João Bosco Botelho
É precisamente na convergência entre o físico
presente na estrutura celular e o crivo do sócio-genético, dando forma à função
e vice-versa, que ocorre a maravilhosa e intrigante materialidade da ideia
invisível, imponderável, mas capaz de nominar, desvendar, criar e transformar o
objeto.
Por essa razão não existe discurso sem a
linguagem impregnada do saber acumulado historicamente. No contexto da
multidisciplinaridade, as gramáticas são ideológicas, porque expressam um tipo
de posse do real e as características pessoais que marcam profundamente nos
corpos os prazeres e as dores sentidos e imaginados.
Por essa razão, a busca da verdade é
construída no conflito entre o objetivo e o subjetivo (de certa forma, se
confundindo com o sagrado e o profano), refletindo as múltiplas leituras das coisas
numa determinada temporalidade. A variante do tempo se impõe por estar contida
na essência que torna perceptível a forma e a função do ser vivente.
O objetivo primário da ação, a ideia seguida
do movimento do corpo, motivada na mensagem sócio-genética, por si mesmo, ao
mais fundamental sentimento mantenedor da sobrevivência: a cooperação unindo todos
para fugir da dor e desfrutar do maior prazer. Algo que poderia ser chamado de
crítica da proteção pura.
Sem exceção, os seres vivos desejam o abrigo
protetor. Não se trata, exclusivamente, do viver. O morrer pode representar, em
certos instantes, o ato cooperativo dominante e, nesse caso, a morte
representará a proteção pura.
O anseio para compreender as diferenças entre
o constatado pelos sentidos (objetivo) e a ficção propiciou interdependência
muito forte entre as partes. Em certas etapas do processo, é impossível saber
onde começa a realidade e termina a ficção.
Não existiram partidas independentes. A
realidade vivida pelos humanos com os outros animais, dividindo o meio ambiente
comum, contribuiu para fortalecer profundas imitações simbólicas, presentes
como marcas profundas do tempo passado, na consciência coletiva.
Muitos inventos e expressões estéticas, no
passado e presente, projetados pelo aprimoramento da técnica, acabam sendo
facilmente identificadas no meio comum partilhado.
O ímpeto para reproduzir os elementos
visíveis, tirando deles a utilidade para sustentar o conforto (aqui
compreendido como a fome e a sede saciadas, o alívio da dor e o abrigo contra o
frio e o calor), influenciou as primeiras interações entre pensamento, ação e
necessidade social.
O fato de os nossos ancestrais longínquos
terem aprimorado as cópias do perceptível na natureza circundante, animais e
coisas, nos abrigos das cavernas, há milhares de anos, representa a certeza da
profunda coerência entre as formas e as funções nos corpos.
Apesar
de os estudos da anatomia e fisiologia terem desvendado aspectos importantes da
forma e da função do cérebro relacionadas às linguagens, estamos longe, muito
longe, de compreender a maior parte das dúvidas. A principal barreira é a
fantástica multiplicidade das formas, nos seres viventes, gerando funções
semelhantes. Apesar de os homens e as mulheres possuírem áreas anatômicas semelhantes,
relacionadas às linguagens, jamais se expressam igualmente.
O produto final das linguagens é consequente
aos vetores que modulam os componentes extrínsecos (natureza, social e História)
e os intrínsecos (padrões sócio-genéticos herdados) e estruturam a crítica da
proteção, capaz de impelir os seres de todas as naturezas a fugir da dor e
buscar o prazer.