Amigos do Fingidor

terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Picolé de groselha



Pedro Lucas Lindoso

O Rio de Janeiro no verão faz mais calor que em Manaus. Tia Idalina me liga de Copacabana esbaforida. Foi à farmácia da esquina. O termômetro da rua indicava 38 graus. Comprou cinco potes de sorvete Häagen-Dazs e voltou para casa.
Mas por que Häagen-Dazs? Sempre consumiu sorvete da Kibon. Quando menino e íamos à praia, havia os picolés premiados da Kibon. Era uma alegria quando achávamos um picolé premiado. Dava direito a outro de graça. Bons tempos. Explicou-se:
– Meu parâmetro agora é Michel e Marcela. Eles adoram Häagen-Dazs. E eu provei e amei. Tem um toque europeu. Os ingleses não imitam os gostos da família real britânica? Por que não imitar os Temer?
Disse a Idalina que informações do Google dão conta que Häagen-Dazs é uma marca de sorvete americana fundada por Reuben e Rose Mattus, no Bronx, em Nova Iorque, em 1961. Posteriormente, em 1983, foi vendida e tornou-se uma multinacional. Não tem nada de europeu. E dizem que a licitação foi superfaturada.
Mas Idalina não arrefeceu. Disse-me que era implicância com Michel e Marcela. Os sorvetes Häagen-Dazs foram licitados para abastecer o avião presidencial durante um ano. Ademais a licitação incluía comida além de sorvete. Para não discutir e nem desagradar Idalina concordei que o sorvete de baunilha com macadâmia crocante deles era delicioso e encerramos o telefonema.
Havia uma sorveteria aqui em Manaus, a TÔ-KI-TÔ, na Rua Emílio Moreira canto com a Ramos Ferreira. No início dos anos de 1980 vendia sorvete SANSUÊ. Depois começou a fabricar seu próprio sorvete. Pertencia a um tio chamado Batuel Lindoso. O sorvete era tão gostoso quanto o Häagen-Dazs. Mas meu tio não teve a mesma sorte que Reuben e Rose Mattus do Bronx. E faliu.
Hoje aqui em Manaus faz sucesso o picolé da massa. Já faz parte da cultura amazonense. Há vários sabores, predominando os regionais, como buriti, tucumã e açaí. E o de tapioca.
Muita gente não consome porque tem a história de que o picolé da massa é um produto que não tem higiene e que é preciso tomar cuidados redobrados.
Existem os produtores honestos, é verdade. A família pioneira guarda o segredo da tal massa a sete chaves. Uns dizem ser massa de macaxeira. Outros, de formulados à base de leite. Há controvérsias.
Há muitas fábricas nos fundos dos quintais. A vigilância fechou uma arapuca administrada por uma cabocla procurada pela polícia que se juntou a um imigrante haitiano para produzir e vender sorvete da massa. Um descalabro em termos de higiene. 
Nem Kibon, nem Häagen-Dazs, nem da massa. Sinto saudades do picolé de groselha de minha infância. Era vendido pelo seu Malaquias, no canto da Henrique Martins com a Rui Barbosa. Aquilo sim era picolé!