Amigos do Fingidor

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Lábios que beijei 29


Zemaria Pinto

Elisa


Conheci Elisa num barracão de candomblé, uma oca de terra batida, para onde fui levado pela curiosidade adolescente que cerca o proibido. A frenética música dos tambores não deixava ninguém indiferente. Pelas tantas, uma cabocla roxa, de negros cabelos lisos, regulando uns 15 anos, rodou até o centro do salão e começou a se contorcer no ritmo dos tam-tans. Foi a dança mais sensual que eu veria em toda a minha vida. De início, ela levantava a saia vermelha, mostrando as coxas fortes, os músculos retesados. Na sequência, desabotoou a blusa azul e quando alguém tentou impedi-la de prosseguir, ela arrancou o corpete, fazendo saltar os pequeninos seios, os bicos túmidos, e atirou-o longe – aos meus pés. A ialorixá sinalizou para que a deixassem. Apanhei o corpete e logo senti o forte cheiro de patchuli. Elisa, banhada em suor, continuou sua dança ensandecida, tirando uma a uma as peças – saia, anágua, blusa – até ficar só de calcinha. A dança ainda se estendeu por alguns minutos, até que ela desabou no chão, inerte. Cobriram-na com uma toalha e levaram-na para dentro de casa. Quando ela reapareceu, o semblante refletindo uma estranha calma, devolvi-lhe o corpete. Elisa me abraçou, tocou o ombro contra o meu, em xis, em ambos os lados, me fazendo sentir a fortaleza de seus seios duros, e enfiou a língua na minha boca, com sofreguidão. Sempre nos encontrávamos depois do ritual, no quarto em que ela morava com uma tia entrevada, numa estância próxima. Um dia, Elisa sumiu do barracão – voltou para Faro, alguém comentou com displicência. No ar, aquele cheiro inconfundível, que ainda hoje me faz sonhar seu corpo rijo, úmido, e sua sensual dança sagrada.