Amigos do Fingidor

terça-feira, 18 de abril de 2017

Em Brasília tem mais



Pedro Lucas Lindoso

Dia 19 de abril. Dia do Índio. É um chavão e letra de música. Mas é sempre bom repetir: “Todo dia era dia de índio”. A verdade é que falta respeito aos que aqui já estavam quando as caravelas chegaram.
Não vou falar sobre reservas, aldeias e tribos nômades aqui da Amazônia. Nem sobre os privilegiados índios isolados. Preocupam-me os índios urbanos esquecidos na periferia de nossa Manaus.
A FUNAI foi recentemente reestruturada. Em governo neoliberal deve ter sido enxugada e quiçá esteja em extinção. E os indígenas eternamente desassistidos. Principalmente, os que estão nas cidades. Em Manaus, onde se encontra uma das maiores populações de índios urbanos no Brasil, a presença indígena é, quase sempre, ocultada.
Há ainda os que, sendo netos ou descendentes diretos de etnias importantes da região, não se reconhecem como índios. Reconhecem-se como amazonenses ou “caboclo aqui da terra”.
Há muitos, todavia, que se reconhecem indígenas. Eles entendem que vieram morar aqui e que ajudaram a construir Manaus. Têm consciência, e com razão, que sua história está também inscrita neste território. Estão por aqui os Baré, Tukano, Desana, Baniwa, dentre outros originários da região do alto e médio rio Negro. E vinculam-se socialmente e economicamente pelos casamentos e outros aspectos. 
O certo é que continuam fazendo parte deste espaço urbano e selvagem. Mas selvagem em outra conotação. Selva de pedra, asfalto esburacado, sem saneamento, mobilidade precária. Inseridos nesse caos urbano de dois milhões de habitantes. Na maioria das vezes, na condição de marginalizados. Moram na periferia, principalmente nas Zonas Leste e Norte de Manaus.
Quando morei em Brasília, a FUNAI se localizava no início das quadras 700. Há casas nessa área e muitas se transformaram em pensão ou pequenos hotéis. Houve época em que o órgão abrigava índios do sudeste e centro-oeste que vinham à FUNAI tratar dos interesses das suas aldeias. Há uma praça por lá. Certa feita ouvi conversa de dois adolescentes. Um dizia que o pai havia servido no Exército, em Manaus. O jovem gostara muito daqui. O outro perguntou se havia muitos índios na nossa cidade. Vendo um grupo de pataxós da Bahia, conversando na praça respondeu: Aqui em Brasília tem mais.
Galdino Jesus dos Santos, um líder da etnia pataxó, foi queimado vivo enquanto dormia em um abrigo de ônibus nessa área. O crime foi praticado por cinco jovens brasilienses. Ironia: era 19 de abril de 1997. Dia do Índio.