Amigos do Fingidor

terça-feira, 24 de outubro de 2023

Manaus, Manaós: manaú

 Zemaria Pinto

 

Toda cidade é uma musa. E como tal, inalcançável. Apenas sonhada.

 

De mãos dadas com Elliot,

 

sigamos então, tu e eu,

enquanto Manaus se estende sob o céu

como um paciente anestesiado sobre a mesa. (*)

 

A Manaus real está em coma desde o dia em que a descobri na plenitude de sua miséria:

 

a cidade, com seus círculos vorazes

de granizo e fogo e gelo e sangue e serpes:

a cidade-precipício e suas sendas,

suas sombras, seus pudores, seus pecados. (**)

 

A cidade-musa não é física. Fictícia, ela vomita sua sintaxe indefinida, arrastando-se pelas ruas apodrecidas de suas tristes entranhas.

 

Ah, maninha, o que sinto por ti é

 

o horror o horror o horror o horror o horror o horror o horror




(*) Fragmento do poema “A canção de amor de J. Sebastião”, de Zemaria Pinto.

(**) Fragmento do poema “exercício n.° 14”, de Zemaria Pinto. 

(In: Musica para surdos. Valer: Manaus, 2001.)