Pedro Lucas Lindoso
Tia
Idalina é mais que uma peça. Ela é um seriado de Netflix. Desses que a gente
faz maratona para assistir e ainda quer mais. Sabemos que ela recebe quatro
pensões. É viúva legítima de dois maridos. Recebe do estado, do município, do
governo federal e do INSS. Disse que são todas lícitas porque professor e
médico podem acumular.
Como
não tem filhos, faz a alegria dos sobrinhos. Um de seus sobrinhos é socialista
e ateu. Já o outro, é assumidamente de
direita, empresário e religioso.
No seu
apartamento em Copacabana há o famoso quadro de Che Guevara. Quando o sobrinho
conservador vai visitá-la, ela substitui o Che por uma foto de Margareth
Thatcher cumprimentando Ronald Reagan.
Ambos
sabem que Idalina se considera “empoderada” e apoia a luta das mulheres pelo
reconhecimento de igualdades em relação aos homens. Depois de meses sem receber
os sobrinhos, convidou todos para um tacacá em seu apartamento. Era para
comemorar uma conquista importante que aconteceu há 90 anos. A instituição do
voto feminino no Brasil.
Uma das
evidências que Idalina não tem só setenta anos, como afirma sempre, está no
fato de que conheceu, quando ainda jovem, a médica paulista Carlota Pereira de
Queiroz. Foi a primeira mulher eleita por São Paulo. Para a Assembleia
Constituinte de 1933. Idalina conhece a biografia de Anaíde Beiriz, Berta Lutz
e Pagu. Todas lutaram por espaço de poder feminino.
Por
conta disso, os sobrinhos de Idalina, ambos dirigentes de partidos nanicos, um
de esquerda e outro de direita, convidaram a titia para compor o quadro de
mulheres candidatas para as próximas eleições.
Para a
Assembleia Legislativa cada partido poderá registrar candidaturas no total de
até 100% do número de cadeiras a preencher mais um. Desse total de vagas,
deverá ainda preencher o mínimo de 30% e o máximo de 70% com candidaturas de
cada gênero. Ambos estavam com dificuldades para completar a cota das mulheres.
Idalina
não sabe dizer não para os sobrinhos. Primeiro se filiou no partido de um e
depois no de outro. Escondido de todo mundo. E veio me perguntar se teria
problemas! Claro que sim! Em caso de dupla filiação partidária, deve prevalecer
a última. Mas há necessidade de comunicar por escrito ao órgão de direção
municipal do partido e à Justiça Eleitoral. Sua candidatura vai ser impugnada!
Titia desligou o telefone. Apavorada.