Amigos do Fingidor

terça-feira, 23 de janeiro de 2018

Verbo livrar


Pedro Lucas Lindoso


Sou de uma família de “apaixonados por livros”. Meu pai, José Lindoso, costumava ir frequentemente às livrarias. Principalmente, aos sábados pela manhã. Morávamos na Rua Henrique Martins. As principais livrarias de Manaus ficavam na nossa rua, depois da Avenida Eduardo Ribeiro. Lembro-me especialmente da Livraria Acadêmica.
Meu irmão mais velho foi editor e presidiu a Câmara Brasileira do Livro.
Nossa casa abrigou várias bibliotecas. Mas nunca foram devidamente sistematizadas. Os livros de Direito costumam ficar desatualizados. Entre mudanças, empréstimos, pequenos “furtos” e doações, muitos livros se perderam.
Durante muito tempo, meu quarto abrigou parte da biblioteca de meu pai. Adolescente, convivi com o Tratado de Direito Privado, de Pontes de Miranda, rente à minha cama. José Lindoso foi professor de Direito Civil na Velha Jaqueira, antiga Faculdade de Direito do Amazonas.
Vivi e vivo entre livros. Não seria feliz se tivesse nascido na Idade Média, antes de Gutemberg. Para mim, o maior e mais importante inventor da Humanidade.
Geoffrey Chaucer – magnífico escritor e filósofo inglês do século XIV. Muito lembrado pela sua obra Os Contos de Canterbury (The Canterbury Tales, em inglês). Clássico da literatura inglesa medieval. O personagem Monge, um dos meus preferidos, tinha muito orgulho de sua biblioteca. A maior de todas! Seis livros!
Minha neta Maria Luísa, com dois anos de idade, tem no mínimo o dobro de livros do monge medieval de Chaucer. Sem contar diversos livros de plástico, para leitura no banho e na piscina.
E adora seus livrinhos. E já os identifica. Eu quero o do sapo. O do botinho. O do Jacaré. E pede: vem vovô, vamos livrar!
Maria Luísa criou um neologismo. O verbo livrar. Com apenas dois anos e já contribuiu imensamente com a Língua Portuguesa.
O neologismo é a criação de uma palavra nova. Pode ser fruto de um comportamento espontâneo. Foi assim que Maria Luísa criou o verbo livrar. Espontaneamente. Criar neologismos é uma habilidade inata e própria do ser humano e da linguagem.
 Numa época em que se lê no computador, tabletes e mensagens no celular, precisava-se de um verbo envolvendo o livro físico de papel.
Que maravilha. Temos agora o verbo livrar. Transitivo direto. Significa ler e gostar de livros de papel. Acho que essa garotinha merece o Prêmio Camões de Língua Portuguesa ou o Jabuti!
Verbo livrar! Esse é ótimo! Livrar é mesmo muito bom.