Amigos do Fingidor

quinta-feira, 18 de novembro de 2021

A poesia é necessária?

Soneto autobiográfico III

L. Ruas (1931-2000)

 

A égua caminhava a passos largos

Por entre a lama espessa, mal cheirosa,

A égua que nasceu de barro e sopro,

Pesada e, ao mesmo tempo, vaporosa.

 

A égua percorreu todo o passado:

É lenda, é mito, é sombra luminosa;

Galopa semeando vida e morte,

É frágil como a flor e belicosa.

 

Tem alma muito embora no seu ventre

Aninhe fauna imunda e tenebrosa

De serpes e batráquios peçonhentos.

 

A égua chega sempre. Chora, às vezes.

Às vezes, come fezes. Eu a vi

Comendo, em céu de estrelas, uma rosa.