Pedro Lucas Lindoso
É verão no Sudeste. Em janeiro e fevereiro o calor no Rio de
Janeiro compete com o nosso de agosto e setembro. Enquanto nessa época de
início de ano por aqui temos chuvas. E muita. É o inverno amazônico. As cheias
para este ano prometem. As praias começam a sumir e o ribeirinho se prepara
para a cheia dos rios.
E chove. Fui menino numa cidade pacata. Havia poucos carros
na Manaus dos anos sessenta. E como era gostoso tomar banho de chuva. Nas ruas
do centro. Ruas de paralelepípedos.
Ontem mesmo desci para a área externa do condomínio para
tomar banho de chuva. A piscina era só um pretexto.
Meninos de minha
geração tinham limites. Tínhamos hora para tudo. Até para dormir, por exemplo.
Nove horas. Tomávamos a benção. Escovar os dentes e dormir. Não havia TV. A luz
vinha de um gerador barulhento que funcionava até as dez da noite. Para ficar
acordado até mais tarde era preciso ter autorização.
Para tomar banho de
chuva também era preciso pedir permissão. Às vezes era proibido. Podíamos ficar
gripados ou com tosse. Se a gente não obedecesse e ficasse doente, era peia na
certa.
Interessante é que quando se tomava banho de chuva escondido,
raramente se ficava doente. A gripe só vinha quando o banho era legitimamente
autorizado.
Ah! Os banhos de chuva de minha infância! A água escorrendo
no rosto suado. A correria no pátio de nossa casa na Henrique Martins. O
quintal de minha vó na Vila Municipal. Chuva amazônica tem pingo grosso,
generoso.
Outro dia li um belo poema divertido e encantador, escrito em
português e espanhol. “Quando chove a cântaros”. Nele a chuva lava a alma e faz
brotar a esperança. A terra quase se mistura com o céu. É assim que acontece
com as nossas chuvas amazônicas.
Em Brasília os meninos não iam para rua tomar banho de chuva.
A chuva às vezes era até grossa, mas nunca com os nossos abundantes pingos.
Muitas vezes chovia fininho, o dia inteiro. Chuva triste, sem graça. Chuva
seca, como é seco o clima do Planalto Central.
Quando chove muito, em Inglês se diz: It is raining cats and dogs! Em uma tradução literal, seria “Está
chovendo gatos e cachorros” Chovendo muito! A mitologia dos povos nórdicos
associa os cachorros aos ventos. Por alguma razão que desconheço os gatos
remetem às fortes chuvas.
Aqui usamos a expressão “Chovendo canivetes”. Eu gosto muito
de “quando chove a cântaros”. Fica bonito também em espanhol – “cuando llueve a
cantaros”.
Mas o que eu gosto mesmo é de nossa chuva amazônica. De banho
de chuva!