João Bosco Botelho
No Brasil, o aborto é considerado crime,
exceto: gestação como produto de estupro e risco de vida materna e, mais
recentemente, quando constatada anomalias fetais incompatíveis com a vida, sendo
a anencefalia a mais comum.
Um
dos estudos mais importantes identificando o perfil das mulheres que usam o
aborto, no Brasil, como método anticoncepcional, foi realizado pela
Universidade Federal de Pelotas. Alguns dados são interessantes e mostram a
gravidade da questão, claramente entendida como problema de saúde pública:
–
Mais frequente entre mulheres com idade entre 20 e 29 anos, em união estável,
com até oito anos de estudo, trabalhadoras, católicas e com pelo menos um
filho;
– A maior parte é adolescente;
–
O medicamento de venda controlada Misoprostol, indicado como o principal método abortivo;
– Mais de 1
milhão de gestações foram interrompidas em 2005;
– Cerca de 200
mil mulheres, em 2005, foram hospitalizadas por meio do Sistema Único de Saúde
(SUS) em decorrência de tentativas de aborto;
– Em 2005, 3,7
milhões de brasileiras entre 15 e 49 anos realizaram aborto;
– Até 82% dos abortos são realizados por
mulheres entre 20 e 29 anos e 10% são adolescentes;
– A maior parte das mulheres que fizeram
aborto se declarou católica. A menor proporção, como evangélica.
As estatísticas mundiais,
notadamente, nos países subdesenvolvidos e nos em desenvolvimento, evidenciam o
aumento do número dos abortos provocados. Essa realidade impõe outras
construções para melhor entender o aborto como metido anticoncepcional,
notadamente, se a mulher que pretende abortar é menor de idade.
Na França, a permissão do Estado ao
aborto alcança os embriões de 14 semanas. Contudo, a entrevista obrigatória com
equipe especializada, que antecede o ato médio, nos hospitais públicos, e o
apoio governamental no sustento futuro da criança, consegue reverter a decisão
em mais da metade dos casos
A análise dos dados estatísticos
continua alimentando as seguintes questões:
–
As proibições não conseguiram modificar, em dois mil anos, o comportamento das
mulheres quando decididas a utilizar o aborto como método anticoncepcional;
–
Nas sociedades com problemas de superpopulação, pode ocorrer o estímulo do
Estado ao aborto como forma de controle populacional.
Também é importante assinalar que frente
ao número de médicos em atividades no Brasil, cerca de 370.000, alguns poucos, contados
nos dedos, são denunciados por prática de aborto à margem do artigo 54 do
Código de Ética Médica, que impõe restrição ao médico, salvo as exceções
referidas no artigo 128 do Código Penal.
Para que um médico, no Brasil, possa
realizar o aborto, deverá consultar em conferência dois outros médicos lavrando
a ata em três vias. Uma das cópias será enviada ao Conselho Regional de
Medicina; outra, ao diretor clínico do hospital ou clínica, pública ou privada;
a terceira ficará sob a guarda do médico assistente, responsável pela
internação hospitalar da paciente.
O tema aborto, com diferentes enfoques,
está presente direta ou indiretamente em pelo menos 21 artigos do Código de
Ética Médica. Contudo, os artigos 42 e 43 são mais específicos:
Art.
42 – É vedada ao médico a prática ou indicação de atos desnecessários ou proibidos
pela legislação do país;
Art.
43 – É vedado ao médico o descumprimento da legislação específica nos casos de
transplantes de órgão ou tecidos, esterilização, fecundação artificial e
abortamento.