Amigos do Fingidor

quinta-feira, 17 de junho de 2021

A poesia é necessária?

         Apocalipse

L. Ruas (1931-2000)

 

Os meteoros ameaçam nossos jardins.

 

É hora de decolarmos

Para a infinitude do silêncio dilatado

Com nossas asas de sonho

Antes que a terra exploda

E se escancare como a fauce

De uma desmedida flor carnívora

Faminta de nossos corpos.

 

Não mais teremos tempo

De colher o fruto do nosso canto

 

Os meteoros ameaçam nossos campos.

 

Os mares cobrirão nossas faces;

Os vulcões ressecarão nossos ossos;

As mãos, os ventres, os sexos

Murcharão sob o fogo das estrelas

Que cairão sobre vales e colinas.

 

Os meteoros ameaçam nossos rios.

 

É tempo de partirmos para o espanto desmedido.

Do que fomos, fizemos ou cantamos,

Ficará, apenas, o invisível traço

Do voo da ave indivisível

Que se consumiu no espaço.