Pedro Lucas Lindoso
Este Natal não caiu no domingo. Poderia ter
caído. Parecia domingo. Cheiro de domingo. Gosto de domingo. Silêncio de
domingo. “Ainda bem que não foi no domingo. Perderíamos o feriado”. Suspirou
tia Marilda, cansada da repartição. Da solidão. De sua vida em segredos.
A noite foi boa. Não houve brigas. Não que
não houvesse ressentimentos. Os rancores foram disfarçados. As angústias,
sublimadas pelo vinho e pelas rabanadas. Mas havia saudades. Não só de outros
natais. Saudades de pessoas. Saudades de um certo lugar que não mais existe.
Saudades dos que se foram. Saudades de sabores. Saudades de receitas de doces
que não foram herdadas por ninguém. Saudades de orações que ninguém tem mais
autoridade de fazê-las.
Havia alegrias. Principalmente das crianças.
Elas teimam em acreditar no Papai Noel. Isso é fantástico. Havia alegrias de
jovens casais de namorados. Eles não acreditam mais em Papai Noel. Mas
acreditam no amor eterno. Isso também é fantástico.
Havia comida. Muita comida. As comidas de
sempre. O indefectível peru, tender, saladas gourmet, bacalhau. Sim. Os famosos
bolinhos de bacalhau. Ah! Não esqueceram o queijo do reino. O famoso queijo
bola. E os doces. Fios de ovos. Tortas deliciosas. Até ele! O panetone! E o
pavê. Sem a piada, por favor.
Havia árvore de Natal. Não colocaram algodão
simulando neve. É cafona. Estamos no verão aqui. Havia outros enfeites. Havia
música. Somente as americanas. Esqueceram a Simone.
Não houve choro. Mas alguns pareciam tristes.
Muito riso. Isso também é fantástico. Houve amigo oculto. Nem todos gostaram do
presente. Mas todos fingiram ter adorado as lembrancinhas. As crianças estavam
felizes com os brinquedos.
No dia seguinte não era domingo. Mas Natal é
feriado. Feriado mesmo. Graças a Deus. Não é tia Marilda?
Ninguém foi à Missa do Galo. Esqueceram mesmo
foi da celebração da vinda de Deus entre nós. Jesus não é aniversariante. Mas
Ele se faz Menino todo Natal. Louvado seja o Curumim Jesus. É Natal. Foi um bom
Natal.