Poema obsceno
Ferreira Gullar
Façam a festa
cantem dancem
que eu faço o poema duro
o poema-murro
sujo
como a miséria brasileira
Não se detenham:
façam a festa
Bethânia Martinho
Clementina
Estação Primeira de
Mangueira Salgueiro
gente de Vila Isabel e
Madureira
todos
façam
a festa
enquanto eu soco este
pilão
este surdo
poema
que não toca no rádio
que o povo não cantará
(mas que nasce dele)
Não se prestará a
análises estruturalistas
Não entrará nas
antologias oficiais
Obsceno
como o salário de um
trabalhador aposentado
o poema
terá o destino dos que
habitam o lado escuro do país
– e espreitam.