Amigos do Fingidor

quinta-feira, 19 de março de 2020

A poesia é necessária?



O lado vermelho do azul
(fragmento)
Arnaldo Garcez

(Em memória do poeta Ernesto Penafort)

O lado vermelho do azul
é encarnado encardido
assim como o amarelo
e a fome das crianças
do Solimões
o lado vermelho do azul
não é verde
tal os limões azedos
na ponta dos dedos
da memória do povo
(ovo em banho-maria)
o lado vermelho do azul
busca a dignidade
sem contemplar o tempo
essência de ócio e do cio
na fome da miséria
de alguns homens podres
o lado vermelho do azul
não admite o fruto falso
que traduz o vento
da lepra, que insiste
no encalço dos nossos
passos
entre a Getúlio Vargas
e a Dez de Julho
(ditadura e liberdade)
o lado vermelho do azul
rejeita o lilás
aliás é contrário
a qualquer forma de
governo
que não busque
a essência da luz
que traduza o alimento
a razão e o equilíbrio
o lado vermelho do azul
é mais forte
do que qualquer forma
de governo
permanece no ventre
do vento num tempo
que não necessita de
governo
o lado vermelho do azul
também é contrário
ao rio que escorre
como álibi, no córrego da
vida
faminta de uma sociedade
quase extinta
o lado vermelho do azul
não é frágil como os olhos
da manhã
que se ilude com o sol
os limões e a lepra
amarelada sob as armas
e armaduras de grupos
indecentes
o lado vermelho do azul
procura o verde, não esse
verde
da bandeira,
nem o verde da esperança,
mas sim, o ver do verde,
futuro decente
de um povo (o ovo em
banho-maria)
verdes o vermelho
é o outro lado do azul