João
Bosco Botelho
As maneiras de articular as palavras,
formando frases e ideias ficcionais são infinitas. Cada ser humano possui, como
produto da interação genético‑social, a própria marca na linguagem utilizada. Apesar
de a gramática ser finita, a língua gerada por ela é incomensurável.
O produto final das linguagens modula nas
mentalidades os vetores para desvendar os componentes extrínsecos das relações
socais (a natureza, o social e a história) e os intrínsecos (sócio-genéticos herdados
na reprodução sexuada), ajustando tudo e todos para viver casa vez mais, mesmo
que seja na linguagem ficcional, após a morte.
O estudo das sociedades, em diferentes
períodos, mostra o repetir coletivo, a partir da ordem vinda de um ponto
perdido na escala ontogenética, atrás dos anseios fundamentais, ditados por uma
categoria nominada nesse ensaio de memória-sócio‑genética
(MSG). É traduzida na vida de relação na liberdade para buscar, mais e mais, o
conforto físico e emocional, aqui compreendido como a liberdade de falar, explorar
e, sobretudo, a sede e a fome saciadas, o abrigo do calor e do frio, nunca
resolvidos para a maior parte da humanidade.
Todos fogem da dor e procuram o prazer! A
polaridade entre o conforto e o desconforto, sentidos no corpo, são as chaves
acionadoras da MSG. Todas as relações interpessoais e com a natureza, com ou
sem ajuda da técnica, que resultem prazerosas, são acatadas, sem esforço, pela
maioria. Sempre que a ordem social insiste em limitá‑las, ocorre resistência. A
rebeldia contra o sexo limitado e reconstruções metafóricas, em todas as
variáveis, o alimento escasso e a incrível sedução pelas drogas proibidas são
partes importantes do mesmo universo.
A constância transmitida aos descendentes dos
pontos comuns das memórias sócio‑genéticas pessoais, forma a memória sócio‑genética coletiva (MSGC), possivelmente
oriunda nas transformações do cérebro primitivo.
As mensagens escritas ou orais, estruturadas
na ambiguidade realidade-ficção ou, sob certas leituras, do sagrado‑profano, trazendo
a esperança (não é necessária a certeza, basta o leve indicativo da
possibilidade) de amenizar a dor e o sofrimento, são sempre bem aceitas e
festejadas pela MSGC. Nenhum poder ordenador amparado pela força explícita
conseguiu conter, mesmo por meio da repressão de todos os matizes, a expressão
clara da MSGC, oriunda dos tempos arcaicos, ativada pelo choque das ideias na
busca do prazer.
A busca pela liberdade sempre é semelhante ao
ocorrido, na Albânia, entre os anos 1960 e 1980, após vinte anos de ditadura
sanguinária, do ensandecido comunista Enver Hoxha, incluindo o banimento
religioso, milhares de brutais assassinatos sumários e fechamento de igrejas e
sinagogas. A revolta popular para encerrar a loucura comunista reuniu milhares
de católicos albaneses e celebraram com missa pública a morte do ditador.
Em Cuba, não tem sido diferente da Albânia. A
ditadura familiar dos irmãos Castro continua perseguindo as diversidades das
linguagens, a grande vítima da intolerância. Os discordantes são perseguidos
pela implacável caça ao dissidente. Não perseguem, promovem mais assassinatos,
porque não podem! Como os albaneses, acharão o caminho da liberdade.
Fracassaram todos os modelos políticos para
remodelar o mundo suprimindo as lembranças das MSGs com os anseios das fugas da
dor porque as linguagens se adaptaram a esse querer coletivo: desvendar o
visível e o invisível para aumentar o conforto e afastar a dor.