horário de Verão, Manaus tem uma diferença, para menos, de duas horas. A senhora entendeu?

- A operadora então perguntou. E Manaus fica no Brasil?

Rocharleston ficou irado e respondeu-lhe:.

- Ninguém tem o direito de fazer cobrança às seis horas da manhã, assustando as pessoas. Isso é constrangimento. Vou processar o banco por danos morais. O fato é que a senhora faltou muito às aulas de Geografia. A senhora é zero em Geografia.

– ...

– Tenha um bom dia.

E desligou.