Amigos do Fingidor

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Domingo à tarde



Inácio Oliveira


Havia aberto a casa, uma réstia de luz entrava pela janela. Era o fim de um domingo como tantos outros. Passou o dedo pela tela luminosa do celular, dezenas de contatos se somavam na tela colorida. Agrupados em ordem alfabética estava todo um círculo de gente que ele conhecia, acessíveis a um toque. Bastaria selecionar o nome da pessoa e pressionar o botão verde no canto inferior da tela para que alguém, em algum lugar do mundo, recebesse uma chamada sua. Ficou olhando para o celular na palma da mão, pensando em quantas coisas incríveis se podia fazer com aquele pequeno aparelho. Séculos de conhecimento e tecnologia na palma da sua mão. Se uma pessoa no século XVIII tomasse conhecimento de um aparelho igual a esse pensaria nisso como fruto de um poderoso sortilégio. Mas ele, sozinho em casa, olhando para a lista de contatos do seu celular não se sente poderoso, ao contrário, de alguma forma tudo isso o oprime e ele se sente ainda mais sozinho.
Observa um a um os ícones no celular que o ligavam às redes sociais, o f feliz e azulado do facebook, o pássaro verde do twitter, o whatsapp e todos os outros aplicativos do celular. Havia um que encontrava os melhores restaurantes e bares num raio de 20 km, mas ele não sente a menor vontade de ir a nenhum bar ou restaurante. Olha novamente os contatos no celular, não há ninguém para quem ele queira ligar, e se ligasse não saberia o que dizer.
Deixa o celular sobre a mesa e fica olhando para ele. A tela esmaece e em seguida fica escura. Ele fica olhando um tempo mais para o celular, gostaria que alguém ligasse para ele, mesmo que fosse engano; principalmente que fosse engano. Por fim ele desiste do celular e liga o computador. Rapidamente a tela do computador fica azul e a janela do Windows se abre fazendo um barulhinho alegre. Abre a página inicial do Google e fica olhando para as letras coloridas do buscador, estranhamente não consegue pensar em nada que queira ver na internet. Isso o deprime porque ele é como alguém que vai a um lugar onde tem tudo, e mesmo assim não consegue se interessar por nada.
Acaba acessando a página do facebook. Na página inicial do seu perfil ele pode ver inúmeras publicações de outros usuários amigos seus. Fotos de animais de estimação, de roupas, de viagem, de aniversários, frases espirituosas e cartões animados que distinguem aqueles que as publicam e compartilham como pessoas inteligentes e felizes. Logo essas publicações o aborrecem. Ele abre a página de amigos, 857 amigos, não sabe se esse número é pouco ou muito para os padrões do facebook, de qualquer maneira 857 amigos não são pouca coisa. Se ele reunisse todos os seus amigos do facebook em um só lugar ocuparia uma área de 170 m2. No entanto, a observar as primeiras pessoas que apareceram na página, nenhuma delas pode se dizer de fato que é sua amiga. Pensou que talvez a palavra amigo nesse contexto houvesse ganhado outro significado. No menu lateral da página ele pode ver dezenas de pontinhos verdes, o que significa que outras pessoas neste momento estão fazendo o mesmo que ele, diante de um computador ou no celular. Sente pena dessas pessoas, sente pena de si mesmo.

No topo da página, o facebook lhe pergunta “em que você está pensando?”. “Em que eu estou pensando, essa é boa, em que estou pensando?”. Ele ri sozinho diante do computador, um riso amargo. Anoitece, a sala onde ele ligou o computador está completamente escura. Apenas a luz da tela reflete em seu rosto. Depois de algum tempo diante do computador sua vista começa a cansar; ele desliga a máquina e só então percebe que o sol já se pôs, há muito tempo.