Amigos do Fingidor

quinta-feira, 14 de julho de 2016

Os papiros médicos



João Bosco Botelho

As fontes históricas das práticas médicas no Egito antigo são compostas por documentos de diferentes naturezas, reveladores de como os egípcios, pelos menos os ricos e próximos do poder político, em determinados períodos, se relacionavam com a saúde e a doença, a vida e a morte.
Os papiros contendo registros médicos estão entre os mais importantes:
– Papiro Ebers: o nome corresponde ao primeiro comprador, George Ebers, que o adquiriu, em 1872, de um desconhecido egípcio. Os registros são possivelmente fruto de muitos autores, em torno de 1550 a.C., durante o reinado de Amenophis I. Alguns especialistas acreditam que é a cópia de outro papiro mais antigo, um conjunto de textos contendo 875 receitas, nem sempre inter-relacionados, com 20 metros de cumprimento, em perfeito estado de conservação, que se encontra na universidade de Leipzig, na Alemanha. É de incomensurável valor histórico, por conter importantes diagnósticos e prescrições específicas para as doenças do coração, como o quadro clínico do infarto do miocárdio: “Se examinares um homem que sofre do estômago, que se queixa de dores no braço e no peito, mais precisamente na parte lateral... Diz-se então que se trata da doença wid... Deves dizer: é a morte que se aproxima dele”. As outras receitas orientam sobre função intestinal, digestão, dores reumáticas, paralisia dos membros, estados gripais, doenças pulmonares, olhos, ouvido, estômago e fígado, obstruções intestinais, mordeduras de animais, queimaduras, cuidados com a pele e o cabelo, dentes e a língua.
– Papiro Smith: encontrado numa tumba em Tebes e comprado por Edwin Smith, em 1862, um jovem egiptólogo americano. Apesar de ter sido escrito, em torno de 1540 a 1600 a.C., na XVIII dinastia, do mesmo modo que o anterior parece ser compilação de documentos mais antigos, do Antigo Império. Trata-se de muito bem ordenado conjunto de informações de anatomia e doenças cirúrgicas, dedicada ao diagnóstico, tratamento e prognóstico dos traumatismos, que incluem os traumas faciais, pescoço, clavícula, úmero, esterno, tórax, costelas, ombro, coluna lombar.
Esse papiro contém trinta e cinco tratamentos com incrível atualidade, como o da fratura bilateral da clavícula: “Se você estiver examinando um homem com fratura hsb em ambas as clavículas, encontrando ambas as clavículas, uma mais curta e em posição que difere em relação à segunda, então você tem que dizer: trata-se de uma fratura em ambas as clavículas, uma enfermidade de que eu cuido. Você deve deitá-lo então de costas, dobrando algum objeto para colocá-lo entre suas omoplatas. Depois deverá afastar as omoplatas para que as duas clavículas se estiquem, de modo que aquela fratura hsb retorne ao lugar certo”
– Papiro Berlin: escrito em 1540 a.C., na XVIII dinastia, contém prescrições em forma de encantamentos para proteger as mães e seus filhos;
– Papiro Londres: descreve ritos mágicos para curar as doenças dos olhos e das mulheres;
         – Papiro Kahoun: é o mais antigo dos papiros. Escrito em torno de 2.000 a. C., abrangendo as doenças ginecológicas e obstétricas;
         – Papiro Cheaster Beatty: data da XIX dinastia, em torno de 1.300 a.C., descreve as doenças e os tratamentos das doenças do ânus.
O conjunto dos papiros médicos do Egito antigo demonstra o quanto a medicina estava presente e buscando solução para as doenças mais comuns. Realmente, é impressionante a precisão dos diagnósticos e existência de médicos que construíam saberes também como instrumento do aprendizado.