Amigos do Fingidor

quarta-feira, 18 de agosto de 2021

O TESC acabou? Carta Aberta a Cleonice Alves

 

Jorge Bandeira*

 

Eu não costumo falar do passado com um saudosismo desproporcional, alavancado por sentimentos de revanchismo ou mágoas que voltam do nada, mas fiquei muito cabisbaixo de triste com algumas informações, vindas de fontes altaneiras, de que o TESC – Teatro Experimental do SESC, importante grupo de teatro de Manaus, depois de 14 anos ininterruptos, em sua chamada segunda fase, ACABOU. Simplesmente, assim, como se nada tivesse acontecido.

Um silencio sepulcral se instala agora, nada se noticia, e a gente fica sabendo das coisas assim, com um sobressalto. Considero, se isso realmente se comprovar, uma falta de respeito absoluto com o público e com todos que passaram pelo TESC, desde 1969, inclusive.

Após o retorno de Márcio Souza a Manaus, após sua passagem na presidência da Funarte, o TESC ressurgiu com forca total, com um repertorio espetacular e que inclusive voltou a agitar a cena teatral em Manaus, na companhia de outros grupos e artistas. Não consigo entender o que faz uma instituição como o Sesc interromper a trajetória de algo que se fazia com qualidade e regularidade, angariando sempre frutos positivos à instituição, inclusive com notável repercussão no exterior, quando o TESC chegou a Franca, recebendo aplausos entusiastas dos franceses. Um grupo como o TESC se esgotando desta forma é um retrocesso ao Sesc, e chega de colocar a culpa na crise, por favor, o TESC seria o último a ser sacrificado nessa conjuntura, Sr. Roberto Tadros.

O teatro é uma fonte inesgotável de transformações, e ao longo destes 14 anos vi muitos trabalhos e um público lindo e assíduo, seja no teatrinho, no ginásio ou em locais externos onde o TESC se apresentava. Li livros sobre o TESC, inclusive com destaques a esta nova geração de talentosxs interpretes, diretores, assistentes, enfim, esse povo todo ficou a ver navios?  Me impressiona a crueldade desta situação, realmente não esperava por isso, e fico pensando agora onde e quando escreverei minha próxima crítica a uma montagem do TESC, já que ele não existe mais? Escrevi vários textos sobre as montagens deste oportuno retorno do TESC, acompanhei desde o início essa grata aventura,  ri e me emocionei por diversas vezes ao longo destes 14 anos,  eu, que assisti em 1982 ou 1983, não lembro, A Resistível Ascensão do Boto Tucuxi, e depois disso tudo ver a coisa ir embora assim, se desvanecendo, me deixando na memória o Robson Ney, o Robson Medina, a Carla Alessandra Menezes, Dimas Mendonça, Emerson Nascimento, Dani Peinado, e todos que cederam seus talentos e trabalho ao longo de todos estes anos.

Ingratidão é a primeira palavra que me vem à mente neste término, que sinceramente seja somente um engano,  um lamentável engano, e que o Sesc perceba o grande erro que está cometendo,  e que volte atrás e traga o TESC de volta ao seu trabalho dos mais importantes para a nossa cultura, eu reflito aflito sobre isso agora, Sr. Tadros, pois podem erguer um prédio majestoso, podem construir um teatro maior que o teatrinho que foi demolido,  mas sem o TESC é como se faltasse uma letra na sigla do Sesc,  ou que ele passasse a se chamar Serviço de Saída de Comediantes. Que os antigos atores e colaboradores do TESC se inconformem e escrevam ou se manifestem de qualquer forma contra este ato de defenestração cultural que está em voga, que o querido público não dê as costas a esta gente tão linda e talentosa do TESC.

Façamos algo!

 

*Jorge Bandeira, patafísico de quase meio século

Manaus, 17/08/2016

Ilustram esta matéria as capas de pelo menos cinco livros 
paridos no TESC. Houve outros.
E dezenas de peças, claro.


O palco verde (1984) foi o primeiro livro sobre o TESC.